
Fundo foi criado com recursos do pré-sal para financiar programas sociais, saúde, educação e ciência e tecnologia
A Câmara dos Deputados aprovou, por 346 votos a favor e 93 contra, o projeto de lei que autoriza o uso de até R$ 30 bilhões do Fundo Social do pré-sal para financiar dívidas do agronegócio. A aprovação na quarta-feira (16) do PL 5122/2023 também contou com a abstenção de um deputado e ausência de 71 parlamentares. O projeto segue para o Senado.
A proposta permite o uso de recursos do Fundo Social do Petróleo, originalmente destinados a áreas como educação, saúde pública, ciência e tecnologia, infraestrutura social, habitação popular, meio ambiente e mitigação e adaptação às mudanças climáticas, entre outros. Além disso, parlamentares criticam o projeto por beneficiar grandes produtores em vez de apoiar pequenos agricultores afetados por calamidades públicas.
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), criticou a votação da proposta e afirmou que houve quebra de acordo. Segundo o parlamentar, estava marcada uma reunião com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, para negociar um texto de consenso entre os Poderes.
“Houve uma reunião do ministro da Agricultura com o deputado Afonso Hamm, vários técnicos e membros da frente parlamentar, e foi acertado que haveria uma reunião com o ministro Rui Costa, para buscarem um texto de consenso”, disse Guimarães. “Não é correto votar uma matéria que tem impacto, que vai retirar recursos do Fundo Social para a renegociação de dívidas”, criticou.
O deputado Chico Alencar (Psol) denuncia que o “texto, por não estabelecer cotas, faixas prioritárias e mecanismos de proteção para os pequenos agricultores, acaba por favorecer, sobretudo, os grandes”.
“Retira recursos do Fundo Social, cuja destinação é para a área de educação, cultura, esporte, saúde pública… Ninguém está negando as dificuldades da agricultura brasileira, mas precisamos ter discernimento e selecionar o que é urgente, o que é necessário, que são aqueles que vivem da agricultura familiar: os pequenos, as cooperativas”, declarou.
A proposta, apresentada em substitutivo pelo relator Afonso Hamm (PP-RS), autoriza o governo a utilizar receitas correntes do Fundo Social dos anos de 2025 e 2026 e superávit financeiro (resultado de aplicações dos recursos, por exemplo) dos anos de 2024 e 2025.
A linha de crédito tem um limite total de R$ 30 bilhões, com valores máximos de R$ 10 milhões por produtor individual e R$ 50 milhões por cooperativa ou condomínio. O financiamento é concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e por bancos credenciados pelo mesmo, destinando-se à quitação de operações de crédito rural e de Cédulas de Produto Rural (CPRs). O BNDES assumirá os riscos das operações, incluído o risco de crédito (calote do devedor).
Os financiamentos serão tratados como crédito rural, sujeitos a taxas e garantias conforme as regras do Decreto-Lei 167/67 (Cédula de Crédito Rural).
O projeto estabelece as seguintes taxas de juros:
- 3,5% para o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf);
- 5,5% para o Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp);
- 7,5% para os demais financiamentos.
Condições de pagamento:
- Prazo de 10 anos, com 3 anos de carência;
- Em casos extraordinários, o prazo pode ser estendido para 15 anos.
Tipos de dívida elegíveis para quitação com novo financiamento:
- Débitos vencidos ou a vencer, renegociados ou não, contratados até 30/06/2025;
- Cédulas de Produto Rural (CPR) emitidas até 30/06/2025 em favor de instituições financeiras, cooperativas, fornecedores ou compradores, desde que registradas em entidade autorizada pelo Banco Central (BC);
- Se o produtor contraiu um novo empréstimo para pagar dívidas anteriores, esse saldo também poderá ser quitado.
Para dívidas de investimento, o financiamento cobre apenas parcelas vencidas ou com vencimento até 31/12/2027.
Dívidas não classificadas poderão ser financiadas
O relator Afonso Hamm também permitiu que o produtor rural inclua dívidas não classificadas como crédito rural, desde que contratadas por cooperativas, cerealistas ou fornecedores de insumos e utilizadas para suas necessidades. Nesses casos, a taxa será de 7,5% ao ano, com limite de R$ 10 milhões por cooperativa ou grupo econômico, sem exigência de comprovação de perdas em safras anteriores.
Os valores a serem pagos com o financiamento previsto no projeto serão calculados incluindo os encargos originalmente contratados, mas sem multas, juros de mora ou quaisquer outros acréscimos por atraso, bem como sem honorários advocatícios. Também não serão incluídos benefícios como descontos por pagamento antecipado ou em dia.
Não poderão ser beneficiados valores já pagos, amortizados ou liquidados antes da publicação da futura lei, mesmo que o pagamento tenha sido realizado por meio do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) ou Cobertura de apólices de seguro rural.
Para ter direito à renegociação, o produtor deverá atender a pelo menos dois dos seguintes critérios:
- O produtor deve estar em um município ou estado que tenha declarado estado de calamidade pública ou emergência reconhecidos pelo Poder Executivo federal em pelo menos dois anos, entre 2020 e 2025, devido alagamentos, enxurradas, estiagem, inundações, geadas, seca ou tempestades. Também vale se o município decretou a situação e o governo estadual a reconheceu.
- A soma das dívidas de crédito rural com atraso superior a 90 dias deve ser maior que 10% do total da carteira de crédito rural do município em 30 de junho de 2025, conforme dados do BC.
- O município deve ter registrado pelo menos duas perdas de produção (entre 2020 e 2025) iguais ou superiores a 20% do rendimento médio municipal em pelo menos uma cultura agrícola ou atividade pecuária.