O presidente repetiu as mentiras ditas pelo funcionário da empresa de fake news, Hans River do Nascimento, e ainda citou montagem de live grotesca espalhada pela milícia digital contra Patrícia Campos Mello
Jair Bolsonaro ofendeu a repórter da “Folha de S. Paulo” Patrícia Campos Mello, na terça-feira (18), com insinuações de que a jornalista pudesse ser uma prostituta.
A baixaria foi feita na saída do Palácio do Alvorada onde Bolsonaro citou o ex-funcionário da empresa de marketing digital Yacows, Hans River do Nascimento, que mentiu em seu depoimento à CPI das Fake News, dizendo que a jornalista teria se insinuado para ele em troca de informações sobre a campanha de Bolsonaro.
A empresa onde Hans trabalhava é investigada no esquema de disparo de mensagens falsas por meio da rede social durante as eleições. Hans tinha entrado em litígio com a empresa e depois se entendeu com sua direção.
“Olha, a jornalista da Folha, tem mais um vídeo dela aí”, disse Bolsonaro, referindo-se exatamente a um fake news divulgado pela milícia bolsonarista com montagens grotescas e difamações à profissional.
“Eu não vou falar aqui porque tem senhora do meu lado. Ela falando eu sou a ‘tatata’ do PT. Tá certo? E o depoimento do Hans River foi no final de 2018 para o Ministério Público, ele diz do assédio da jornalista em cima dele. Ela queria um furo. Ela queria dar um furo [pausa, pessoas riem] a qualquer preço contra mim. Lá em 2018, ele já dizia que eles chegavam perguntando ‘o Bolsonaro pagou para você divulgar informações por Whatsapp?’”, disse ele.
Imediatamente surgiram manifestações de toda a mídia em repúdio às ofensas de Bolsonaro. A “Folha de S.Paulo” divulgou a seguinte nota:
“O presidente da República agride a repórter Patrícia Campos Mello e todo o jornalismo profissional com a sua atitude. Vilipendia também a dignidade, a honra e o decoro que a lei exige do exercício da Presidência”.
No início da tarde, ao deixar o Palácio da Alvorada após uma reunião com ministros, Bolsonaro voltou a tocar no assunto, mas ressalvou que não queria “conversa”.
“Alguém da ‘Folha de S. Paulo’ aí? Eu agredi sexualmente uma repórter hoje? Parabéns à mídia, aí. Não quero conversa. Parabéns à mídia. Eu agredi, cometi uma violência sexual contra uma repórter hoje?”
Há uma semana, no dia 11 de fevereiro, a mesma repórter da Folha já tinha sido alvo de ataques. Durante a sessão da CPI, Hans River disse que Patrícia Campos Mello “se insinuou” para ele para tentar obter informações sobre disparos de mensagens.
A relatora da comissão, a deputada Lídice da Mata (PSB-BA), protocolou uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Hans River. No pedido ela afirma que o depoente apresentou “diversas informações que, posteriormente, viriam a se mostrar inconsistentes ou inverídicas”.
Na semana passada, entidades também divulgaram notas de repúdio e disseram que os ataques à jornalista na CPI têm caráter “misógino, violento e sexista” e contribuem para a “perseguição a jornalistas e descredibilização da profissão”.
A Associação Brasileira de Imprensa disse em nota que o presidente adota um “comportamento misógino” e afirmou que ele necessita de “tratamento terapêutico”.
“Este comportamento misógino desmerece o cargo de Presidente da República e afronta a Constituição Federal. O que temos visto e ouvido, quase cotidianamente, não se trata de uma questão política ou ideológica. Cada dia mais, fica patente que o presidente precisa, urgentemente, de buscar um tratamento terapêutico.”
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) e Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER) divulgaram nota conjunta em repúdio aos ataques:
“A Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) protestam contra as lamentáveis declarações do presidente Jair Bolsonaro ao ecoar ofensas contra a repórter Patrícia Campos Mello, do jornal Folha de S.Paulo. As insinuações do presidente buscam desqualificar o livre exercício do jornalismo e confundir a opinião pública. Como infelizmente tem acontecido reiteradas vezes, o presidente se aproveita da presença de uma claque para atacar jornalistas, cujo trabalho é essencial para a sociedade e a preservação da democracia.”
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e o Observatório a Liberdade de Imprensa da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) repudiaram os ataques e prestaram solidariedade à jornalista Patricia Campos Mello.
“Os ataques aos jornalistas empreendidos pelo presidente são incompatíveis com os princípios da democracia, cuja saúde depende da livre circulação de informações e da fiscalização das autoridades pelos cidadãos. As agressões cotidianas aos repórteres que buscam esclarecer os fatos em nome da sociedade são incompatíveis com o equilíbrio esperado de um presidente”, diz trecho da nota (leia a íntegra mais abaixo).
Repúdio de parlamentares políticos
A líder da minoria na Câmara, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), afirmou que o presidente precisará responder na Justiça pela sua fala. “Bolsonaro tem que responder na Justiça à Patrícia Campos Mello pela insinuação criminosa feita hoje. Não há muito o que esperar dessa criatura neandertal que se acocora na poltrona presidencial. No mais, não vou divulgar o vídeo da fala asquerosa. É o que ele quer de nós, mas não terá”, disse a parlamentar.
O PSL, antigo partido de Jair Bolsonaro, aderiu ao coro de repúdio. Pelo Twitter, o partido condenou os ataques à jornalista. “O PSL preza pela liberdade de imprensa e respeito pelos indivíduos. As agressões contra a jornalista Patrícia Campos Mello são inaceitáveis e merecem o repúdio dos brasileiros de bem. A atitude, além de ofensiva, demonstra pouco apreço pela democracia”.
Perpétua Almeida, líder do PCdoB, pediu união para superar o machismo ainda existente no país. “Eu não vou colocar aqui a fala vil, ordinária e misógina do Presidente sobre a jornalista Patrícia Campos Mello. Precisamos nos unir para defender nossa democracia, exigir deste senhor postura de um presidente e combater o machismo! Minha solidariedade”, disse.
Também do PCdoB, Alice Portugal (BA) apontou que a fala do presidente só colabora com a violência contra as mulheres. “Bolsonaro insulta com insinuação sexual à jornalista Patrícia Campos Mello. Mais um episódio grotesco de violência contra a mulher, ataque covarde. Todo nosso repúdio. Não vamos tolerar!!!!”, disse ela.
A senadora Katia Abreu (PDT) repudiou o ataque á Jornalista da Folha. “Insinuam sobre aspectos sexuais porque ela é mulher”, disse. O PSDB se manifestou em solidariedade à jornalista. “Reafirmamos nossa solidariedade com a repórter @camposmello, que vem sendo perseguida com insinuações em torno do seu trabalho. Defendemos uma imprensa livre, mesmo que passível de críticas quando necessário”.
Lídice da Mata (PSB-BA), deputada federal e relatora da CPMI das Fake News, condenou a “atitude covarde, descabida e grotesca do presidente da República com a jornalista Patrícia. Em mais de 30 anos de vida pública, nunca imaginei ver algo tão ridículo de um mandatário da Nação”.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também se pronunciou: “Qual o limite do absurdo? Em que democracia sã um presidente da República se sente à vontade agredindo, assediando mulheres? O Brasil nunca esteve diante de tanta covardia! As instituições não podem se calar! Toda minha solidariedade à jornalista!” disse o líder da oposição no Senado.
Miguel Torres, presidente da Força Sindical, disse que “a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo, merece todo o nosso apoio contra os que, feito o Bolsonaro, tentam depreciar o trabalho jornalístico, a dignidade da mulher, a democracia e a busca pela veracidade dos fatos”. Vários parlamentares do PT também repudiaram as declarações de Bolsonaro, entre eles, a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o senador Humberto Costa (PT-PE).
Janaina Paschoal (PSL-SP), deputada estadual, também protestou. “Seria prudente o presidente se policiar e seus auxiliares não o instigarem. Essas situações não ajudam ninguém. Por mais que ele tenha sido eleito com esse estilo, todo ser humano pode se esforçar para melhorar”, disse. Ivan Valente (PSOL-SP), afirmou que “o país experimenta total degradação das relações institucionais. A agressão de Bolsonaro contra a jornalista @camposmello atinge todas as mulheres do Brasil. O ocupante do Planalto falta com decoro, atenta e viola a dignidade do cargo. O impeachment será inevitável. Basta!”
João Doria (PSDB-SP), governador de São Paulo, e o ex-presidente Lula também se pronunciaram. “Quero reafirmar todo respeito a liberdade de imprensa. Respeito pelos jornalistas, por aqueles que fazem a notícia. Considero muito desrespeitosa a atitude do presidente mais uma vez em relação aos jornalistas, em especial a uma jornalista mulher. Desrespeitosa e condenável a atitude do presidente”, disse Dória. “Esse comportamento do presidente já virou um comportamento cotidiano dele”, disse Lula.
A mensagem contra a a jornalista também foi criticada pela deputada Luizianne Lins, do PT-CE. “Incapaz de governar, Bolsonaro volta a agredir com acusações de cunho sexual jornalista da Folha de SP. Patrícia Campos Mello vem revelando a ligação da família Bolsonaro com a disseminação organizada de fake news. Não nos calaremos!”, protestou.
Margarida Salomão (PT-MG) pediu e prestou apoio à jornalista listando os erros presidenciais. “Todos os dias Bolsonaro testa os limites da democracia. Todos os dias ele mente. Todos os dias, portanto, Bolsonaro comete crimes. Crimes contra o decoro, contra as mulheres, contra a democracia. Está na hora de pagar por seus erros.”
Leia a íntegra da manifestação da Associação Brasileira de Imprensa (ABI):
Nesta terça-feira, mais uma vez, para vergonha dos brasileiros, que têm o mínimo de educação e civilidade, o presidente da República, Jair Bolsonaro, é ofensivo e agride, de forma covarde, a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S. Paulo.
Este comportamento misógino desmerece o cargo de Presidente da República e afronta a Constituição Federal.
O que temos visto e ouvido, quase cotidianamente, não se trata de uma questão política ou ideológica. Cada dia mais, fica patente que o presidente precisa, urgentemente, de buscar um tratamento terapêutico.
A ABI conclama a sociedade brasileira a reagir às demonstrações do “Cavalão”, como era conhecido Bolsonaro na caserna, e requer à Procuradoria Geral da República que cumpra o seu papel constitucional, denunciando a quebra de decoro pelo ex-capitão Jair Bolsonaro.
Paulo Jeronimo de Sousa
Presidente da Associação Brasileira de Imprensa
Leia a íntegra da nota da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e da OAB:
A Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e o Observatório a Liberdade de Imprensa da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) prestam solidariedade à repórter Patricia Campos Mello, da Folha de S. Paulo, que nesta terça-feira (18.fev.2020) foi novamente atacada pela família Bolsonaro, dessa vez pelo próprio presidente da República.
A Abraji e a OAB repudiam veementemente a fala do presidente. O desrespeito pela imprensa se revela no ataque a jornalistas no exercício de sua profissão.
Na manhã desta terça, durante conversas com jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, o presidente deu a entender que a jornalista Patricia Campos Mello teria se insinuado sexualmente para conseguir informações sobre o disparo de mensagens em massa durante a campanha eleitoral de 2018.
A ofensa propagada por Jair Bolsonaro faz referência ao depoimento de um ex-funcionário de uma empresa de marketing digital dado à CPMI das Fake News, no Congresso. Ao ser ouvido por congressistas, Hans River do Rio Nascimento afirmou que a repórter especial da Folha de S. Paulo ofereceu-se sexualmente em troca de informação.
Naquele mesmo dia (11.fev.2020), o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, replicou o absurdo em falas públicas e nas redes sociais. A Abraji se manifestou sobre a tentativa de abalar a honra de uma das mais respeitadas profissionais do país. Outras mobilizações espontâneas da sociedade, incluindo a OAB, também condenaram a ação de um agente público contra profissionais de imprensa.
Com sua mais recente declaração, Bolsonaro repete as alegações que a Folha já demonstrou serem falsas. Na mesma entrevista, Bolsonaro chegou a dizer aos repórteres que deveriam aprender a interpretar textos, assim ofendendo todos os profissionais brasileiros, não apenas a repórter da Folha. As declarações foram transmitidas ao vivo na página de Bolsonaro no Facebook.
Os ataques aos jornalistas empreendidos pelo presidente é incompatível com os princípios da democracia, cuja saúde depende da livre circulação de informações e da fiscalização das autoridades pelos cidadãos. As agressões cotidianas aos repórteres que buscam esclarecer os fatos em nome da sociedade são incompatíveis com o equilíbrio esperado de um presidente.
Leia a íntegra da nota da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner)
A Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) protestam contra as lamentáveis declarações do presidente Jair Bolsonaro ao ecoar ofensas contra a repórter Patrícia Campos Mello, do jornal Folha de S.Paulo.
As insinuações do presidente buscam desqualificar o livre exercício do jornalismo e confundir a opinião pública.
Como infelizmente tem acontecido reiteradas vezes, o presidente se aproveita da presença de uma claque para atacar jornalistas, cujo trabalho é essencial para a sociedade e a preservação da democracia”, diz a nota das entidades.