Seguem os principais trechos da entrevista realizada com o presidente do Banco Central da Bolívia, BCBo, Pablo Ramos Sánchez, para a revista Por Sinal, editada pelo Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central – Sinal.
“A crise de 2008 afetou todos os países. Ante esse ciclo econômico recessivo, a Bolívia respondeu com uma política contracíclica. Enquanto os demais bancos centrais e estados adotaram políticas pró-cíclicas, efetuando restrições ao crédito e à base monetária ao elevar as taxas de juros, nós utilizamos um mecanismo contrário: diminuímos as taxas de forma significativa, com o propósito de manter os níveis de crédito elevados para deixar a economia permanentemente abastecida com os meios necessários para levar adiante os programas de investimento”, afirma o presidente do BCBo.
Na entrevista concedida a Juan Orgaz Espinoza, com apoio técnico de Willy Ancelmo Maydana, realizada na sede do BCBo, em La Paz, Bolívia, o presidente acrescenta: “Dessa maneira, continuamos investindo nas obras de infraestrutura (que foram a base para o desenvolvimento econômico do país nesta última década), e mantivemos as políticas sociais (bônus para crianças, idosos e mulheres gestantes) e as transferências que o Estado faz dos setores mais abastados para os setores carentes. Nesse sentido, enfrentamos a crise através de uma política inversa às recomendações da economia ortodoxa, mantendo uma política monetária expansiva para que o crédito pudesse fomentar o investimento de forma permanente”.
Sánchez salienta que “o mandato constitucional do Banco Central da Bolívia (BCBo) é ‘manter a estabilidade do poder de compra interno da moeda nacional para contribuir com o desenvolvimento econômico e social’. Nesse contexto, a política monetária procede com cautela, ao permitir maiores impulsos internos que possam sustentar o crescimento econômico sem gerar pressões inflacionárias.
Sánchez destaca que “a manutenção do câmbio estável promoveu uma inflação em níveis controlados, o que, por sua vez, permitiu manter uma política monetária expansiva desde meados de 2014. Isso foi feito ao contrário das ações dos demais países da região, onde as desvalorizações cambiais pressionaram os preços internos e, portanto, as políticas monetárias restritivas em um contexto de desaceleração”.
“Até 2006”, lembra o presidente, “o BCBo tinha pouco contato com a população e sua comunicação era direcionada a um conjunto limitado de autoridades nacionais. A instituição passou a criar diferentes mecanismos e espaços de interação com a sociedade civil, priorizando o diálogo direto e transformando-se em uma entidade pioneira na geração contínua de mecanismos exitosos para esse propósito, que se fortaleceram e se sustentaram ao longo do tempo. Temos a divulgação do informe de política monetária, prestação pública de contas perante a sociedade civil, jornadas monetárias, encontros de economistas da Bolívia, concursos de monografia e teatro escolar, participação em feiras, socialização dos benefícios gerados pela utilização da moeda nacional, cursos para jornalistas, divulgação do informe de estabilidade financeira e seminários elaborados a partir de solicitações, entre outras”.
Graças a estas medidas, “o sistema financeiro boliviano vem experimentando, há mais de dez anos, um crescimento sustentável, no qual se destacaram o incremento dos créditos e melhor utilização da moeda nacional. Também se evidencia sua solidez, espelhada na taxa de juros mais baixa da região”.
O presidente do BCBo ressalta ainda que “o sistema de intermediação financeira boliviano é heterogêneo em sua composição e conta com bancos múltiplos, bancos PME (Pequenas e Médias Empresas), entidades financeiras de habitação, cooperativas e instituições financeiras de desenvolvimento (60 entidades). Os custos financeiros dos clientes se mantêm em níveis controlados, resultado da regulação das taxas ativas de juros, de acordo com a Lei nº 393 e com os Decretos Supremos nº 1.842 e nº 2.055, que estabelecem taxas máximas dos créditos para a habitação de interesse social e para o setor produtivo”.
Segundo Sánchez, “a Lei de Serviços Financeiros estabelece que o sistema financeiro deve cumprir uma função social e, portanto, a inclusão financeira é um de seus pilares. Nos últimos anos, foi registrado um significativo crescimento desses indicadores na Bolívia. O número de contas de depósito e de empréstimos quase duplicou entre dezembro de 2010 e março de 2017. As mulheres representam 38% dos empréstimos, e 52% correspondem a pequenos e micro tomadores”.
“Da mesma forma, a infraestrutura mediante a qual as entidades de intermediação financeira prestam seus serviços à população, e a cobertura das agências bancárias por município registram uma tendência de crescimento. Antigamente, o uso do sistema bancário estava restrito a setores minoritários. Isso gerava uma alienação generalizada dos setores populares. Há algum tempo, porém, o BCBo tem tomado medidas e ações de aproximação entre o sistema financeiro e a população, combatendo a centralização do poder econômico”.