O embaixador Sérgio Amaral, presidente emérito do Conselho Empresarial Brasil-China, afirmou que as provocações do governo Bolsonaro contra o país asiático – como a do ministro da Educação, Abraham Weintraub – são “gratuitas, irresponsáveis e esquizofrênicas”.
“Há preocupação com essas provocações gratuitas. Já é a segunda em pouco tempo. Além de serem gratuitas, são irresponsáveis, porque ignoram o dano que provocam às relações entre Brasil e China. Elas têm também um lado esquizofrênico”, afirmou o diplomata em entrevista para o Estadão.
Para ele, se de um lado o governo Bolsonaro constrói, “do outro destrói, através de um ministério que não tem envolvimento relevante na relação com a China”.
Para o embaixador, a provocação “desta vez é mais grave”
“No caso de Eduardo Bolsonaro, ele é um deputado, não fala necessariamente em nome do governo embora seja evidente a relação com o presidente. Neste caso, (Weintraub) é um membro do governo que fez uma provocação inútil e gratuita. A resposta foi a mais dura possível dentro do padrão ameno das respostas. O embaixador da China qualificou a atitude com “forte indignação”. Países asiáticos evitam o confronto, mas agem”, advertiu o embaixador.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, debochou do povo chinês e insinuou, em um post no Twitter, que a China estaria se beneficiando da crise mundial causada pelo novo coronavírus.
A publicação do ministro bolsonarista, usava o personagem Cebolinha, da “Turma da Mônica”, para fazer o insulto. Devido a uma dificuldade de dicção, nos quadrinhos, o personagem troca a letra “R” pelo “L”.
“Geopoliticamente, quem podeLá saiL foLtalecido, em teLmos Lelativos, dessa cLise mundial? PodeLia seL o Cebolinha? Quem são os aliados no BLasil do plano infalível do Cebolinha paLa dominaL o mundo? SeLia o Cascão ou há mais amiguinhos?”, escreveu o ministro.
Ele apagou a publicação, mas já era tarde. A Embaixada da China no Brasil respondeu à provocação do ministro e repudiou a declaração que considerou “preconceituosa”, exigindo um pedido público de desculpas.
Antes, o filho de Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, acusou a China de esconder o vírus e propagá-lo no mundo.
Sérgio Amaral alertou que “não seria surpresa que, dentro de alguns meses, haja redução das importações de soja, ou que sejam impostas barreiras sanitárias a nossas exportações de carne. Não acredito que essa situação seja resolvida com o tempo”.
“Neste momento, fazer uma provocação ao governo chinês não é uma prática inteligente, nem compatível com os interesses do país”, completou o diplomata que até junho do ano passado chefiou a embaixada brasileira em Washington. Para ocupar o seu lugar, Bolsonaro indicou, mas fracassou, o filho Eduardo.
Sérgio Amaral criticou a política externa do governo no momento. Para ele, manter boas relações com os EUA é bom, assim como com a China. O Brasil não deve é se alinhar automaticamente com o governo norte-americano, sustenta.
“Nós não temos que tomar posição em um conflito entre duas potências. Isso não tem cabimento. Se os EUA fazem negócio com a China, por que imporíamos restrições? Temos de considerar os interesses nacionais”, assinalou.
“Neste momento, o Itamaraty não está exercendo o papel que sempre exerceu, que é a coordenação dos interesses dos diferentes ministérios. Está havendo um processo de fragmentação da política externa, o que é muito ruim para o Brasil”, alertou.
Questionado se a imagem de Bolsonaro fora do país afeta a posição do Brasil no mundo, o embaixador respondeu que o “Brasil sempre desempenhou um papel relevante nas grandes questões internacionais, desde a Liga das Nações. Eu não acho que o Brasil hoje tenha condições de desempenhar um papel semelhante”.
“Já temos problemas sérios, sociais e econômicos. Além deles, estamos criando novos problemas de forma desnecessária. As provocações à China são apenas um exemplo menor. O conflito que alimentamos com a França é outro exemplo. O mundo não está contra o Brasil, nós é que estamos contra o mundo”, apontou.