Partido Libre denuncia fraude e exige anulação das eleições em Honduras

Festival de "inconsistências" nas cédulas fez com que o site permanecesse adulterado e sem atualizações por três dias (AFP)

Garantia da democracia e da soberania popular torna necessária “a investigação dos atos de terrorismo eleitoral” praticados, como a manipulação do código-fonte do Sistema de Transmissão de Resultados e a chantagem do governo dos EUA

Com a conclamação “Não ao golpe eleitoral! Não à ingerência”, o Partido Liberdade e Refundação (Libre), da atual presidente Xiomara Castro, exortou na noite de domingo (7) ao povo hondurenho que ocupe as ruas para garantir que o respeito à democracia e a soberania prevaleçam.

Paralisada desde a última sexta-feira (5) por “falhas técnicas”, a apuração foi retomada na tarde desta segunda-feira (8). Com 91,62% dos votos apurados, o candidato do Partido Nacional, Nasry Asfura – respaldado abertamente por Trump -, liderava a votação com 40,1%, pouco mais de 11.000 votos à frente de Salvador Nasralla (39,72%) do Partido Liberal, enquanto a representante progressita, a governista Rixi Moncada, permanecia em terceiro lugar com 19,16%, contrariando todas as projeções.

As interrupções na atualização da contagem de votos e a falta de mudanças por dias geraram críticas de partidos políticos, observadores e organizações da sociedade civil, que protestaram, exigindo maior agilidade e transparência.

“INGERÊNCIA E COAÇÃO DE TRUMP”

“O Libre não reconhece as eleições realizadas sob ingerência e coação do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e da oligarquia aliada, que atacaram o povo hondurenho com um golpe eleitoral em curso, após o envio de milhões de mensagens por diferentes plataformas ameaçando a população de que se votassem em Rixi Moncada não receberiam remessas no mês de dezembro, minando assim a soberania popular”, afirma o documento. No país centro-americano, 95% dos recursos que ingressam no país provêm dos Estados Unidos, com as remessas representando mais de 25% do Produto Interno Bruto (PIB) de Honduras.

De acordo com o Libre, no sábado (6) foi demonstrado “que o Sistema de Transmissão de Resultados Eleitorais (TREP) teve seu código-fonte manipulado quando, sem o uso das três chaves do sistema de segurança, pelas costas dos técnicos responsáveis, o software foi alterado – recebendo intervenção -, violando a Lei Eleitoral e os protocolos de segurança, conforme confirmado nos módulos de escrutínio e divulgação”.

Conforme a contagem e o processamento dos votos revelaram, “foram encontradas inconsistências em 95,17% das cédulas transmitidas relacionadas ao sistema biométrico; 4.659 cédulas não possuíam backups biométricos; e as constantes interrupções do site indicaram acesso não autorizado ao software original, que havia sido comprometido”. “O site permaneceu adulterado e sem atualizações por três dias consecutivos. Há alegações de possíveis ligações diretas dentro do sistema TREP-CNE do Partido Nacional para manipular os resultados”, acrescentou a denúncia.

De forma condundente, a coordenação do Liberdade e Refundação “condena o indulto concedido ao narcotraficante Juan Orlando Hernández [que havia sido condenado em 2024 a 45 anos de prisão por tráfico de drogas e armas] diretamente pelo presidente Donald Trump no contexto do processo eleitoral hondurenho”, exige que “as acusações legais correspondentes sejam apresentadas e que seja expedido um mandado de prisão internacional pelos seus crimes contra o território e por violar a Constituição”.

Por unanimidade, o Libre desautoriza a qualquer funcionário público que se ponha a serviço dos vende-pátria e anuncie sua cooperação na “transição governamental com os inimigos do povo, autores do golpe eleitoral em curso”. Da mesma forma, “ordena a todos os candidatos eleitos neste sistema fraudulento a não integrarem qualquer organismo sem a autorização do Partido”.

Para a defesa da legalidade e da Constituição, asseguram, é determinada a anulação das eleições e que se exija a investigação dos atos de terrorismo eleitoral realizados através do sistema de transmissão TREP, conforme denunciado nos 26 áudios entregues ao Ministério Público, nos quais deputados e conselheiros eleitorais discutem abertamente a estratégia de declarar um oposicionista como vencedor.

A comissária do Sistema Nacional de Emergência de Honduras, Miroslava Cerpas, denunciou coerção e intimidação por parte do crime organizado, compra e venda de votos, e a alteração e apreensão de material eleitoral.

“PROCESSO SEM PRECEDENTES, SUJO E FRAUDULENTO”

Cerpas apresentou provas ao Ministério Público revelando aberrações que desvirtuaram completamente o processo: “Existem 892 gravações de áudio de chamadas recebidas pelo Sistema Nacional de Emergência 911, denunciando intimidação, coerção por parte do crime organizado, compra e venda de votos, manipulação do processo eleitoral, apreensão de material eleitoral e confisco de documentos de identificação de eleitores. Eles não apenas ameaçaram as pessoas, não estavam apenas nos locais de votação, mas em áreas que sabiam que não lhes trariam benefícios políticos, confiscaram os documentos de identificação das pessoas para que não pudessem votar. Foi isso que aconteceu nesta eleição. É um processo sem precedentes, sujo e fraudulento, e não podemos permanecer em silêncio”.

“Existem 892 gravações de áudio de chamadas recebidas pelo Sistema Nacional de Emergência 911, denunciando intimidação, coerção por parte do crime organizado, compra e venda de votos, alteração do processo eleitoral, apreensão de material eleitoral e confisco de documentos de identificação de eleitores. Eles não apenas ameaçaram pessoas, não apenas estavam presentes nos locais de votação, mas também confiscaram documentos de identificação de pessoas em áreas que sabiam que não se beneficiariam politicamente, para que não pudessem votar. Foi isso que aconteceu neste processo. É um processo sem precedentes, sujo e fraudulento, e não podemos ficar em silêncio.”

Em entrevista ao HP, o analista internacional Juan Jamón Guzmán recorda que nas eleições hondurenhas, o processo de votação é inteiramente manual – incluindo a preparação das atas de apuração e demais documentos necessários – e que a transmissão dos dados gerados por esse processo manual é eletrônica e digital, conhecida pela sigla TREP.

“MANIPULAÇÃO OCORREU ONDE O SISTEMA BIOMÉTRICO NÃO ESTAVA EM USO”

Por lei, assinala Guzmán, cada seção eleitoral, denominada mesa eleitoral (JRV), deve possuir um sistema biométrico (leitor de impressões digitais) para garantir o direito de “um eleitor, um voto”. Na véspera da eleição, no sábado, 29 de novembro, as conselheiras eleitorais Cossette López e Ana Paola Hall autorizaram a dispensa do uso do sistema biométrico nas mesas eleitorais onde, por qualquer motivo, ele não pudesse ser instalado. Até então, disse, “o uso do sistema biométrico era obrigatório, com base em resolução prévia aprovada pelas três conselheiras eleitorais”. “A manipulação dos resultados das atas de apuração foi feita por meio do TREP justamente nas mesas eleitorais onde o sistema biométrico não estava em uso”, apontou.

O fato é que das 19.167 folhas de apuração transmitidas pelo TREP, aproximadamente 86,6% foram manipuladas, com alterações nos resultados em comparação com o conteúdo das folhas de apuração físicas.

Em Honduras, os resultados anunciados pelo TREP não têm força legal; ou seja, não validam a eleição legal, jurídica ou constitucionalmente. Servem apenas para fins informativos ao público.

A eleição no país é validada legal, jurídica e constitucionalmente pela contagem e verificação de 100% das folhas de apuração físicas. O resultado final é aprovado pelo Conselho Eleitoral completo, ou seja, pelas assinaturas dos três conselheiros, dentro de 30 dias consecutivos após a eleição. Se ao menos um conselheiro se opuser, a eleição é declarada nula e sem efeito, e a questão é encaminhada à maioria qualificada do Congresso para validação e declaração final, e para a emissão de um certificado de maioria ao vencedor.

Se o Congresso não obtiver a maioria qualificada para validar a eleição dentro de um curto período de 20 dias, a eleição será declarada nula e sem efeito, e a Constituição exige a formação de um governo de transição instalado exclusivamente para convocar novas eleições, o mais breve possível.

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