PF flagra membro da facção CV reunido com cúpula do governo bolsonarista do Rio

Cláudio Castro e o traficante de armas do CV, TH Joias (reprodução)

Relatório policial mostra que Gabriel Dias de Oliveira, apontado pela PF como tesoureiro do Comando Vermelho, reuniu-se com Gutemberg Fonseca, secretário de Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro, do governo Castro

Ao mesmo tempo em que o presidente da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Crime Organizado, senador Fabiano Contarato (PT-ES), afirma que o colegiado deve mirar políticos e o “andar superior”, reportagem da Folha de S. Paulo revela íntimas relações entre a cúpula do governo bolsonarista do Rio de Janeiro com a cúpula do Comando Vermelho (CV). Não por acaso a chacina de Cláudio Castro, que matou 121 pessoas na zona Norte do Rio, não prendeu nenhum líder importante da facção.

A reportagem da Folha de S. Paulo mostra que Gabriel Dias de Oliveira, conhecido como Índio do Lixão, apontado pela Polícia Federal como tesoureiro do Comando Vermelho, reuniu-se com Gutemberg Fonseca, secretário de Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro, do governo Cláudio Castro (PL), para tratar de apoio político. As informações estão no relatório final da Operação Zargun, do dia 27 de setembro. A ação, deflagrada no início de setembro, mirou agentes públicos e políticos ligados ao tráfico internacional de armas e drogas.

Gabriel Dias de Oliveira e o traficante TH joias (reprodução)

De acordo com o relatório da polícia, o encontro entre os dois ocorreu no dia 13 de maio, segundo conversas extraídas do celular de Índio. Uma delas é um áudio enviado a Alessandro Pitombeira Carracena, que foi secretário estadual de Esporte e Lazer do Rio em 2022, além de subsecretário de Defesa do Consumidor até janeiro deste ano – ambos cargos na gestão Castro. Índio relatou que esteve com o secretário de “onde o senhor trabalha” e que conversou sobre política e sobre como poderia ajudá-lo. A polícia deduziu tratar-se de Gutemberg.

O suspeito também afirmou que foi levado por um interlocutor para que o secretário o conhecesse, “a fim de ver como poderiam se ajudar politicamente”. Ele finalizou dizendo a Carracena que Gutemberg poderia entrar em contato, no dia seguinte, para perguntar quem era e se “estava dentro do problema ou não”. A polícia interpretou o diálogo como uma solicitação de “cobertura política”.

A PF também destacou que, no dia 5 de junho, Índio enviou a Carracena um vídeo de Gutemberg em um evento da Enel, distribuidora responsável pelo fornecimento de energia no Rio, e disse: “Ficou forte ele com Enel né”. Carracena respondeu: “Muito é por causa de você”. A seguir, Índio desabafou, segundo o relatório: “Não vou mais incomodar ele não, doutor, não posso ficar forçando ele me ajudar se no coração dele não quer me ajudar”. O ex-secretário respondeu, ainda segundo as mensagens, que estava “lutando por isso”, ao que Índio afirmou: “Se ele quisesse, já teria feito”. O suposto tesoureiro ainda disse: “Ainda mais depois do que eu fiz”.

Índio e Carracena foram presos durante a deflagração da Operação Zargun, no início de setembro. O primeiro é apontado pela PF como o principal responsável pela negociação de armas e drogas para o Comando Vermelho, “mantendo estreitas conexões com lideranças criminosas que atuam no Complexo do Alemão”.

Segundo o apurado, ele também participava de operações clandestinas de câmbio e ocultava e dissimulava os recursos adquiridos no esquema, que eram repassados a traficantes. Para a polícia, ele também fazia a intermediação entre os chefes de facções criminosas e autoridades públicas. A PF apurou que o Comando Vermelho pretendia lançá-lo como vereador em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.

Segundo a polícia, ele ganhou o apelido “do Lixão” por chefiar o comércio de drogas na Favela do Lixão, no município. Ele chegou a ser preso em 2015. Já Carracena, de acordo com a PF, atua como braço político e jurídico da facção. Ele teria recebido dinheiro de seus membros para vazar operações policiais para o grupo e atender a interesses por meio de contatos adquiridos na vida pública. O secretário Gutemberg Fonseca não desmentiu o encontro com Índio, mas negou que o assunto fosse apoio político.

O dois membros do CV, Índio e TH Joias, antes da prisão (reprodução)

O deputado estadual Thiego Santos (MDB-RJ), conhecido como TH Jóias, traficante de armas, mantinha relação próxima com o governador Cláudio Castro (PL-RJ). TH foi preso pela Polícia Federal, sob a acusação de envolvimento com o tráfico de armas e drogas no Rio de Janeiro. De acordo com os investigadores, o parlamentar teria atuado como braço político do CV (Comando Vermelho), principal facção de tráfico do estado.

A Polícia Federal interceptou áudios que, segundo os investigadores, mostram a proximidade de TH Joias, com integrantes do Comando Vermelho. Em uma das gravações, de julho de 2024, TH responde a um pedido de Gabriel Dias de Oliveira, o Índio do Lixão, apontado como um dos chefes da facção no Complexo do Alemão.

O parlamentar diz: “Seu pedido é uma ordem. Eu trabalho pra você”. De acordo com a PF, o diálogo mostra subordinação do deputado ao traficante, reforçando a tese de que ele atuava como braço político da organização criminosa. Logo em seguida, Índio repreende o parlamentar: “Para dessa palhaçada de falar que trabalha pra mim. Tô trabalhando pras tuas contas aqui”.

TH Joias ostentava a proximidade com o governador Cláudio Castro nas redes sociais, compartilhando diversas fotos e vídeos em agendas públicas e ocasiões informais –como jogos do Flamengo, clube de coração dos dois. Outro preso na operação ocupou diversos cargos na gestão de Castro: o advogado Alessandro Pitombeira Carracena foi secretário de Esporte e Lazer de Castro, em 2022, e depois passou por diversos cargos na pasta de Defesa do Consumidor, até janeiro de 2025. Ele é apontado como responsável por vazar operações policiais para integrantes do CV.

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