“Por que o ministro da Saúde não escolheu focar no oxigênio, se ele já tinha sido alertado?”, questiona o procurador Igor Spindola
O procurador da República no Amazonas, Igor Spindola, afirmou que o governo Bolsonaro suspendeu a entrega de oxigênio medicinal ao Estado do Amazonas por 24 h, enquanto o Ministério da Saúde “decidia o que fazer”, o que provocou a falta do insumo e a morte por asfixia de internados em Manaus.
“A causa imediatíssima para que faltasse oxigênio foi essa. Parou-se de trazer aviões de fora enquanto decidiam como que iam fazer essa logística e isso não poderia ter sido feito”, apontou.
“Eles não poderiam ter parado de mandar oxigênio, porque quando eles pararam o oxigênio acabou”, afirmou o procurador em entrevista ao jornal GGN.
“Nesse período de 24h parou de chegar oxigênio e foi o suficiente para que faltasse e as pessoas morressem sufocadas”, disse Spindola.
A entrega do oxigênio líquido, forma mais compacta do insumo, só pode ser feita através de aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), por razões técnicas. “Não é à FAB que eu atribuo [a causa do problema], mas a quem tomou essas decisões de logística que atrasaram o envio. O último cargueiro da FAB chegou na quarta, e aí parou de chegar avião. Não tinha como chegar oxigênio se não fosse de avião”.
O Ministério da Saúde informou ao MPF que a entrega tinha parado porque o avião tinha quebrado. “Nos foi informado que o avião teria quebrado, mas não diziam se era um, dois ou três aviões que eles tinham”.
No dia do colapso, o governo afirmou que não tinha como ajudar Manaus porque não dispunha de aeronaves para transportar oxigênio para a cidade. O general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, afirmou que não havia avião capaz de transportar os cilindros de oxigênio para Manaus, porque, segundo ele, a única aeronave brasileira que poderia fazer esse transporte estava em manutenção. Ver Bolsonaro diz não ter avião para transportar oxigênio para Manaus, mas Venezuela está pronta para ajudar
Depois que as cenas dos pacientes morrendo asfixiados foram televisionadas, os aviões magicamente apareceram e voltaram a entregar o produto.
GOVERNO FEDERAL JÁ SABIA
O procurador disse também que as autoridades estaduais e do governo Bolsonaro já tinham sido alertadas da possível falta de oxigênio nos hospitais, mas não fizeram nada para aumentar a produção ou a entrega.
“Não consegui compreender ainda se os alertas foram ignorados e o porquê. Eles foram expedidos, inclusive pela White Martins. Desde julho a White Martins vem alertando as autoridades de que havia uma necessidade de aumento do contrato em pelo menos 25% do que era fornecido usualmente”, denunciou o procurador.
Alguns dias antes da explosão do problema, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, “veio aqui, deu declarações e determinou medidas que ele considerava como adequadas para reduzir o número de internações, que foi a do ‘tratamento precoce’, e ignorou completamente a questão do oxigênio”.
“Por que ele não escolheu focar no oxigênio, se ele já tinha sido alertado?”, questionou.
Ao invés de oxigênio, Eduardo Pazuello preferiu dar aos pacientes cloroquina, que não tem efeito nenhum contra a Covid-19. Jair Bolsonaro disse que “nós fizemos a nossa parte”.
A Advocacia-Geral da União (AGU) alegou que o governo Bolsonaro “foi informado de maneira tardia aos órgãos federais”, em ofício encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF).
No entanto, a própria AGU admite no ofício que o Ministério da Saúde fez reuniões entre os dias 3 e 4 de janeiro com autoridades locais, quando detectou que o sistema de saúde do Amazonas estava à beira do colapso. No dia 14, faltou oxigênio hospitalar no Estado, afetando pacientes internados em UTIs.
“As reuniões foram realizadas entre 3 e 4 de janeiro de 2021, quando foram sumarizadas as seguintes conclusões: há possibilidade iminente de colapso do sistema de saúde, em 10 dias, devido à falta de recursos humanos para o funcionamento dos novos leitos”, diz o documento.
Num outro trecho, a AGU relata que o governo estimou que o auge da crise se daria entre 11 e 15 de janeiro.
“Estima-se um substancial aumento de casos, o que pode provocar aumento da pressão sobre o sistema, entre o período de 11 a 15 de janeiro, em função das festividades de Natal e réveillon”, anotou.
O texto da AGU diz ainda que o Ministério da Saúde foi informado no dia 8 de janeiro sobre a iminente escassez de oxigênio para os hospitais de Manaus.
O alerta foi feito por e-mail pela White Martins, principal fornecedora de oxigênio hospitalar no Amazonas.
PGR
O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, enviou um documento para o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, pedindo que ele faça um inquérito para apurar a causa da falta de oxigênio nos hospitais de Manaus.
O pedido é de que sejam investigadas “as causas do colapso que geraram estado de apreensão local e nacional quanto à falta de insumos básicos de saúde”.
O objetivo do inquérito é “permitir a definição de diretrizes capazes de impedir a repetição do quadro registrado no Amazonas em qualquer outro ente da Federação”. A A PGR pede que a ação seja feita junto com as Secretarias de Saúde do Amazonas e de Manaus.
O órgão também pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que abrisse uma investigação sobre a omissão das autoridades estaduais e municipais no caso.
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