O presidente da Cedae, Helio Cabral, não apresentou qualquer justificativa para a decisão de demitir 54 engenheiros de carreira da empresa de saneamento do Rio de Janeiro.
Em audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), realizada no último dia 25, o indicado do governo de Wilson Witzel para gerir a estatal, permaneceu quieto ao ser indagado sobre a demissão dos funcionários mais experientes da Cedae. A versão apresentada pelo governo é que os trabalhadores foram demitidos por terem salários “altos demais”. Segundo o próprio Witzel, eles receberiam salários de R$ 80 mil, uma mentira desmontada na audiência.
Hélio Cabral demitiu 38 engenheiros, 5 analistas de qualidade de água, 3 contadores, 2 administradores, 1 economista, 1 arquiteto e 1 geólogo.
A grande maioria dos trabalhadores exercia as suas atividades na Cedae há mais de 25 anos.
Hélio Cabral preferiu ficar em silêncio quando foi questionado pela deputada Lucinha (PSDB) se as 54 demissões ocorreram motivadas por brigas ou indicações políticas dentro da companhia.
Lucinha é a vice-presidente da Comissão de Saneamento Ambiental da Alerj, comissão que propôs a audiência e convidou Helio Cabral a prestar esclarecimentos sobre as arbitrariedades.
Já Gustavo Schmidt (PSL) questionou se a contratação de Alexandre Bianchini não revelaria a intenção de privatizar a estatal: Bianchini foi diretor da Aegea, empresa privada com diversas concessões de água e esgoto no Brasil.
Indagado pelo plenário, Helio Cabral não respondeu diretamente a nenhuma pergunta de deputados que participaram da reunião. O presidente da Cedae insistiu apenas no argumento de que os engenheiros foram mandados para o abate exclusivamente por terem os salários mais altos da empresa, apesar de serem parte importante de projetos em andamento.
Ele garantiu que a linha de corte foi exclusivamente salarial. Mas a temperatura subiu quando o ex-diretor de Operação Edes Oliveira contradisse o ex-chefe. Segundo ele, Cabral pediu aos diretores listas de funcionários que “não estavam contribuindo com o trabalho”. Na lista dos demitidos estaria até um engenheiro com 30 anos de casa ganhando R$ 25 mil, o que, segundo Luiz Paulo (PSDB), é compatível com o plano de cargos e salários da empresa.
O posicionamento do presidente da Cedae é questionado e desmentido pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – Seção Rio de Janeiro (Abes-RJ) e associação de trabalhadores da Cedae.
“Medidas como essas, de redução de custos e majoração imediata de lucros nos serviços de engenharia, nos levaram a desastres como a queda das barragens de Mariana e Brumadinho. O desmonte do corpo técnico qualificado da CEDAE, incluindo a área de controle de qualidade da água, coloca em risco a saúde da população do estado do Rio de Janeiro. A ABES-Rio se posiciona contraria a decisão da CEDAE de demitir importante parte de seu corpo técnico e apela aos membros de bom senso do governo a atuarem para que seja revista esta decisão”, afirmou a Abes-RJ.
De acordo com a Associação dos Empregados de Nível Universitário da Cedae, é “inconcebível ver profissionais de alta qualificação que, somente após 25 anos, foram promovidos pela empresa e dois meses depois demitidos com o argumento falso, covarde e inescrupuloso de que ganham altos salários”.
“O argumento apresentado, puramente financeiro, é totalmente inconsistente quando constatamos que a folha de pagamento da CEDAE não chega a 25% do faturamento, sendo uma das mais baixas dentre todas as empresas de saneamento do Brasil”, afirmou a associação.
A associação ainda lembrou que a Cedae – foi eleita pela Revista EXAME como a “melhor empresa de infraestrutura do Brasil”, dentre todas as empresas públicas e privadas e que em 2018, ela apresentou lucro contábil de cerca de R$ 750.000.000,00, “alcançado com o desempenho dos profissionais da Companhia, sob o gerenciamento de vários dos que foram sumariamente demitidos”, salientou.
“O prejuízo que essas ações temerárias causarão aos serviços prestados pela CEDAE é enorme, pelo desmonte da memória técnica da empresa, inviabilizando o bom desempenho operacional dos serviços, dos projetos, das obras, das fiscalizações, da qualidade da água produzida e distribuída, do processo de tratamento e coleta de esgoto. Como consequência, afetará diretamente a saúde, o conforto e a qualidade de vida da população do Estado do Rio de Janeiro”, finaliza a Associação dos Empregados de Nível Universitário da Cedae.
Hélio Cabral é acusado pelo crime da Samarco em Mariana-MG
Antes de ser indicado por Witzel para a presidência da Cedae, Hélio Cabral foi conselheiro de administração da mineradora Samarco quando houve o rompimento da barragem em Mariana, Minas Gerais, em 2015, o maior crime ambiental da história do país.
Segundo o Ministério Público Federal, ele sabia dos riscos de vazamento de rejeitos de mineração. Mesmo assim, nada fez para evitar a tragédia que matou 19 pessoas, deixou centenas de desabrigados e destruiu o Rio Doce.
Segundo os procuradores, Hélio recebeu informações sobre a disposição dos rejeitos da Samarco na barragem de Fundão numa reunião realizada em 4 de abril de 2013 com outros conselheiros. Hélio e 22 pessoas foram denunciados em 2016. O caso ainda não tem conclusão. “Hélio teve conhecimento e consciência do incremento de situações típicas de riscos não permitidos relacionados aos problemas, falhas ou não conformidades operacionais ocorridos na barragem”, diz o MPF.