Depoimento à Lava Jato do ex-representante da Odebrecht no país fortalece denúncias contra o presidente Pedro Pablo Kuczynski (PPK). Congresso vota destituição no dia 22
Com 87 votos a favor, 15 contra e 15 abstenções, o Congresso do Peru aprovou na semana passada o 2º pedido de impeachment contra o presidente Pedro Pablo Kuczynski (PPK), pelas indecorosas relações mantidas com a construtora brasileira Odebrecht. A situação do atual mandatário se agravou após o ex-representante da empresa no Peru, Jorge Barata, ter dado um depoimento à Lava Jato, no começo de março, em que afirma ter financiado a última campanha eleitoral de Kuczynski em troca de benesses.
Conforme o presidente do Congresso Unicameral, Luis Galarreta, PPK estará novamente na Casa na próxima quinta-feira (22), onde após uma série de questionamentos e debates será submetido à decisão final. Dos 130 parlamentares são necessários pelo menos 87 para destituir o presidente, acusado de “incapacidade moral permanente”.
Municiados pelas denúncias da Lava Jato, de acordo com a última pesquisa Datum, a rejeição de PPK subiu de 73% para 79%, com os peruanos identificando o atual presidente com “interesses ocultos” e “incapacidade”.
Entre outros crimes, PPK é acusado de ter recebido mais de US$ 5 milhões de dólares em propina da Odebrecht, por meio de supostos “serviços de consultoria” entre 2004 e 2013 (parte do período em que foi ministro da Economia de Alejandro Toledo) e outros US$ 300 mil para a sua campanha presidencial de 2011, oportunidade em que amargou a terceira colocação.
Fingindo desconhecer as novas denúncias, colocado nas cordas diante da enxurrada de provas e frente ao crescente clamor das ruas, Kuczynski choraminga: “Estão me acusando de coisas que ocorreram há 12, 15 anos atrás e que não aconteceram durante o meu governo”. Como se os crimes contra o patrimônio público pudessem prescrever, ele próprio confessou ter ganho 380 mil dólares por meio de sua consultoria Westfield Capital, fundada nos Estados Unidos, por meio da qual admitiu ter faturado 782 mil dólares da Odebrecht, entre 2004 e 2007, enquanto era ministro, motivo da moção de impeachment. Diante da iminência da justiça, alega que sua destituição seria “absolutamente, um golpe de Estado”. “Eu não acredito que vá acontecer, mas seria um golpe de Estado”, protesta.
Este é o segundo pedido de afastamento de PPK votado pelo Congresso nos últimos três meses. Do primeiro, em dezembro, Kuczynski somente conseguiu escapar após negociar sua permanência com o deputado Kenji Fujimori – filho do ex-ditador Alberto Fujimori e irmão da deputada Keiko. Para se manter no poder, PPK chegou ao cúmulo de libertar da prisão o assassino e torturador Alberto Fujimori, condenado por uma longa lista de crimes de lesa-humanidade, a quem concedeu um indulto.
Além de PPK, outros três ex-presidentes foram fulminados por terem comprovadas suas podres ligações com a Odebrecht; Ollanta Humala (2011-2016), que já está preso; Alan García (2006-2011), acusado pelo Ministério Público de crime contra o patrimônio na execução da Linha 1 do Metrô de Lima; e Alejandro Toledo (2001-2006), que está foragido nos Estados Unidos, denunciado por ter recebido US$ 20 milhões para a construção da rodovia Interoceânica, que liga o Brasil ao litoral peruano. Filha de Alberto Fujimori e expoente da oposição de direita, Keiko também é acusada de ter se locupletado com recursos ilegais da construtora.
“É lamentável que um estigma do Peru seja a corrupção. Agora estamos diante de um novo caso que vai ser parte da história, porém deve ser visto com a exigência que requer a cidadania”, declarou o parlamentar de esquerda Manuel Dammert, do Novo Peru, apontando o inevitável caminho do impeachment.
“A mudança de posição do Parlamento peruano em relação ao presidente ocorreu porque, quando concedeu o indulto para o ex-presidente Fujimori, ele perdeu muitos votos entre os integrantes dos partidos de esquerda. Ele não sofreu o impeachment em dezembro porque conseguiu obter os votos do filho de Fujimori e, por uma margem mínima de votos – apenas nove -, conseguiu sobreviver. E os votos da esquerda que ele perdeu tiveram peso considerável para que o segundo pedido de impeachment fosse aprovado”, avalia o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF), Eduardo Heleno dos Santos.
Como reparação pelos inumeráveis danos e prejuízos causados ao país pela corrupção, a Justiça do Peru anunciou que vai exigir da Odebrecht 3,46 bilhões de sóis (equivalente a US$ 1 bilhão), informou o procurador especial, Jorge Ramírez.
O Peru é um dos nove países da América Latina em que a empresa espraiou seu esquema de suborno em troca de contratos para obras governamentais, maracutaias milionárias que também chegaram ao continente africano. No Peru, a Odebrecht opera há quatro décadas, mas foi com o PT que ela perpetrou suas principais ações de corrupção.
LEONARDO SEVERO