Bolsonaro, que em março disse que botava a “cara toda no fogo” por Milton Ribeiro, agora joga o bagaço fora e descarta o seu amigo: “Ele que responda pelos atos dele”. “Se a PF prendeu, tem um motivo”, completou
A Polícia Federal prendeu o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, e pelo menos um dos pastores ligados a Bolsonaro, nesta manhã de quarta-feira (22), em uma operação contra o tráfico de influência e os desvios que se instalaram no Ministério da Educação, com liberação irregular de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
A PF cumpriu mandados de busca e apreensão em endereços de Milton Ribeiro e dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, que recebiam propina pela liberação de verbas do MEC para prefeituras. Eles atuavam no ministério, sem ter cargos, com autorização de Bolsonaro.
A operação, batizada de Acesso Pago, investiga, com base em documentos, depoimentos e um relatório da CGU (Controladoria-Geral da União), crimes na liberação de verbas do FNDE. Ao todo, são cumpridos 13 mandados de busca e apreensão e cinco de prisões em Goiás, São Paulo, Pará e Distrito Federal.
O juiz Renato Borelli, da 15ª Vara Federal em Brasília, detalhou em seu despacho os crimes cometidos pelo ex-ministro. São eles: corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência.
O juiz mandou que o ex-ministro Milton Ribeiro seja transferido para a superintendência da PF no Distrito Federal.
Os pastores Gilmar e Arilton negociavam com prefeitos a liberação de recursos federais em troca de propina, que podia ser paga até em barra de ouro.
Em áudios, em uma reunião com prefeitos no Ministério, o então ministro Milton Ribeiro diz que os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura tinham prioridade na distribuição de recursos por ordem de Bolsonaro.
“A minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, disse Milton Ribeiro em um áudio divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo. “Por que ele? Porque foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, relatou o ministro.
Testemunhos de prefeitos comprovam que os pastores cobravam propina para liberar verbas para os municípios.
O prefeito de Luis Domingues (MA), Giberto Braga (PSDB), denunciou que um dos pastores ligados a Jair Bolsonaro envolvidos na manipulação ilegal de verbas federais do Ministério da Educação pediu 1 kg de ouro (equivalente a R$ 308.050) para liberar os recursos para obras no setor de educação para a cidade.
O prefeito relatou que o pastor pediu um valor de R$ 15 mil, segundo ele para cobrir custos de protocolo. “Depois, quando o valor fosse liberado, seria paga uma quantia X”, disse o prefeito, explicando que, como a sua região é uma área de mineração, o pastor pediu um quilo de ouro. “Eu não aceitei. Ele disse que sem os R$ 15 mil não seria protocolado. “Como eu não transferi o dinheiro, não foi protocolado”, afirmou o prefeito, em entrevista ao Estadão. O pedido de ouro em troca de liberações de recursos foi feito pelo pastor Arilton Moura.
Kelton Pinheiro (Cidadania), prefeito da cidade de Bonfinópolis, disse que, apesar de precisar de uma escola nova, se negou a aceitar a proposta de pagamento de propina feita pelo pastor Arilton Moura.
O prefeito relatou que, por intermédio do pastor Gilmar, conseguiu ser recebido pelo ministro da Educação numa reunião com vários prefeitos. Assim como Gilberto Braga, Kelton disse que os prefeitos foram almoçar e que, nesse momento, o pastor Arilton, que também estava no encontro, fez o pedido de propina.
Kelton Pinheiro contou ao Estadão que Arilton Moura também propôs ainda uma contribuição para a igreja. “Se você quiser contribuir com a minha igreja, que eu estou construindo, faz uma oferta para mim, uma oferta para a igreja. Você vai comprar mil bíblias, no valor de R$ 50, e você vai distribuir essas bíblias lá na sua cidade. Esse recurso eu quero usar para a construção da igreja”, disse o pastor, segundo o prefeito. “Fazendo isso, você vai me ajudar também a conseguir um recurso para você no Ministério”.
Também ao jornal “O Globo”, o prefeito José Manoel de Souza (PP), da cidade paulista de Boa Esperança do Sul, relatou outro pedido de propina de R$ 40 mil por parte de Arilton, para liberar verba para construção de escolas profissionalizantes no município. Ele disse que foi levado a um restaurante de um hotel em Brasília depois de um evento no MEC em 2021.
Bolsonaro, que em março disse que botava a cara no fogo por Milton Ribeiro, agora descarta o seu amigo. “O Milton, coisa rara eu falar aqui, eu boto a minha cara no fogo pelo Milton. Minha cara toda no fogo pelo Milton”, disse na ocasião em que estourou o escândalo.
Agora, em entrevista à rádio Itatiaia de Minas Gerais nesta manhã, ao saber da prisão, Bolsonaro falou: “Ele que responda pelos atos dele”. “Se a PF prendeu, tem um motivo”, completou.
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se a PF deixar de agir como SABUJO do governo bolsonaro e trabalhar como órgão de Estado, certamente chegará ao núcleo central desse quadrilhão que se infiltrou no Planalto.