O pesquisador David Nemer, que estuda as fake news nas redes sociais bolsonaristas, especialmente os disparos em massa pelo WhatsApp nas eleições de 2018, foi ameaçado e teve que deixar o Brasil.
Nemer é brasileiro, mas mora nos EUA e é professor do Departamento de Estudos de Mídia da Universidade da Virgínia. Na Virgínia mora o guru de Bolsonaro, o ex-astrólogo Olavo de Carvalho.
Nemer estava em São Paulo no dia 11 de dezembro e decidiu fazer um passeio em um parque.
No dia seguinte recebeu um e-mail que dizia: “Sabemos que voce esta em Sao Paulo- e melhor voce ter cuidado” [sic]. Em anexo estava uma foto do professor no parque em que tinha passeado. David Nemer foi forçado a voltar para os Estados Unidos.
Para ele, essa ameaça, que não foi a primeira contra si, aconteceu porque suas pesquisas mostram coisas que os grupos bolsonaristas tentam esconder.
“Já tinha recebido vários e-mails de ameaças. Toda vez que publico artigo, que sai uma entrevista minha, me mandam um e-mail de intimidação. Mas dessa vez mandaram uma foto [minha], me seguiram”, disse, em entrevista para o UOL.
“Eu venho pesquisando e monitorando a rede de fake news pró-Bolsonaro. Essa rede de fake news é mantida por um grupo chamado de MAV, Movimento Ativista Virtual, ou milícia virtual”, disse.
O grupo é responsável por defender Bolsonaro nas redes sociais, como Twitter e Facebook, e atacar a oposição, principalmente através de fake news.
“Muita gente acha que fake news é brincadeira. Mas não é. É milícia mesmo”, afirmou.
Ele registrou um boletim de ocorrência (BO) eletrônico na polícia e foi instruído por seus advogados a voltar para os Estados Unidos o mais rápido possível.
Em uma das ameaças anteriores, os bolsonaristas falam que David Nemer não está a salvo nos Estados Unidos porque Eduardo Bolsonaro seria o embaixador do Brasil no país. Devido ao repúdio geral e o desgaste político, os planos de Bolsonaro e do filho embaixador nos EUA foram por água abaixo. “Vc acha que ta salvo ai nos EUA…. Eduardo Bolsonaro, o nosso 03, vai ser o nosso embaixador e voce ta fudido [sic]”, dizia o texto intimidador.
As pesquisas de Nemer revelaram que algumas pessoas receberam entre 400 e 600 reais por semana para disseminar notícias falsas no WhatsApp contra os adversários de Bolsonaro nas eleições de 2018.
Além disso, foram identificados grupos de apoiadores neonazistas e pedófilos. Para ele, “são pessoas específicas que atuam dessa maneira e que se sentem empoderados a tomar tais atitudes devido o discurso extremista do presidente”.
“Esses achados da pesquisa não significam que todos os eleitores de Bolsonaro sejam neonazistas, pedófilos, distribuidores de notícias falsas ou financiados com caixa dois de empresários, ou mesmo que o presidente da República participe dessas condutas”, ressalvou.
O professor também analisa as publicações correspondentes a Bolsonaro nas redes sociais e percebe estranhos aumentos de publicações a favor de Bolsonaro depois de dias em que as críticas foram massivas.
Ele também identificou grupos que fizeram fake news para a campanha de Fernando Haddad (PT). “Você vê que a maioria era para o Bolsonaro, mas também tinha pro [Fernando] Haddad [ex-candidato do PT nas últimas eleições]”, afirmou.
A Polícia Civil de São Paulo rejeitou o boletim de ocorrência do professor David Nemer e quer que ele registre pessoalmente o BO num prazo de seis meses.
Segundo o UOL, o boletim de ocorrência indicava crime de “injúria” no formulário, apesar de se tratar de uma queixa de ameaça. Esse tipo de delito só pode ser feito pessoalmente, de acordo com informação da assessoria da Secretaria de Segurança.
“A Polícia Civil esclarece que o boletim de ocorrência eletrônico foi indeferido, pois foi registrado com uma natureza diversa dos fatos narrados no histórico”, diz nota da polícia.