“Temos de encontrar uma solução para o Auxílio Brasil, mas há muitas outras coisas [por trás da mudança], fundo partidário, emendas de relator. Está passando a boiada junto”, alerta Eduardo Gouvêa, presidente dos comissão dos Precatórios da OAB
A Comissão de Precatórios da OAB Nacional afirmou nesta quarta-feira (3) que a proposta de Emenda à Constituição (PEC) 23/2021, também conhecida como PEC dos Precatórios, é inconstitucional por ferir cláusulas pétreas da Constituição: separação dos Poderes e dos direitos e garantias individuais. Além disso, ela possui mais de 30 violações constitucionais. E, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), a OAB entende que a regra será derrubada no Judiciário.
A proposta apresentada pelo governo Bolsonaro, como o “Plano A” de Paulo Guedes, ministro da Economia, para garantir os recursos do novo Bolsa Família, uma programa provisório para durar apenas em 2022, ano eleitoral, no valor de R$ 400, foi aprovada por uma comissão especial da Câmara, mas encontra grande resistência entre parlamentares.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, tentará nesta quarta colocar o texto da PEC novamente em votação no plenário da Casa.
A PEC acaba com o pagamento regular dos precatórios, dívidas da União com o cidadão, devidamente reconhecidas pelo Poder Judiciário brasileiro, após longo percurso processual, dentro das balizas da legalidade, segundo a OAB.
Segundo o texto da PEC, haverá um limite para o pagamento de precatórios com base no gasto de 2016 (ano em que a regra do teto de gastos foi criada ) corrigido pela inflação, o que reduz o valor do próximo ano de R$ 89 bilhões para cerca de R$ 45 bilhões.
De acordo com o presidente da Comissão de Precatórios da OAB, Eduardo Gouvêa, as dívidas de precatórios não devem estar sujeitas a qualquer limitação do teto de gastos, pois não se trata de uma despesa, mas de uma dívida judicial. “Se a dívida mobiliária [títulos públicos] é paga fora do teto, a dívida judicial também tem de ser”, destacou Gouvêa, em reportagem da Folha de SP.
“Não precisa de emenda constitucional para dizer que precatório é dívida, e dívida não se submete ao teto de gastos. O teto pode incidir sobre gastos do Judiciário. Agora, em decisão judicial, você não pode impor limite”, pontuou o advogado, que espera que o Congresso não aprove a PEC, mas, caso ela passe na Câmara, a OAB voltará a trabalhar para que a PEC seja modificada no Senado, onde o texto também enfrenta resistências.
Segundo a Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, a fila de pagamentos deve ficar entre R$ 200 bilhões e R$ 250 bilhões até 2026 , ou seja, seriam necessários pelo menos quatro anos para pagar os precatórios postergados apenas de 2022. No pior quadro, as requisições de pequeno valor passariam a ocupar todo o espaço no teto a partir de 2028, adiando o pagamento de todos os precatórios indefinidamente, com uma dívida que pode chegar a R$ 1,5 trilhão ao final de 2036, quando será extinto o teto de gasto.
A OAB destaca que 80% desses precatórios são de caráter alimentar, normalmente de aposentados e pensionistas, que brigaram há décadas na Justiça por seus direitos, e, agora, o governo vem com essa PEC para puni-los novamente.
“Precatório não é problema de finanças públicas, é problema de vontade política. Temos de encontrar uma solução para o Auxílio Brasil, mas há muitas outras coisas [por trás da mudança], fundo partidário, emendas de relator. Está passando a boiada junto”, alertou Gouvêa.