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A Polícia Federal no Amazonas (PF) e a Marinha do Brasil estão apurando o desaparecimento na Amazônia do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian. Os dois sumiram neste domingo (5), na região do Vale do Javari, no Estado do Amazonas.
Segundo informações da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Bruno recebia constantes ameaças de madeireiros, garimpeiros e pescadores. Em nota divulgada nesta segunda-feira (6), a entidade diz que eles desapareceram no trajeto entre a comunidade Ribeirinha São Rafael e a cidade de Atalaia do Norte.
“Os dois se deslocaram com o objetivo de visitar a equipe de Vigilância Indígena que se encontra próxima à localidade chamada Lago do Jaburu (próxima da Base de Vigilância da Funai no rio Ituí), para que o jornalista visitasse o local e fizesse algumas entrevistas com os indígenas”, diz o texto da Univaja.
Segundo a nota, Bruno Pereira é “experiente e profundo conhecedor da região, pois foi Coordenador Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) de Atalaia do Norte por anos”. Eles viajavam com uma embarcação nova, de 40 cavalos, e 70 litros de gasolina, o suficiente para a viagem. O servidor deixou o cargo em 2016, durante um intenso conflito registrado entre povos isolados da região.
Em 2018, Pereira se tornou o coordenador-geral de Índios Isolados e de Recém Contatados da Funai, quando chefiou a maior expedição para contato com índios isolados dos últimos 20 anos. Entretanto, foi exonerado do cargo em outubro de 2019, após pressão de setores ruralistas ligados ao governo do presidente Jair Bolsonaro. Conforme a Univaja, nos últimos anos, ele atuava na sede do órgão, em Brasília.
Segundo o The Guardian, Phillips está trabalhando em um livro sobre meio ambiente com apoio da Fundação Alicia Patterson. Ele mora em Salvador e também faz reportagens sobre o Brasil há mais de 15 anos para outros veículos como Washington Post, New York Times e Financial Times.
A maioria dos textos de Phillips publicados no “The Guardian” tem como pauta o avanço do gado, do garimpo e da soja em regiões de floresta conservada no Brasil.
No auge da pandemia de Covid-19, ele fez uma reportagem sobre um novo risco que os Yanomami enfrentavam: o vírus que poderia ser introduzido pelos garimpeiros na região.
O texto de Phillips relatava como, frente à ameaça, o governo do Brasil não só não removeu os garimpeiros como distribuiu cloroquina, um remédio que não tem eficácia para atacar os sintomas da Covid-19.
Em nota, a PF-AM informou que o caso “está sendo apurado”. O órgão não deu outros detalhes das investigações. “Assim que levantadas as informações e, quando disponíveis, encaminharemos para conhecimento de todos”, diz.
AMEAÇAS
Phillips e Pereira desapareceram após fazerem uma pausa numa comunidade ribeirinha, quando estavam fora da terra indígena e voltavam para a cidade de Atalaia do Norte, a principal da região, no oeste do Amazonas.
A Unijava e o OPI dizem que a equipe recebeu “ameaças em campo” durante a visita. A expedição por São Rafael é considerada extremamente perigosa. O trajeto pelas imediações da Terra Indígena (TI) do Vale do Javari não é recomendado em grupos pequenos por causa da movimentação de criminosos estrangeiros e nacionais.
No dia 5, segundo a nota, os dois deveriam voltar para Atalaia do Norte, mas antes fizeram uma parada previamente agendada na comunidade ribeirinha São Rafael para visitar um líder comunitário conhecido como “Churrasco”.
O objetivo da parada era ”consolidar trabalhos conjuntos entre ribeirinhos e indígenas na vigilância do território bastante afetado pelas intensas invasões”.
Segundo a nota, a dupla chegou à comunidade São Rafael por volta das 6h. Como não encontraram o líder, conversaram com sua esposa e partiram rumo a Atalaia do Norte.
A viagem normalmente dura cerca de duas horas. “Assim, deveriam ter chegado por volta de 8h/9h da manhã na cidade, o que não ocorreu”, dizem a Unijava e o OPI.
Segundo a agência “Amazônia Real”, a região de Atalaia do Norte, junto com Tabatinga, na fronteira do Brasil com Peru e Colômbia, é tensa com registro de inúmeros conflitos, inclusive, a morte de um ex-servidor da Funai, em 2019, que denunciava os crimes ambientais na região. (Leia mais abaixo). Desde o final de 2018, o número de ataques de invasores na Terra Indígena Vale do Javari aumentou, como o que aconteceu em dezembro daquele ano.
O desaparecimento é ainda mais angustiante pelo fato de Bruno Pereira e de Dom Phillips terem recebido ameaças nos últimos dias, segundo a Univaja.
Bruno foi um dos responsáveis por pressionar a Polícia Federal para realizar operação contra a pesca e a caça clandestina dentro de terras indígenas. Ele próprio esteve numa destas ações, que resultou na prisão de duas pessoas e apreensões de embarcações.