Desemprego, dólar e carestia disparam
Governo desacreditado promete pôr US$ 115 bi na especulação de dólar
De janeiro até o início de junho, saíram do Brasil, no saldo financeiro (isto é, excluído o saldo do comércio exterior), US$ 16.144.955.713,97 (dezesseis bilhões, 144 milhões, 955 mil, 713 dólares e 97 cents) – cf. BC, Movimento de câmbio (fluxo cambial), 06/06/2018.
Esse dinheiro estava aplicado aqui dentro, em papéis especulativos – sobretudo em títulos públicos.
O que faz com que, mesmo com taxas de juros muito maiores que nos EUA, especuladores estejam retirando dólares daqui?
Porque, se há um governo que tudo fez – e continua fazendo – para locupletar bancos, fundos e franco-atiradores do mercado financeiro, é o atual, aliás, seguindo a trilha do anterior (ao todo, Dilma injetou US$ 115 bilhões no mercado de dólar).
Foi, aliás, o que prometeu fazer, na quarta-feira, durante um evento do banco norte-americano Goldman Sachs, o atual presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn. Para ser exato, o presidente do BC prometeu superar a marca do governo Dilma.
Falando na Fifth Annual Brazil Macro Conference, realizada pelo Goldman Sachs em São Paulo, Goldfajn – ex-economista chefe e sócio do Itaú Unibanco, além de “consultor” do FMI -, disse que, além dos US$ 20 bilhões (vinte bilhões de dólares) que já anunciara que o BC pretendia gastar no mercado futuro de dólar até sexta-feira, dia 15, “podemos ir além dos valores máximos utilizados no passado, US$ 115 bilhões. Vamos intensificar seu uso no curto prazo”.
Anunciou isso, como dissemos, em um evento do Goldman Sachs, que é um dos “dealers” do BC, ou seja, opera em nome do BC, com dinheiro colocado à sua disposição pelo BC – e, ao mesmo tempo, opera do outro lado do balcão, para seus clientes ou para si mesmo.
Entretanto, na mesma quarta-feira, apesar das promessas de Goldfajn, o preço do dólar em reais aumentou outra vez.
Portanto, nem oferecendo aos bancos estrangeiros todas as reservas monetárias do país, isso serviu para “acalmá-los”. Além da evidente ganância – se o governo promete a eles as reservas, porque não iriam aproveitar? – eles sabem que há US$ 580 bilhões, de dinheiro estrangeiro, convertidos em reais, aplicados aqui dentro, em papéis; e há US$ 380 bilhões em reservas monetárias. Não há dólares suficientes para trocar os reais, no caso de saída em massa do país.
Mas esse não é um problema imediato. Então, o que faz com que os especuladores olhem com aflição crescente para a porta de saída, mesmo com as taxas de juros daqui?
Acontece que nós não temos um governo – temos uma quadrilha no Planalto, com a séria perspectiva de sair do Palácio em um camburão ou veículo equivalente.
Nem mesmo os beneficiários de sua política conseguem confiar que esse governo não irá provocar uma convulsão no país, perto da qual a greve dos caminhoneiros irá parecer um convescote.
A alta nos preços sobretudo dos alimentos – inclusive no que ela tem de especulativa – é claramente um sinal de perda de controle. Houve quem tentasse jogar em cima dos caminhoneiros a responsabilidade desses aumentos como se a sua reivindicação não fosse, precisamente, a redução no preço do principal insumo – o óleo diesel – que pesa no preço dos transportes de alimentos.
A desmoralização completa de Temer & trupe é, também, o que explica por que, mesmo considerando que o aumento da taxa de juros nos EUA fez com que todas ou quase todas as moedas caíssem em relação ao dólar, o real foi a quarta moeda que mais se desvalorizou no mundo. A primeira foi o peso argentino. A segunda (a lira turca) e a terceira (o rublo russo) são de países em conflito com os EUA, portanto, com algum nível de bloqueio financeiro, que afeta o câmbio com o dólar.
Mas a moeda de todos os países, com exceção desses três, foram menos afetadas que o real.
Na quarta-feira, dia 11, quando escrevemos este artigo, a situação estava, do ponto de vista da própria política do governo, em plena reação em cadeia (o duplo sentido não é acidental).
Não se trata, apenas (e esse apenas é muita coisa), do estouro da pseudo-recuperação.
Sobre isso, as previsões para a variação do PIB recuaram de 3% para cerca de 1%. E a produção industrial, até abril, está 1,3% abaixo do nível de dezembro do ano passado – que já era medíocre.
Na quarta-feira, também, a Fundação Getúlio Vargas divulgou seus “índices antecedentes” de emprego e desemprego, que apontam aumento do desemprego nos próximos meses.
Mais além, o próprio setor financeiro parece à beira do estouro.
O dólar, na quarta-feira, ficou em mais de R$ 3,7, depois que o BC contemplou os especuladores, em um único dia, com US$ 2,5 bilhões.
Enquanto isso, prosseguia a queima de títulos públicos, iniciada há dois meses.
Os aplicadores em títulos públicos, como disse um corretor, “estão vendendo títulos a qualquer preço”. Essa venda força o preço dos títulos para baixo. Com a queda no preço dos papéis, o Tesouro só consegue vendê-los a uma maior taxa de juros – portanto, aumentando a sangria de dinheiro público.
Na segunda-feira, as vendas de títulos no “Tesouro Direto”, onde atuam aplicadores menores, foram suspensas duas vezes – desde 16 de maio, houve suspensão de vendas em 13 das 16 sessões desse mecanismo do Tesouro, para impedir que os aplicadores comprassem papéis baratos que rendem uma taxa de juros cada vez mais alta.
Esse privilégio, o BC reservou para os bancos e fundos, que atuam nos leilões de títulos – e não no “Tesouro Direto”.
Resumindo, os grandes aplicadores (bancos e fundos) estão deixando os títulos públicos e comprando dólar, para enviar para fora ou porque consideram mais seguro nas atuais circunstâncias – e isso explica uma parte da alta do dólar.
Outro motivo dessa alta são os juros dos EUA – que já aumentaram três vezes este ano e devem ser aumentados outra vez na quarta-feira, quando se reúne o Fomc (o correspondente ao Copom no Fed, o banco central dos EUA).
Além disso, como sempre, há uma pressão para aumentar os juros aqui no Brasil – com o pretexto de segurar o dólar. Quanto a isso, aumentar os juros agora é levar a crise a um patamar imprevisível – até mesmo um diretor do BC declarou algo semelhante à imprensa.
Pode-se concluir, portanto, que o apoio à política econômica de Temer é, cada vez mais, tão temerário – e tão pouco inteligente – quanto o apoio a próprio Temer.
É inútil, então, atribuir todos os males do país, presentes e futuros, à greve dos caminhoneiros.
A greve dos caminhoneiros foi uma consequência da destruição que esse governo tem operado (trata-se de um governo de operadores) no país. Uma consequência, aliás, inevitável – porque é inevitável que as pessoas lutem para não morrer de fome ou debaixo de uma canga.
Correto seria dizer que os aumentos sucessivos do diesel (em 30 dias o preço aumentou +38,4% na bomba e +18% na refinaria) provocaram a degringolada em uma situação já em decomposição.
CARLOS LOPES
A caçamba continua vazia