A Polícia Federal afirmou que o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, planejou o assassinato da vereadora Marielle Franco junto com os irmãos Brazão e, depois, agiu destruindo provas e atrasando a investigação para acobertar os mandantes.
Rivaldo Barbosa foi preso no domingo (24), junto do deputado federal Chiquinho Brazão e seu irmão, Domingos Brazão, que é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Rio de Janeiro.
Na investigação, a PF identificou que Rivaldo foi “um dos arquitetos, na companhia dos Irmãos Brazão”, do crime.
O plano do grupo criminoso incluía manter a investigação no âmbito municipal e “afastar outros órgãos, sobretudo federais, da persecução do crime”. Dessa forma, Rivaldo conseguiria acobertar os autores.
No dia seguinte ao assassinato de Marielle, Rivaldo indicou um homem de sua confiança, Giniton Lages, para a Delegacia de Homicídios do Rio, forma pela qual “se operacionalizou a garantia da impunidade dos autores do delito”.
A PF apontou que o grupo criminoso conseguiu obstruir a investigação ignorando provas, como as imagens que mostravam o trajeto feito pelo carro utilizado no assassinato para a fuga do local.
Um policial civil não identificado até foi ao local onde as imagens estavam armazenadas, mas elas não foram acopladas à investigação. Mais tarde, a investigação da Polícia Civil argumentou que havia um erro na leitura dos arquivos.
Rivaldo Barbosa também agiu destruindo outras provas, a exemplo do sumiço do celular de Eduardo Siqueira, ou Dudu do Clone, que foi quem clonou a placa do carro utilizado no assassinato. Quando o Ministério Público pediu o aparelho apreendido para periciá-lo, ele não foi encontrado.
Além disso, a PF encontrou indícios de que o grupo criminoso forjava denúncias anônimas, feitas sempre em uma ligação direta para a Delegacia de Homicídios, para justificar rodeios e falsos suspeitos.
Um dos assassinos, Ronnie Lessa, que fechou um acordo de delação premiada, ouviu dos irmãos Brazão que “Rivaldo já estava redirecionando e virando o canhão para outro lado”. Naquele momento, Rivaldo estava agindo para colocar a culpa no vereador Marcelo Siciliano e no miliciano Orlando Curicica.
“Ele [Rivaldo] teria que de qualquer forma resolver isso, essa questão, que já tinha recebido para isso no ano passado, no ano anterior. (…) Ele já recebeu desde o ano passado; então ali a gente fecha essa questão do pré-pago, deu pra ficar bem explícito que ele recebeu antes do crime, o doutor Rivaldo, para traçar essas diretrizes”, continuou.
“A Delegacia de Homicídios se enveredou pela construção de uma linha calcada em premissas absolutamente movediças […]. Moveu todo o aparato estatal para supostamente atribuir falsamente crimes a pessoas que não os cometera, promover o desaparecimento de evidências, negligenciar colheitas de provas objetivas, entre outras impropriedades”, escreveu a Polícia Federal em um relatório.
Ainda segundo o relatório, o grupo criminoso não esperava tamanha repercussão na mídia e na sociedade acerca do assassinato. Pressionado, Rivaldo “estava pulando fora; o Rivaldo virou as costas; e o Rivaldo alegou que não tinha mais como segurar, fugiu a [sic] alçada dele, e não tinha mais como segurar, tentaram até onde deu e perdeu o controle”, contou Ronnie Lessa.
“Com o fim de estancarem a pressão imposta pela sociedade civil e pela mídia, Rivaldo e Giniton, de supetão, conforme será visto adiante, jogaram os executores do delito aos leões e imputaram-lhes a tese do ‘crime de ódio’, com o fim de fechar a tampa da apuração e preservar os autores intelectuais”, explicou a PF.
ESPOSA
A Polícia Federal ainda destacou que a renda da esposa de Rivaldo, Erika Andrade de Almeida Araújo, subiu abruptamente em 2015, quando ele assumiu a Delegacia de Homicídios do Rio.
Sua renda anual saltou de R$ 32 mil para R$ 504 mil, um aumento de 1.444%, ao passo que ela “passou a ser beneficiária de considerável volume de ‘lucros e dividendos’” das empresas que a esposa tinha com o marido. Em 2017, a renda dela foi de R$ 927 mil.
Os investigadores entendem que essa pode ter sido uma forma de “não chamar atenção dos órgãos de controle” para o crescimento da renda de Rivaldo, “tendo em vista as funções de destaque” que ele tinha na Polícia Civil.
PROPINA NA DELEGACIA
Um miliciano que prestou depoimento para a investigação, Orlando Curicica, relatou para a Polícia Federal que o crime organizado paga uma propina mensal para os delegados da Delegacia de Homicídios acobertarem seus crimes.
Em caso de crimes com “rastros”, eles recebiam um bônus.
Em seu relato, Orlando contou que existe uma “tabela” que organiza quanto cada delegacia recebe mensalmente do crime organizado.
“Delegacias como a 22, a 21, a 27, a 38, elas ganham R$ 40 mil por mês da contravenção. Existe uma tabela, tá?”, disse.
“A DH [Delegacia de Homicídio], as especializadas ganham mais que varia entre R$ 60 e R$ 80 mil por mês e, na DH, além do que eles recebem mensal, quando entra um homicídio [que], por exemplo, deixou uma filmagem, deixou um rastro que eles conseguem direcionar o homicídio para determinado contraventor, eles pagam por fora”, completou.
Orlando Curicica dá como exemplo várias mortes de contraventores que não foram devidamente investigadas. Entre eles, cita Geraldo Antônio Pereira morto em um tiroteio em uma academia de ginástica no Recreio dos Bandeirantes em 2016. Segundo ele, a DHC teria recebido de uma pessoa ligada ao contraventor Rogério Andrade cerca de R$ 300 mil para não “perturbar” os envolvidos na execução de Pereira.