O senador Flávio Bolsonaro tentou desesperadamente impedir as investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro sobre suas movimentações financeiras milionárias. Não conseguiu e seu sigilo bancário e fiscal será quebrado juntamente com outras 95 pessoas.
(Marco Aurélio, do STF, diz que tem “remetido ao lixo” pedidos como o de Flávio Bolsonaro)
Segundo os investigadores, o senador fez operações de compra e venda de imóveis – num total de 19 imóveis – investindo R$ 9,425 milhões de reais entre 2010 e 2017.
Os “negócios” imobiliários do “zero dois” de Bolsonaro, que o MP considera operações com indícios de lavagem de dinheiro, tiveram altos retornos. Em operações de subfaturamento das compras e superfaturamento dos imóveis vendidos, o senador obteve um lucro de R$ 3,089 milhões neste período.
Segundo o Conselho de Controle de Atividades Fiscais (Coaf), há “sérios indícios” de lavagem de dinheiro nestas operações (Escritura desmente versão de Flávio Bolsonaro sobre dinheiro em sua conta).
Esse ganho extra do parlamentar revela que não era só o seu motorista, Fabrício Queiroz, que “fazia rolo”. “Eu faço dinheiro”, disse ele, em entrevista no final do ano passado. O deputado também “fabricava dinheiro”.
O deputado adquiriu, por exemplo, num desses “negócios”, 10 salas comerciais em um prédio na Barra da Tijuca por R$ 2,662 milhões, entre dezembro de 2008 e setembro de 2010. Em outubro de 2010, ele vendeu as mesmas salas para a empresa MCA Exportação e Participações por R$ 3,167 milhões.
Em novembro de 2012, Flávio adquiriu outros dois imóveis em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro. Localizados em ruas pouco valorizadas do bairro, pagou um total de R$ 310 mil pelas duas quitinetes e as revendeu, um ano e três meses depois, por mais que o triplo do preço, segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo.
Os dois imóveis haviam sido adquiridos em 2011 pelos proprietários anteriores por um total de R$ 440 mil. Em pleno boom imobiliário na cidade, eles tiveram um prejuízo de 30% ao revendê-los ao senador eleito, segundo dados do 5º RGI (Registro Geral de Imóveis) da capital do estado.
O deputado revendeu um imóvel em novembro de 2013 (por R$ 573 mil) e outro em fevereiro de 2014 (por R$ 550 mil). Somadas, as transações lhe renderam um lucro de R$ 813 mil —diferença entre os R$ 310 mil investidos nas compras e o R$ 1,12 milhão que recebeu com as vendas.
Os responsáveis pela transação com Flávio, contudo, não foram os proprietários do imóvel, mas o corretor norte-americano Glenn Dillard. Ele tinha uma procuração de Charles Eldering e Paul Maitino, reais donos das quitinetes, para negociar imóveis no Rio de Janeiro.
Em 2016, Eldering acusou Dillard na Justiça de ter lhe aplicado um golpe. Ele declarou que o corretor vendera a unidade a Flávio sem o seu consentimento, omitiu a concretização da negociação e ficou com o dinheiro.
O Coaf já havia detectado as movimentações suspeitas na conta do parlamentar bolsonarista. Foram 48 depósitos feitos em valores nunca superiores a R$ 2 mil num espaço de cinco dias.
Os investigadores consideram essas operações como típicas de quem quer esconder a origem dos recursos depositados. Agora vêm à tona essa quantidade enorme de imóveis negociados de forma suspeita e, também com características típicas de lavagem de dinheiro.
Ao pedir à Justiça a quebra do sigilo bancário e fiscal de 95 pessoas e empresas relacionadas ao senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), no dia 15 de abril, o Ministério Público do Rio de Janeiro apontou indícios de que o parlamentar tenha utilizado a compra e venda de imóveis no Rio de Janeiro para lavar dinheiro.
O órgão afirma ter encontrado indícios de crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa pelo gabinete do então deputado.
O MP afirma, no documento que embasou o pedido de quebra de sigilo, autorizado pelo juiz da 27ª Vara Crimina do Rio, que a fraude pode ter ocorrido para “simular ganhos de capital fictícios” que encobririam “o enriquecimento ilícito decorrente dos desvios de recursos” da Assembleia Legislativa fluminense.
O documento com 87 páginas foi obtido pela revista Veja. O MP afirma que o lucro dos bens foi maior que rendimentos obtidos como deputado.
Fabrício Queiroz também será investigado por ter movimentado R$ 7 milhões entre 2014 e 2017. O MP quer saber qual a origem do dinheiro que circulou pela conta de Queiroz (Queiroz não movimentou R$ 1,2 milhão; movimentou R$ 7 milhões, diz Coaf).
Os investigadores também vão investigar as ligações de Queiroz com o miliciano foragido Adriano Magalhães Nóbrega, chefe do chamado Escritório do Crime, uma espécie de central executora de assassinatos por encomenda, suspeito de ter participado da execução da vereadora Marielle Franco.
Adriano era ligado a Queiroz desde os tempos em que os dois serviram juntos no batalhão da Polícia Militar de Jacarepaguá. Em 2003 Flávio Bolsonaro homenageou o miliciano assassino com a medalha Tiradentes, maior honraria do Estado do Rio de Janeiro (Flávio Bolsonaro discursou várias vezes em apoio às milícias).
Na época em que recebeu a homenagem do deputado, Adriano estava preso, acusado de ter assassinado um jovem que denunciou as ações criminosas da milícia do Rio das Pedras (Miliciano estava preso quando recebeu Medalha Tiradentes de Flávio Bolsonaro).
O MP quer saber, por exemplo, quem pagou as despesas da internação de Queiroz no Hospital Albert Einstein, um dos mais caros do país.
Até hoje Queiroz se esquivou de dar as explicações às autoridades. Agora, com a quebra de seu sigilo, o MP poderá obter mais detalhes da lavagem de dinheiro. Queiroz entrou para o gabinete de Flávio em 2007. O Coaf detectou movimentações financeiras muito acima da renda do funcionário.
Tempos depois da entrada de Queiroz para o gabinete de Flávio, foram contratadas como assessoras de Flávio Bolsonaro a mulher e a mãe do miliciano Adriano Magalhães, que já havia sido homenageado por Flávio
(Mãe e mulher de chefe de milícia trabalhavam para Flávio Bolsonaro na Alerj).
Raimunda Veras Magalhães, de 68 anos, mãe do assassino de aluguel, era funcionária no gabinete de Flávio Bolsonaro durante parte de seu mandato como deputado estadual.
Raimunda aparece na folha da Alerj com salário líquido de R$ 5.124,62. A mulher de Adriano, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega também foi lotada no gabinete de Flávio na Alerj, com o mesmo salário da sogra. Ela é listada na Assembleia desde novembro de 2010 e foi exonerada junto com a sogra.Q