
Sob risco de morte. “Salah é um brasileiro e menor de idade, além de ser inocente. O governo brasileiro precisa pressionar para que ele não seja maltratado e não sofra o mesmo destino que Walid”, suplica a mãe
Salah Al-Din Yasser Hamad, 17 anos, é primo de Walid Ahmed, o brasileiro-palestino que morreu sob maus-tratos em prisão israelense no mês passado. Salah chorou muito quando recebeu a notícia da morte de Walid, com quem conviveu a vida inteira e era tão próximo quanto irmão. Salah também tem cidadania brasileira. Ele também está preso. Estas informações são da Fepal (Federação Árabe Palestina no Brasil).
Quem deu-lhe a notícia foi um jovem detido pelos soldados que foi enviado para a mesma cela de Salah, na prisão de Ofer. Este menino, que não é de Silwad, a cidade da família brasileiro-palestina, contou que, ainda quando estava em liberdade, ouviu dizer que um menor de idade de Silwad havia morrido na prisão. Salah não teve dúvida: era Walid.
Silwad é uma cidade palestina localizada no Nordeste de Ramallah, a cerca de 5 km da rodovia Nablus-Jerusalém, na Cisjordânia, no Estado da Palestina.
A reação de Salah ao saber da morte do primo só é conhecida do público porque o colega de cela de Salah foi solto alguns dias depois e contou para Nadia Yasser Hamad, mãe de Salah e nascida no Brasil. O argumento da tristeza que se abateu sobre o garoto foi suficiente para o advogado da família conseguir autorização para Nadia visitar o filho nesta quarta-feira (9).
CAMPO DE CONCENTRAÇÃO MILITAR
Salah está preso desde 18 de novembro em uma das mais cruéis e horrendas prisões de Israel. Ofer é conhecida por ser um campo de concentração militar a oeste de Ramallah, na Cisjordânia ocupada.
Os presos a comparam com as famigeradas prisões de Abu Ghraib e Guantánamo. Segundo a Comissão Independente de Direitos Humanos, logo após o 7 de outubro de 2023, os detidos em Ofer já estavam sofrendo torturas, abusos, humilhações e passando fome e frio.
Alguns morreram na prisão. Choques elétricos e torturas contra todos os prisioneiros, sem exceção, também foram relatadas aos portais noticiosos +972 Magazine e Local Call. Algemados e acorrentados, eles são classificados como “combatentes ilegais” e não recebem o devido processo legal.
Eles são acusados de apoio a suposto “terrorismo” e detidos por tempo indeterminado.
JOVEM SEQUESTRADO
Um mês após o sequestro dele pelos soldados, em 15 de dezembro, a mãe conseguiu ver Salah. “Eu o achei muito diferente. Estava com a cabeça raspada e muito mais magro”, conta Nadia, por vídeo, ao portal da Fepal.
Era dia do julgamento do filho, mas as autoridades adiaram a sentença. Na segunda vez, somente 2 meses depois, em 24 de fevereiro, foi o pai, Yasser Salah Hamad, quem esteve presente. “Eu não o reconheci. Foi Salah quem veio ao meu encontro, porque eu não conseguia identificá-lo”, disse. “Ele nunca teve barba, pois é muito novo, mas estava com uma barba enorme e muito magro, desnutrido.” Houve novo adiamento e a audiência foi remarcada para maio.
Assim como o falecido primo Walid, Salah foi sequestrado sem julgamento e sob as típicas (e frágeis) acusações de resistência. São 21 acusações contra Salah, entre essas as de ter fabricado armas caseiras, coquetéis molotovs, de jogar pedras em soldados e planejar ataques ao exército e aos chamados “colonos”.
De fato, ele foi preso 2 vezes. A primeira, em junho de 2024, ocorreu quando soldados quebraram a porta da casa da família a altas horas da noite. Salah estava passeando no shopping com amigos. Os militares disseram para Nadia ligar para o filho e ordená-lo voltar para casa imediatamente para se entregar, caso contrário levariam a irmã de 14 anos no lugar dele. Salah se entregou. Ele tinha 16 anos.
AJUDA DO GOVERNO BRASILEIRO
Graças à ajuda dos diplomatas brasileiros em Ramallah, o menor foi liberado depois de 4 dias, na véspera do julgamento. No entanto, ele relatou que havia sido espancado no camburão do exército de Israel antes de ser solto.
Essa experiência, sobretudo a tortura, aterrorizou Salah quando soube que seria preso pela segunda vez. Havia completado 17 anos em setembro. Estava descansando em casa num domingo, 18 de novembro, quando amigos lhe avisaram que o exército havia entrado em Silwad e estava indo em direção à casa dele.
Ele disse ao pai que não queria ser sequestrado novamente, traumatizado pelo espancamento. Propôs se entregar à delegacia no dia seguinte, para não ser transportado de camburão. Desligou o celular e saiu de casa. Quando os soldados chegaram, exigiram novamente dos pais que o trouxessem de volta. O pai explicou a situação, recordando que o filho era menor de idade.
PEDIDO E MENTIRA
“Eu disse ao comandante que não havia razão nenhuma para o meu filho ser preso, pois não havia nenhuma perturbação por parte da população local há 2 anos”, explicou o pai. “Os meninos não participavam de nenhuma manifestação, não atiravam pedras em ninguém. Sabiam que a repressão havia aumentado e qualquer coisa seria usada como desculpa para prendê-los.”
Segundo ele, o comandante concordou e disse que Salah seria apenas interrogado e solto em seguida. Mas está preso até hoje, aguardando julgamento.
DISPUTA DE TERRAS COM COLONO
Yasser suspeita que o motivo da prisão seja disputa de terras com colono israelense, que, incentivado pela política expansionista de Tel Aviv, invadiu e ocupou grande terreno da família Hamad na região. Salah visitava a propriedade com frequência para fazer churrasco com os amigos e colher mel das mais de 100 caixas de abelhas da família.
Contudo, o colono tem registrado queixas às autoridades, e reivindica o terreno. Recentemente, ele ateou fogo nas caixas e, quando Salah e os amigos foram ao local para resgatá-las, o israelense também ateou fogo em trator da família Hamad.
Yasser afirma que aquele indivíduo sempre ataca quem entra no terreno e os soldados que prenderam o filho dele devem ter sido acionados após as queixas do colono. Alguns dos amigos de Salah foram sequestrados com ele pelas forças de ocupação.
PEDIDO AO GOVERNO BRASILEIRO
Angustiados após tomarem conhecimento das condições em que Walid morreu, os pais de Salah pedem ao governo brasileiro para que pressione Israel pela libertação do filho. “Salah é um brasileiro e menor de idade, além de ser inocente. O governo brasileiro precisa pressionar para que ele não seja maltratado e não sofra o mesmo destino que Walid”, suplica Nadia.
“Eu admiro o povo brasileiro e seu governo, especialmente o atual, e peço que o Brasil esteja do lado da Palestina. Que o governo brasileiro não admita que a voz do advogado de defesa seja silenciada, porque é isso que se está fazendo nos julgamentos, o que é absurdo, pois todos têm direito à defesa”, diz o pai.
A mãe ainda desabafa: “a causa palestina é uma causa justa e humanitária”. “Eu peço que o governo e o povo brasileiros deem mais atenção a ela. Não é só meu filho, há vários outros jovens inocentes sofrendo. Temos passado por coisas que ninguém suporta. O Brasil é um país que sempre esteve do lado da justiça, sei que o presidente é justo e deveria tomar mais decisões contra a ocupação.”