Defesas de ex-ministro de Bolsonaro e do ex-diretor-geral da PRF alegam que risco de compra de votos motivou operações nas eleições de 2022, mas crime é mais comum em pleito municipal, segundo levantamento
O cerco vai se fechando em torno dos responsáveis pelas blitze ilegais no segundo turno das eleições presidenciais do ano passado.
A PF (Polícia Federal) reuniu dados sobre compra de votos em eleições que devem contrariar a principal tese das defesas de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, e Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da PRF (Polícia Rodoviária Federal).
O objetivo dessas defesas é justificar operações da corporação no dia da votação do segundo turno do pleito do ano passado. Os dois ex-auxiliares do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) argumentam que o número elevado de blitze em estradas do Nordeste visava combater esse tipo de crime eleitoral.
Segundo investigadores, no entanto, o histórico aponta para a predominância desse ilícito em eleições municipais, e não em pleitos gerais.
Uma das possíveis explicações é o fato de ser mais fácil para o candidato interferir no resultado de disputas locais, nas quais pequeno número de votos é capaz de fazer diferença e alterar o resultado do pleito.
DIFICULTAR LOCOMOÇÃO DE ELEITORES DE LULA
A investigação aprofunda a linha de que as operações buscaram dificultar a locomoção de eleitores do hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que superou Bolsonaro no Nordeste, por quase 13 milhões de votos no primeiro turno.
Levantamento feito pelo jornal O Globo, com dados disponibilizados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), mostra que, em 2022, foram abertos em todo o País 74 processos por acusações de compra de votos.
Em comparação, no pleito municipal de 2020 houve 1.076 ações do tipo — quase 15 vezes mais. A eleição geral de 2018, por exemplo, ainda segundo esse levantamento, resultou em apenas 61 processos por compra de voto.
ARGUMENTOS INFUNDADOS
O Nordeste, que concentrou quase 1/3 das abordagens a veículos no País, no segundo turno de 2022 — 2.887 motoristas parados, de 9.133 totais —, não foi a região que teve o maior número de suspeitas de compra de votos no ano passado.
Ainda de acordo com dados da Justiça Eleitoral, a maioria dos processos desse tipo foi registrada no Norte (29). Em seguida, vieram o Nordeste (17) e o Sudeste (12).
Texto encontrado no celular de Marília Alencar, ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça, registra que houve “aumento de pressão” da direção da pasta para falsamente coibir crimes eleitorais.
É citada reunião em que ela foi questionada se seria possível atestar alta que justificasse ampliar o efetivo no segundo turno: “Concluímos que não havia esse incremento, em números de registros, flagrantes etc”.
DEFESA DOS ACUSADOS
A defesa dos acusados foram óbvios em suas alegações para defender seus clientes. O advogado de Torres, Eumar Novacki, afirmou que ele nunca interferiu no trabalho da PRF: “Como já foi esclarecido pelo ex-ministro da Justiça em diversas ocasiões, o planejamento operacional da PRF só chegou ao Ministério da Justiça 10 dias após o 2º turno”.
O advogado de Vasques, Eduardo Pedro Nostrani Simão, tenta justificar que, sejam eleições gerais ou municipais, “o policial está ali para evitar o crime”. E acrescentou que não houve “bloqueios ou barreiras”.
M. V.