30Revolta popular contra a fraude do governo neoliberal na eleição para presidente
Uma multidão tomou as ruas de Tegucigalpa, San Pedro Sula, La Ceiba e das principais ruas de Honduras contra o assalto às urnas praticado pelo golpista Juan Orlando Hernández (JOH), candidato à reeleição. Até a tarde de terça a repressão causada pelas forças do governo já havia assassinado sete pessoas e ferido mais de 20, em meio ao “toque de recolher” e ao “estado de sítio”, às bombas de gás e tiros disparados a esmo.
A Aliança de Oposição Contra a Ditadura em Honduras, coalizão que liderou durante todo o período a apuração das eleições ocorridas no dia 26 de novembro, divulgou documento no último domingo em que repudia a vergonhosa fraude. A frente opositora afirmou ter sido informada por funcionários do próprio Tribunal Supremo Eleitoral de Honduras (TSE) que o servidor que abrigava os dados das eleições presidenciais foi formatado durante a apuração. Depois do sistema ter sido “limpo”, JOH passou, de uma hora para outra, a liderar a contagem dos votos.
“Quem sai eleito desta forma não poderia governar um povo. Ninguém deve obediência a um governo usurpador, como diz a Constituição”, afirmou o ex-presidente Manuel Zelaya, do Partido Liberdade e Refundação (Libre). Caso o governo persista na fraude, alertou o ex-presidente, haverá “uma escalada de desobediência civil”. “Eu não ia querer governar com uma rejeição de 70% das pessoas, que estão nas ruas, não se poderia estabelecer um governo nessas condições”, frisou.
Das mortes confirmadas três foram à bala em San Pedro Sula, no norte; dois em Choloma e o sexto em La Ceiba. A sétima vítima é uma jovem de 19 anos, Kimberly Dayana, de colônia Villanueva, em Tegucigalpa. A jovem saia de casa à noite para avisar um tio sobre o toque de recolher quando foi barrada pela polícia. “Saíram detrás de uma árvore uns policiais militares disparando a torto e a direito e a mataram com um tiro na cabeça”, relatou sua irmã.
MANIPULAÇÃO
“O servidor da base de dados foi formatado, isto é, apagado por completo e instalado do zero a partir de 29 de novembro de 2017. As inserções de manuais de uma suposta cópia física são armazenadas em outro servidor. Todos os eventos a partir de 26 de novembro foram eliminados”, destaca a carta da Aliança, assinada por Salvador Nasralla, candidato da oposição, e por Zelaya.
Segundo a oposição, os técnicos do Tribunal informaram que como os dados do servidor secundário estavam corrompidos não poderiam ter sido utilizados. Ainda assim, “de acordo com a declaração dos técnicos da TSE, a execução de todas essas ações foi autorizada pelo Tribunal”.
Portanto, conforme denunciam Zelaya e Nasralla, toda a contagem realizada no período anterior a 29 de novembro – em que todas as pesquisas indicavam a vitória oposicionista – foi apagada e reintroduzida manualmente, por meio de outro servidor, também defeituoso. Antes da formatação ser feita, Nasralla liderava com uma vantagem de 5%.
“Deve se revisar tudo. O sistema caiu por 10 horas e um dos servidores foi danificado. Creio que tudo isso deve ser investigado e perguntado à empresa contratada”, declarou Marco Ramiro Lobo, juiz suplente do TSE, para quem deve ser feita uma investigação pormenorizada de todo o ocorrido.
A oposição também apontou uma série de solicitações que não foram atendidas pelo TSE, como o envio de 5.174 atas. Em vez disso, recebeu tão somente “um arquivo de números no Excel, sem imagem das atas”. 198 atas sequer teriam chegado a ser escaneadas.
RECONTAGEM
Em relação à necessidade de recontagem dos votos dos departamentos de Lempira, Intibucá e La Paz, “onde a média nacional supera a média de todos os departamentos de Honduras, o Tribunal se negou a fazer a análise, verificação e soma de resultados”. “Isso confirma que existe algo de manipulação eleitoral nestes três departamentos”, sublinha a nota, “onde existem indícios de duplicação e substituição de atas, dados de transmissão e registros de resultados”. A tentativa é clara: “repetir as eleições fraudulentas de 2009 e 2013”.
Sublinhando que as fraudes “têm destruído a credibilidade do Tribunal perante a comunidade nacional e internacional”, a oposição defende que “se suspenda de imediato o estado de sítio e se convoque os principais partidos políticos para que, através do diálogo, se construa um consenso para a verificação da validação da apuração em definitivo”.
A Conferência Nacional de Direitos Humanos de Honduras (Conadeh) condenou como “terrorismo de Estado” o uso abusivo de forças policiais contra manifestantes que protestavam pacificamente pela recontagem dos votos. A Conadeh reiterou que a candidatura de JOH é ilegal e inconstitucional, pois foi realizada via decreto, passando por cima das leis e se sobrepondo à própria Constituição.
Repudiando “o ataque aos jornalistas por parte das forças de segurança e o cerco aos meios de comunicação”, a Conadeh afirmou que o país “vive grandes retrocessos democráticos e violações a direitos humanos” e decidiu denunciar o governo de JOH à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e ao Alto Comissionado das Nações Unidas em Direitos Humanos.
Conforme os resultados oficiais divulgados pelo TSE, foram 1.411.517 votos pela reeleição de JOH (42,98%), contra 1.359.170 votos de Nasralla (41,39%).
“Não continuaremos a reprimir os hondurenhos”
“Não somos máquinas nem robôs e não estaremos nos expondo a que nos matem nas ruas ou reprimindo o nosso povo. Antes de sermos policiais, somos seres humanos”, afirmaram agentes do Comando de Operações Especiais (Cobras), durante protesto nesta segunda-feira em frente às instalações do seu quartel general, em Tegucigalpa.
“Somos garantias do povo, não podemos reprimir e nos matar entre nós. Todos temos famílias e estão sofrendo”, declarou um agente.
Denunciando o atraso nos salários de outubro e novembro, cerca de 300 Cobras condenaram a manipulação, a repressão e a precarização das condições de trabalho. Diante do protesto, tiveram que enfrentar a provocação da Polícia Nacional e Militar da Ordem Pública, que lançou bombas de gás contra os manifestantes.
LEONARDO SEVERO