
Animais confinados, aluguéis explodindo, feira remanejada e até churrascaria irregular após a entrega do espaço público
Desde a privatização, em 2022, o tradicional e aprazível Parque da Água Branca, na zona oeste da capital paulista, vem tendo sua paisagem natural alterada. O espaço, que antes lembrava um grande quintal ou uma pequena fazenda — com galinhas, patos e gansos circulando livremente —, está se transformando em um local voltado ao comércio, onde o lucro começa a se sobrepor aos interesses coletivos da população. Os animais foram doados, e os que restaram, confinados.
Entre as descaracterizações, a feira de produtos orgânicos, que acontecia em uma das extremidades do parque foi transferida para outro ponto, sem aviso claro à população. Criada em 1991, a feira é uma das mais antigas e respeitadas da cidade, com grande apelo popular. Ela funciona terça-feira, sábado e domingo e tem entre seus atrativos um saudável e apetitoso café da manhã.
A mudança não atende às necessidades dos comerciantes. Eles relatam dificuldades logísticas: o novo espaço dificulta a carga e descarga das mercadorias, que antes era feita ao lado do antigo galpão. Agora, após o encerramento das atividades, precisam caminhar centenas de metros até caminhões e picapes estacionados em outro ponto do parque.
“Esse lugar é horrível”, disse à Folha de SP, o agricultor Edson Antônio Ruiz, que há dez anos mantém um ponto de venda no local. Segundo ele, “o antigo galpão era bem maior e “havia mais espaço para trabalhar.” Agora, “os feirantes trabalham encolhidos e têm pouco espaço para se movimentar atrás dos balcões”, aponta.
Outro prejuízo aos negociantes é o aluguel, que subiu 150% sob a gestão da concessionária Reserva Parques, que passou a administrar o parque após a privatização. “Quando era do governo pagava R$ 800 reais e agora, depois da privatização, desembolso quase R$ 2 mil por mês”, disse ao veículo.
Também à Folha, o apicultor Júlio de Oliveira, que desde 2008 trabalha na feira, denunciou a elevação do valor do aluguel. “Pagava R$ 600 de locação e agora o custo foi para R$ 1,7 mil”, afirma. Como consequência, os feirantes tiveram que aumentar os preços dos produtos, mas com critério para não afastar a clientela. “Não repassamos tudo e diminuímos nossas margens de lucro”, contam.
Apesar de resistir, muitos temem que a feira acabe sendo alvo da lógica do lucro imposta pela nova gestão privada. “Tiraram os bichos, agora mudam a feira de lugar, e depois? Vão cobrar para entrar?”, questiona uma aposentada, que há mais de 20 anos frequenta o parque.
A preocupação da aposentada não é em vão. Após ampla repercussão pela imprensa, a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp) determinou, nesta terça-feira (6), a suspensão imediata das obras de instalação de uma churrascaria no espaço.
Detalhe: A construção da Fazenda Churrascada teve início no antigo estábulo da Polícia Militar dentro do parque, com a aprovação da concessionária responsável pela administração do local. No entanto, a obra não foi autorizada pelos órgãos responsáveis pela preservação histórica tanto no município quanto no estado.
Em nota, a Arsersp, explicou que “como a concessionária não apresentou as devidas autorizações” as obras permanecerão suspensas até “a comprovação das permissões exigidas pelos órgãos competentes”.