“Eu, Luiz Inácio, sou contra o aborto. Mas, como o aborto é uma realidade, precisamos tratar como uma questão de saúde pública”, disse o presidente, em suas rede sociais
A indignação geral com a proposta da bancada bolsonarista de beneficiar os estupradores e punir severamente as suas vítimas, na maioria crianças, está crescendo a cada dia. A proposta quer punir as vítimas de estupro que decidirem interromper a gravidez, o que é permitido pela lei, assim como os casos de anencefalia e risco de vida para a mãe.
O presidente Lula se somou neste sábado (15), através de sus redes sociais, ao sentimento geral de repúdio do país e aos protestos nas ruas contra o que está sendo chamado de “PL do estupro”. “Eu, Luiz Inácio, sou contra o aborto. Mas, como o aborto é uma realidade, precisamos tratar como uma questão de saúde pública”, disse o presidente. O PL quer criminalizar o aborto nessas três condições permitidas pela lei.
“Eu acho uma insanidade querer punir uma mulher vítima de estupro com uma pena maior que um criminoso que comete o estupro”, acrescentou o presidente. “Tenho certeza que o que já existe na lei garante que a gente aja de forma civilizada nesses casos, tratando com rigor o estuprador e com respeito às vítimas”, concluiu o chefe do Executivo brasileiro.
Na quarta-feira (12), a Câmara dos Deputados aprovou o requerimento de urgência do PL 1.904/24. A votação foi feita de forma simbólica — método que não identifica individualmente os votos dos deputados e não foi anunciada previamente em plenário, gerando descontentamento entre muitos parlamentares e a população. A proposta de equiparar o aborto ao homicídio, mesmo em casos de estupro, é vista por muitos como um retrocesso significativo nos direitos das mulheres.
O projeto da bancada bolsonarista, ou o “PL do estupro”, define uma pena de até 20 anos de prisão para a vítima de estupro que fizer aborto enquanto o estuprador pegaria no máximo 8 anos de prisão e, em caso de estupro de vulnerável, que é mais grave, o criminoso pegaria no máximo 15 anos. O partido de Bolsonaro parece estar adotando, neste caso, o raciocínio dos pedófilos, que culpam suas vítimas por terem, elas próprias, “provocado o crime”.
Além de Lula, seus ministros também protestaram. A ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Luciana Santos, criticou a proposta. Ela declarou que o projeto representa um “grande retrocesso civilizatório”, além de, segundo ela, ser inconstitucional, na medida que fere a dignidade humana.
“É um ataque brutal contra todas as mulheres que sofrem violência sexual neste país. É preciso derrotar esse projeto no Parlamento, em defesa da vida e da dignidade das mulheres e meninas vítimas de violência”, disse Luciana, em nota.
O ministro das Relações Institucional, Alexandre Padilha, afirmou na sexta-feira (14) que o governo não apoia a proposta: “Não contem com o governo para essa barbaridade”.
“O governo, o presidente Lula ao longo da sua história, até atendendo solicitações de lideranças religiosas de parte da sociedade, sempre disse que nunca ia fazer nada para mudar a legislação atual do aborto no país. Nunca faria nenhum gesto, nenhuma ação para mudar a legislação de interrupção da gravidez no país. E nós continuamos com essa mesma postura”, disse Padilha. Vamos trabalhar para quem um projeto como esse não seja votado”, acrescentou.
De acordo com o Anuário da Segurança Pública, no ano de 2022 foi registrado o maior número de estupros e estupros de vulnerável da história, com 74.930 vítimas. Destas, 6 em cada 10 vítimas são crianças com idade entre 0 e 13 anos, que são vítimas de familiares e outros conhecidos. São essas crianças que o bolsonarismo quer que passem o resto da vida presas enquanto os estupradores seguem cometendo crimes.
Segundo dados do DataSUS, 247.280 meninas de 10 a 14 anos foram mães no Brasil, entre 2012 e 2022. Estudos apontam ainda que 57% das vítimas eram negras e 68% dos estupros ocorreram dentro de casa. Outro dado revela a gravidade deste cenário: em 64% dos casos, os autores eram familiares das vítimas. Segundo o ministra Cida Gonçalves (Mulheres), “são essas meninas que mais precisam do serviço do aborto legal, e as que menos têm acesso a esse direito”.