ISO SENDACZ (*)
Na reunião acadêmica de encerramento do ano letivo do grupo de estudos paraibano, o convidado foi o Dr. Carlos Lopes, psiquiatra e diretor da Hora do Povo. O núcleo de pesquisas da pós-graduação da UFPB desenvolve a Ciência do Direito, a partir de conceitos marxistas e do realismo judiciário dos EUA rooseveltiano.
O médico formado na UFRJ em tempos que não havia garantia de vida a quem não concordasse com o governo, registrou, de plano, a importância da conquista de, nos dias hoje, combater o obscurantismo sem risco de morte imediata.
Lopes explicou que pós, o que vem depois, não significa uma evolução da coisa, mas a sua decadência, permitindo que o novo aflore. Trouxe o exemplo do que tem sido chamado de pós-verdade: há a verdade, os fatos, a realidade, e as narrativas, que parecem competir entre si para obter mais seguidores, mesmo que sem relação com o mundo real. Uma tradução de pós-verdade é a bem conhecida mentira.
Ainda no campo conceitual, destacou a importância, inclusive na sua especialidade médica, de se revelar a essência das coisas, para além da sua aparência. Essa é a missão da ciência. Da política veio o modelo: de há muito procura-se dizer que é de esquerda o que na verdade é essencialmente de direita (mais em O Espectro Político).
O pós-modernismo que ocupa o pensamento das mais destacadas universidades europeias e estadunidenses mais não é do que dispensar o critério da verdade nas narrativas disseminadas erudita e popularmente; dispensar o nexo causal entre os fenômenos da Natureza, a necessária causa que leva a uma determinada consequência.
Do festejado francês Foucault vem a ilustração: ás no pós-modernismo, o filósofo cuja História da Loucura era muito lida nas faculdades de Medicina, resumidamente entende que é o diagnóstico que cria a doença; em outro volume, na oclusão de sua carreira, dispôs que a essência do Estado era a sua desnecessidade, dogma apresentado como de esquerda, mas que faria corar alguns neoliberais honestos, mais conexos com a realidade dos fatos.
Irmã gêmea do pós-modernismo, a pauta identitária é individualista e desagregadora da luta verdadeiramente emancipatória. Mais, falseia a identidade principal do indivíduo com a Humanidade e a Nação. E igualmente permite a criação de elites exploradoras dos seus próprios pares da identidade menor. “Uma armadilha”, sintetizou o convidado.
Uma palavra à parte, Lopes dedicou à condição feminina, essencial para a continuidade da espécie: o grau de civilização de uma sociedade é medido pela situação da mulher. Quando não há igualdade de gênero, as relações sociais são atrasadas. Mas nem por isso a luta feminina é contra os homens em geral: é nacional e de classes, como deve ser a pauta de quaisquer segmentos sociais classificados de forma segregada.
Lembro-me da história contada por um amigo sobre um formulário que seu filho tinha que preencher. Havia o campo “raça” e o jovem lhe perguntou como proceder, obtendo como resposta “escreva: humana”. Quando assumimos o primeiro Conselho Participativo da Sé e íamos nos qualificar para o cadastro, contei aos meus pares sobre isso. Todas as fichas foram preenchidas com a nossa identidade comum, como se pode aferir em algum arquivo da Prefeitura Regional paulistana.
Quando tanta gente vende gato por lebre e incautos aceitam como o suprassumo da modernidade a supressão da sua própria identidade e a ignorância da realidade, só resta concordar com Carlos Lopes quando ele afirma que o sucessor do iluminismo é o marxismo. O pós-modernismo nada mais é que a decrepitude de relações sociais outrora úteis, que hoje não servem mais e atrapalham o progresso humano.
(*) Engenheiro Mecânico pela EESC-USP, Especialista aposentado do Banco Central, diretor do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central e do Instituto Cultural Israelita Brasileiro, membro da direção estadual paulista do Partido Comunista do Brasil. Nascido no Bom Retiro, São Paulo, mora em Santos.