Senado retoma a discussão do novo relatório, sem o fim dos fundos para saúde e educação, na próxima terça-feira (2) e vota, na quarta-feira (3), a matéria em 1º turno. O governo, a seu turno, já definiu o valor (pífio) do auxílio, R$ 250, e o período (pequeno) de quatro meses, começando em março, por meio de medida provisória
O debate no Senado, em torno da votação da chamada “PEC Emergencial” (PEC 186/19), com cláusulas de calamidade pública e de guerra, para aprovar novo auxílio emergencial, condicionado ao fim dos fundos constitucionais da saúde e educação, foi o “bode na sala” encontrado pelo governo para viabilizar outras abjeções contidas na proposta. Esta não “colou”.
Assim, a discussão em torno de novo relatório, excluindo-se a “reforma orçamentaria” que o governo pretendia fazer com o ajuste fiscal, a pretexto de conceder novo auxílio emergencial provisório, com a extinção de fundos constitucionais permanentes, ficou para a próxima semana. A discussão do novo texto do senador Marcio Bittar (MDB-AC) se inicia na terça (2) e vota-se na quarta-feira (3), no Senado, em primeiro turno.
O líder do governo, senador Fernando Bezerra (MDB-PE), até tentou forçar a leitura do relatório, com o “bode na sala”. Mas não houve acordo. “Nós estamos trabalhando para trazer uma proposta final na segunda-feira [1º], a última proposta, fruto de todas as preocupações que foram expressas aqui por diversos senadores. O relatório [atual] precisa ser lido porque foi o trabalho que [Marcio Bittar] fez ao longo desses últimos dias. Com as emendas apresentadas, eu não tenho dúvida de que ele fará o aprimoramento do texto”, disse o líder.
A “explicação”, entendida como “forçação de barra”, causou dúvidas no plenário, e os líderes partidários preferiram liberar suas bancadas na votação do requerimento do senador Paulo Rocha (PT-PA), para levar a PEC para discussão na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). O senador Izalci Lucas (PSDB-DF), por exemplo, disse acreditar que o fim do piso de gastos com educação e saúde — um dos itens mais criticados em plenário — será removido no novo relatório. Segundo ele, não faria sentido apresentar relatório defasado aos senadores.
“Eu entendi que essa questão da Educação e da Saúde já está liquidada. Acho, sinceramente, que ler um relatório de uma questão que já está liquidada não é correto”, ressaltou o senador do DF.
Ficaram mantidas outras restrições orçamentárias, com por exemplo, o congelamento do salário dos servidores por dois anos.
AUXÍLIO EMERGENCIAL
O presidente Jair Bolsonaro afirmou, na quinta-feira (25), durante sua “live” semanal nas redes sociais, que o valor da nova ajuda social a ser proposto pelo governo vai ser de R$ 250. O benefício, segundo ele, deve começar a ser pago ainda em março, por período total de quatro meses. O governo vai enviar medida provisória ao Congresso para iniciar a liberação dos recursos.
O valor é muito baixo, considerando a inflação e a alta dos alimentos, e o período é muito curto, porque a recuperação econômica não é rápida, pelo contrário. Mas como diria a ex-ministra da Economia, Fazenda e Planejamento (1990-1991), Zélia Cardoso de Mello, “o povo é só um detalhe”. A economista foi uma “superministra” no governo Collor (1990-1992), como Paulo Guedes, no governo de Jair Bolsonaro.
“A princípio [sic], o que deve ser feito? A partir de março, por quatro meses, R$ 250 de auxílio emergencial. Então é isso que está sendo disponibilizado, está sendo conversado ainda, em especial, com os presidentes da Câmara [Arthur Lira (PP-AL)] e do Senado [Rodrigo Pacheco (DEM-MG)]. Porque a gente tem que ter certeza de que o que nós acertarmos, vai ser em conjunto”, disse Bolsonaro na live.
A expectativa, segundo o presidente, é que os quatro meses complementares de auxílio possam fazer a “economia pegar de vez”. “Nossa capacidade de endividamento está, acredito, no limite. Mais quatro meses pra ver se a economia pega de vez, pega pra valer”, afirmou.
Inicialmente, o auxílio emergencial, em 2020, contou com parcelas de R$ 600 ou R$ 1,2 mil (no caso de mães chefes de família, as monoparentais), por mês, para cada beneficiário. Projetado para durar três meses, o benefício foi estendido para cinco parcelas.
Em setembro do ano passado, foi liberado o Auxílio Emergencial Extensão, de R$ 300 (R$ 600 para família monoparental), com o pagamento de quatro parcelas mensais. O último pagamento do benefício ocorreu no final de janeiro. Cerca de 67 milhões de pessoas foram contempladas com o programa.
A renovação do benefício ainda precisa ser proposta pelo governo ao Congresso Nacional e, em seguida, aprovada pelos parlamentares, na Câmara e, depois, no Senado.
“CHANTAGEM”
Durante a discussão sobre o adiamento da PEC, realizada em plenário na quinta-feira (25), os senadores reiteraram as críticas aos termos da proposta. Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Zenaide Maia (Pros-RN) questionaram o interesse do governo em vincular o auxílio emergencial a uma reforma orçamentária. Para Zenaide, a atitude configura “chantagem” do Executivo.
“Se o governo tivesse interesse em aprovar o auxílio emergencial, a urgência estaria com uma PEC do auxílio emergencial em separado. Mas [ele] está exigindo do Congresso Nacional, chantageado, que vote contra a Educação, contra a Saúde, contra os servidores públicos”, protestou a senadora.
O senador Major Olimpio (PSL-SP) também destacou a interrupção dos reajustes salariais para os servidores públicos como aspecto negativo da PEC, afirmando que o governo quer “satanizar” a categoria.
“Não vamos permitir que os servidores tenham que pagar de novo a conta da corrupção, da incompetência, dos desvios públicos ao longo de décadas. O que está no relatório é lamentável, um congelamento por mais dois anos subsequentes à calamidade”, declarou.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN) listou outros itens da proposta que ele considera inconvenientes, que chamou de “bodes na sala”. Ele observou que outras despesas de combate à pandemia continuariam restritas pelo teto de gastos, que a PEC cria um “gatilho” de restrição de despesas para estados e municípios e que ela pressiona o governo federal a vender ativos de empresas estatais para conter o crescimento da dívida pública.
“É uma verdadeira concertação em prol do Estado mínimo que está em curso aqui, em plena pandemia, com o auxílio emergencial esperando”, protestou.
O QUE TRAZ A “PEC EMERGENCIAL”
A PEC 186, chamada de “Emergencial”, está contida no “Plano Mais Brasil”, apresentada pelo governo em novembro de 2019, junto com outras duas propostas – as PEC 187 (Fundos Públicos) e 188 (Pacto Federativo). Foram assinadas pelo líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), sob aquela velha cantilena neoliberal, que fariam os liberais ingleses ruborizarem, “medidas permanentes e emergenciais de controle do crescimento das despesas obrigatórias e de reequilíbrio fiscal no âmbito dos orçamentos Fiscal e da Seguridade Social.”
Resumidamente, com a “PEC Emergencial”, o governo pode: 1) reduzir o salário do servidor em até 25%, com redução proporcional de jornada (este item foi retirado da proposta, mas está contido na PEC 188); 2) vetar a progressão e a promoção funcionais de carreira; 3) impedir concessão de reajustes, criação de cargos, reestruturação de carreiras, realização de concurso públicos e a criação de verbas indenizatórias; e 4) proibir o aumento real para o salário mínimo.
MARCOS VERLAINE (colaborador)