
Os peritos da Polícia Criminalística de Sergipe concluíram que Genivaldo Santos, de 38 anos, morreu em virtude de uma asfixia mecânica provocada por um componente químico em sua corrente sanguínea. No entanto, não ficou atestado qual a substância foi inalada durante a abordagem realizada por policiais rodoviários federais, em maio deste ano. A informação foi confirmada na última sexta-feira (2), pela Secretaria de Segurança Pública de Sergipe.
“Ele morreu por um processo de asfixia que ele não conseguia respirar. A reação inflamatória foi tão grande que fechou a via respiratória dele”, explicou o diretor do Instituto Médico Legal (IML), Victor Barros.
Ainda de acordo com ele, o laudo comprovou também a presença da medicação utilizada por Genivaldo. “Foi identificado a medicação em dose terapêutica, ou seja, a hipótese dele estar em surto fica mais difícil de sustentar. Ele estava fazendo uso regular da medicação”.
Durante o trabalho dos peritos, foram produzidos três laudos que se complementam. O toxicológico, que indica quais substâncias estavam na corrente sanguínea da vítima e o cadavérico, realizado a partir da necropsia. Além do anatomopatológico, onde amostras de tecidos, como do pulmão por exemplo, foram analisadas em laboratório, para avaliar as células.
“Em relação ao monóxido de carbono, que é uma das substâncias formadas durante a detonação de uma bomba de gás lacrimogêneo, nós verificamos que não havia no sangue uma concentração alta. Verificamos que essa não foi a substância que provocou a intoxicação, mas precisamos destacar que outras substâncias são formadas durante a detonação da bomba. A literatura científica demonstra que essas substâncias são capazes de provocar asfixia e uma irritação muito grande, disse o perito Ricardo Leal Cunha.
O laudo já foi encaminhado para Polícia Federal, que investiga as circunstâncias da morte do sergipano.
Genivaldo morreu depois de ter sido trancado no porta-malas de uma viatura da PRF e submetido à inalação de gás lacrimogêneo. A certidão de óbito concedida pelo IML à família no dia seguinte à morte apontava asfixia e insuficiência respiratória.
Kleber Nascimento Freitas, Paulo Rodolpho Lima Nascimento e William de Barros Noia foram os responsáveis pela ação que resultou na morte do sergipano. Os agentes envolvidos diretamente na abordagem foram afastados das funções pela PRF, que afirmou que não compactua com as medidas adotadas pelos policiais durante a abordagem.
Os policiais já haviam admitido que usaram spray de pimenta e gás lacrimogêneo dentro da viatura. Os três agentes já prestaram depoimento à Polícia Federal, além de outros dois agentes que assinaram o boletim de ocorrência, mas não participaram da ação.
A Justiça Federal em Sergipe negou o pedido de prisão dos três policiais rodoviários federais envolvidos na abordagem. O pedido foi feito pela defesa da família da vítima.
ATUAÇÃO POLICIAL
Uma portaria de 2010, que regulamenta uso de força policial, e uma lei de 2014, que disciplina o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública, não foram respeitadas por agentes de Sergipe durante abordagem que terminou na morte de Genivaldo, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
De acordo com a portaria interministerial nº 4.226, de 2010, o uso da força pelos agentes de segurança pública deverá se pautar nos documentos internacionais de proteção aos direitos humanos e deverá obedecer aos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência.
O documento determina ainda os procedimentos de habilitação para o uso de cada tipo de arma de fogo ou instrumento de menor potencial ofensivo, o que inclui avaliação técnica, psicológica, física e treinamento específico, com revisão periódica. Nenhum profissional de segurança deverá portar instrumento de menor potencial ofensivo para o qual não esteja devidamente habilitado.
Além disso, o texto afirma que os critérios de recrutamento e seleção para os agentes de segurança pública deverão levar em consideração o perfil psicológico necessário para lidar com situações de estresse e uso da força e arma de fogo.
Segundo a nota técnica divulgada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “a morte de Genivaldo Jesus Santos chocou a sociedade brasileira pelo nível de sua brutalidade, expondo o despreparo da instituição em garantir que seus agentes obedeçam a procedimentos básicos de abordagem que orientam os trabalhos das forças de segurança no Brasil”.
Já a lei 13.060, que disciplina o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo o país, determina, no artigo 3º, que “cursos de formação e capacitação dos agentes de segurança pública deverão incluir conteúdo programático que os habilite ao uso dos instrumentos não letais”.