
Sob a ameaça de retomar túmulos, a concessionária Cortel SP, responsável pela administração de cinco cemitérios municipais de São Paulo, incluindo o do Araçá, começou a cobrar das famílias uma taxa anual para a limpeza e conservação de jazigos. A ação é realizada sem a autorização da Prefeitura e fere os termos do já escandaloso contrato de privatização firmado com a gestão de Ricardo Nunes (MDB). A denúncia é do portal UOL.
Mesmo que não seja obrigatório o pagamento da taxa, como alega a empresa, a ação é ilegal, segundo a prefeitura. No entanto, o comunicado enviado aos familiares explicando a medida, não dá essa opção. Segundo o Uol, que teve acesso ao documento, a notificação diz ser “necessária a contratação” do serviço para garantir que o túmulo não corra risco de ser considerado abandonado. E por conseguinte, não seja retomado pela concessionária.
O comunicado é acompanhado de um boleto com prazo de 20 dias para o pagamento. Quem se antecipar à data, é “bonificado” com 10% de desconto. Conforme a carta, o objetivo é a manutenção regular e zeladoria dos túmulos, dentro e fora deles. E ainda, “da garantia total por danos e furtos de elementos como placas e portões e também quedas de árvores que possam prejudicar o jazigo.”
Assim como ocorre em todos os processos de privatização, marcados por irregularidades, omissões, elevação abusiva de preços e queda da qualidade dos serviços, a dos cemitérios paulistanos não é diferente.
Em novembro de 2024, o ministro Flávio Dino ordenou que as empresas voltassem a praticar os preços válidos até a data da concessão, em novembro de 2023. Os aumentos foram expressivos. O preço de um caixão básico, por exemplo, subiu de R$ 147,14 para R$ 695,63.
Além disso, em apenas um ano de privatização os resultados apresentados pelas concessionárias eram catastróficos: quedas de muros de cemitérios, reclamações sobre aumento de preços, de falta de zeladoria a ossadas expostas. Sem falar da dificuldade de acesso à gratuidade aos serviços pela população carente. A situação foi denunciada em reportagem do HP.
“A privatização (dos cemitérios) não poderia ter sido um pesadelo maior para o cidadão paulistano. Os preços aumentaram até 11 vezes do praticado antes de privatizado e, além disso, os serviços ao público pioraram”, disse na ocasião o deputado estadual Simão Pedro (PT/SP). “Esse é um serviço de natureza pública essencial, pois o amparo ao luto jamais deveria ter sido objeto da sanha dos lucros”, completou o parlamentar.
A decisão anterior do ministro Dino foi tomada na data em que a concessão dos cemitérios e crematório municipal à iniciativa privada completou dois anos. A ação foi movida pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que apontou “exploração comercial abusiva, especialmente no momento de maior vulnerabilidade emocional das famílias enlutadas”. A determinação que proíbe o aumento das taxas após a privatização permanecerá em vigor até que o plenário da Corte tome uma decisão sobre o assunto.
Em janeiro deste ano, ao estipular o prazo de 15 dias para a prefeitura se explicar sobre os aumentos abusivos praticados pelas empresas, o ministro afirmou que “serviços públicos diretamente vinculados à vida e à morte são assuntos de estatura constitucional, não meramente de ‘mercado’”.
Segundo o UOL, as empresas que assumiram o serviço funerário na cidade passaram a vender serviços não estabelecidos no contrato. Quais sejam: gavetas por tempo indeterminado – em vez do prazo fixo de três anos – além de cobrar taxas acima das estipuladas na tabela para sepultamentos e exumações. Também foram observados casos em que as concessionárias iniciaram processos administrativos para a retomada de jazigos.
De acordo com o veículo, até o final do ano passado, por exemplo, 566 famílias já haviam perdido o direito sobre sepulturas localizadas nos cemitérios do Araçá, Vila Mariana e Quarta Parada. E ao menos outras 17.529 famílias corriam esse risco.