O governo de Fernando Pimentel (PT) está fazendo, na surdina, um movimento altamente suspeito em relação à Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig), empresa estatal que exerce, em nome dos mineiros, os direitos de lavra do nióbio e das águas minerais naturais de algumas cidades, entre elas, Caxambu, Lambari e Cambuquira. Ele dividiu a empresa em duas, uma responsável pelo controle da exploração do nióbio, altamente rentável, e a outra, das águas minerais, deficitária.
Com o nome atual (Codemig), ficaria a companhia responsável pela exploração do nióbio. Já a recém-criada Codemge ficaria apenas com os negócios deficitários da empresa pública, como a área de economia criativa e a exploração das águas minerais. A manobra de Fernando Pimentel tem um objetivo claro: vender os 49% da Codemig de forma rápida para que o dinheiro entre no caixa do Estado e seja usado pelo governo como ele bem entender. O petista espera arrecadar de 6 a 8 bilhões de reais. Ou seja, quando era oposição, dizia que era contra a privatização, mas, agora, que está no governo, o PT vai vender a Codemig e passar, não se sabe para quem, o já suspeito (des) controle sobre a produção e comercialização bilionária do nióbio, minério estratégico, consumido em todo o mundo.
A divisão da Codemig ocorreu em um processo de sigilo absoluto na empresa pública. No último dia 20 de fevereiro, a Codemig registrou na Junta Comercial do Estado de Minas Gerais (Jucemg) o desmembramento da empresa, a mudança no estatuto e a criação da nova subsidiária: a Codemge. As mudanças na empresa foram reveladas por funcionários que pediram anonimato. “A Codemig ficaria só com o filé, sem o penduricalho”, afirmou um deles. Os funcionários estão apreensivos, já que a nova companhia nasce sem receita própria e com grandes chances de se tornar deficitária.
Os principais interessados na compra da Codemig são exatamente a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), da família Moreira Sales, e seus sócios do Itaú/Unibanco, que exploram, desde 1965, sem licitação, o nióbio da região. A mineradora fica em Araxá, área que detém a maior reserva de nióbio do mundo. Num contrato celebrado em 1972, a CBMM é obrigada a conceder 25% da participação nos lucros ao governo, via Companhia Mineradora de Minas Gerais (Codemig). Os números da CBMM são uma verdadeira caixa preta. Ninguém consegue controlar nada sobre a extração e venda do nióbio. Ninguém sabe exatamente quanto é produzido e nem quanto é vendido. Com a privatização da Codemig, o governo perde totalmente qualquer controle e ainda vai entregar 100% dos rendimentos, certamente para a própria CBMM, que hoje já fica com 75% dos lucros operacionais.
Histórico
Em 1955 a CBMM iniciou as suas operações industriais. Em 1965, o almirante norte-americano Arthur Radfort, integrante do conselho da mineradora americana Molycorp, convenceu o banqueiro Walter Moreira Salles a investir no mercado de nióbio. O Brasil tornou-se atualmente o maior produtor mundial de nióbio. Entre 1959 até 1965, a companhia de Radfort e Salles desenvolveu uma técnica de concentração de nióbio nas ligas entre 2,5% até 60% – utilizado em especial na indústria siderúrgica. Em 1972, o Estado constituiu a Companhia Mineradora de Piroclaro de Araxá (Comipa), para gerir e explorar o nióbio, em Araxá. A Comipa arrendou 49% da produção do nióbio para a CBMM, sem licitação.
A Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração – CBMM é do Grupo Moreira Salles, fundador do Unibanco, que hoje é do Itaú. Eles detém 75% das ações da empresa. Outros 15% estão com empresas chinesas e os outros 10% com empresas japonesas e coreanas. Mas, a verdade é que há uma multinacional americana por trás do Grupo Moreira Salles e a quem o grupo serve, como “testa de ferro” no Brasil, desde os anos 50. É a multinacional norte-americana Molycorp, inc. A Molycorp domina o mercado mundial de terras raras. Tanto isso é verdade que os Moreira Sales não escondem que têm parceiros “secretos” na empresa. O Nióbio brasileiro ganhou notoriedade em 2010, quando documentos do governo dos EUA, vazados pelo Wikileaks, incluíram as minas de Araxá (MG) e Catalão (GO), outra região produtora, no mapa de áreas estratégicas para os EUA. A CBMM financiou durante muito tempo as atividades políticas do PSDB em Minas Gerais e, agora, ela está se entendendo muito bem com o PT.
Na avaliação do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG), a venda das ações da Codemig pode agravar o já dramático problema da renúncia de receitas do Estado, piorando a crise financeira que o MG enfrenta. “A questão da renúncia de receita no futuro está diretamente ligada à Codemig, já que a receita da mineração do nióbio, mesmo com os desfalques, se reverte diretamente em receita para o Estado. Com a abertura do capital, 49% desse valor vai para a iniciativa privada”, explica o assessor do TCE, Pedro Henrique Magalhães.
O MPF e o TCE-MG informam que os recursos arrecadados com a abertura de capital da Codemig não poderão ser utilizados de qualquer maneira. “Não pode ser utilizado para pagamento de despesas correntes (como folha de pagamento). O Estado deverá usar o recurso apenas para fazer investimentos”, explica Magalhães. O nióbio produzido em Araxá responde por 75% de toda a produção mundial. Sua produção anual é de 90 mil toneladas da liga de ferronióbio. Estimativas apontam que o nióbio de Araxá teria reserva para ser explorado por mais de 400 anos.
A aplicação mais importante do nióbio é como elemento de liga para conferir melhoria de propriedades em produtos de aço, especialmente nos aços de alta resistência e baixa liga usados na fabricação de automóveis e de tubulações para transmissão de gás sob alta pressão. É utilizado, ainda, em superligas que operam a altas temperaturas, em turbinas de aeronaves a jato, entre outras finalidades. Existem somente três minas em todo o mundo. No Brasil, onde estão 98% das reservas conhecidas do metal, só existe outra mineradora, a Catalão, em Goiás, da britânica Anglo-American, com produção de 8%.
Auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas Minas Gerais (TCE) nas prestações de contas dos governos de Minas (PSDB e PT), revelam suspeitas de que a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), que detém o monopólio na extração de nióbio, está lesando os cofres de governo mineiro, ao praticar subfaturamento (valor menor que a cotação) do quilo do produto e também pela falsificação nas informações de quantidades de minério extraído e vendido. A CBMM informa faturamento de R$ 4 bilhões, mas ele seria muito maior do que isso.
De acordo com documentos do Tribunal, a CBMM repassa ao Estado 25% de seu faturamento, vendendo o quilo do mineral por menos de U$$ 40. Mas, de acordo com dados da Secretária Comércio Exterior do governo federal, o quilo do nióbio praticado no mercado internacional é U$$ 52,36. As disparidades da quantidade do nióbio extraído e as toneladas comercializadas mundialmente são gigantescas. As quantidades extraídas e vendidas são bem superiores às declaradas pela Companhia.
Ou seja, boa parte do nióbio sai do Brasil ilegalmente. É puro contrabando. De acordo com o documento, é natural a perda entre extração direta de mineral, mas em razão do alto volume de perda do nióbio não foi encontrada nenhuma justificativa. É desta maneira que o nióbio vem sendo roubado, tanto nos governos do PSDB quanto do PT. Agora com o agravante de que o petista Pimentel, além de continuar permitindo a evasão criminosa, quer privatizar de vez a Codemig.
SÉRGIO CRUZ