Ministério Público do órgão de contas da União quer reavaliar a incorporação de 240 itens ao acervo privado do ex-presidente
O Ministério Público de Contas, do TCU (Tribunal de Contas da União), emitiu recomendação para que a Presidência da República faça reavaliação sobre a incorporação de 240 presentes ao acervo privado do ex-presidente inelegível Jair Bolsonaro (PL).
Os itens foram recebidos de autoridades estrangeiras entre janeiro de 2019 e dezembro de 2022.
O pedido é do procurador Júlio Marcelo de Oliveira. O documento, que necessita do aval dos ministros do TCU, dá prazo de 120 dias para que seja feita a reavaliação desses presentes.
PARECER
O parecer também pede que a Presidência da República apure, via processo administrativo, no prazo de 180 dias, a existência de outros possíveis bens ofertados ao ex-presidente e à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) no período.
Esse parecer foi elaborado pelo Ministério Público de Contas, que é o órgão de controle externo do TCU.
No pedido, há, ainda, a recomendação para que os bens mapeados sejam recolhidos e registrados, com a posterior incorporação ao patrimônio da União ou ao acervo privado de Bolsonaro, conforme cada caso.
A medida também alcança pessoas e agentes públicos que tenham feito parte da delegação presidencial ou tenham representado Bolsonaro em eventos oficiais no Brasil ou no exterior.
PRESENTES
De acordo com o sistema de controle do acervo presidencial, Bolsonaro recebeu um total de 9.158 presentes de origens diversas no período.
No entanto, relatório preliminar do TCU constatou que o ex-presidente levou irregularmente para acervo privado 128 presentes.
Os técnicos do tribunal dizem que 111 destes itens não têm característica personalíssima ou de consumo direto, enquanto outros 17 presentes são de “elevado valor”. Por essas razões, todos esses itens deveriam ter sido entregues à União, avaliou a auditoria.
Dos itens ofertados por outros países, 55 foram deixados para o patrimônio público e 240 ficaram com Bolsonaro, incluindo as joias da Arábia Saudita que colocaram o ex-presidente na mira da PF (Polícia Federal) e levaram o TCU a abrir a análise sobre os presentes.
INCORPORAÇÃO
O documento – do MP de Contas – lembra que a incorporação ao acervo privado dos presidentes da República ou de qualquer outra autoridade pública de presentes de uso pessoal com elevado valor comercial, recebidos em missões oficiais e eventos diplomáticos ou doados por entes privados, “afronta os princípios da razoabilidade e da moralidade administrativa”.
O órgão ponderou, por meio do documento, que a inclusão de joias no conceito de bem de natureza personalíssima ou de consumo direto pelo recebedor destoa claramente dos princípios, “vez que joias possuem alto valor agregado, o que eleva seu preço”.
Os advogados de Bolsonaro alegam que jamais houve a intenção dele de “se apropriar de algo que não lhe pertencia” e que os procedimentos seguiram regras previstas em lei e decreto, que abriam até a possibilidade de deixar itens à venda ou como herança.
CASO
Convocados a depor na PF, dia 30 de agosto de 2023, uma quinta-feira, o ex-presidente e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro optaram por fazer uso do direito de ficar em silêncio, segundo nota da defesa conjunta.
Além do casal, mais seis pessoas foram convocadas para prestar depoimentos simultâneos em meio às investigações sobre o recebimento e a destinação de joias e presentes dados por autoridades estrangeiras a Bolsonaro durante o mandato dele.
Também foram convocados o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid; o pai dele, o general do Exército Mauro Cesar Lourena Cid; o advogado Frederick Wassef, que defendeu a família Bolsonaro em diversos casos; e o advogado Fabio Wajngarten, ex-chefe da Comunicação (Secom) do governo Bolsonaro; e de mais dois assessores do ex-presidente.
Os ex-assessores da presidência Marcelo Câmara e Osmar Crivelatti também foram convocados.
O agendamento simultâneo de depoimentos fez parte de estratégia chamada de “dilema do prisioneiro” — já usada anteriormente pela PF no caso das joias. Segundo especialistas, a ideia seria dificultar a combinação de versões e estimular a entrega de informações úteis para a investigação.
ACUSAÇÕES
De acordo com a PF, Bolsonaro, assim como outros investigados, são suspeitos de “desviar presentes de alto valor recebidos em razão do cargo pelo ex-presidente da República e/ou por comitivas do governo brasileiro, que estavam atuando em seu nome, em viagens internacionais, entregues por autoridades estrangeiras, para posteriormente serem vendidos no exterior”.
A investigação da PF apontou, além disso, que os montantes obtidos com essas vendas eram convertidos em dinheiro em espécie e ingressavam no patrimônio pessoal do ex-presidente por meio de intermediários e sem utilizar o sistema bancário formal, supostamente visando ocultar a origem, localização e propriedade desses valores.