Bumlai contou o encontro em hotel
Odebrecht usou setor de ‘operações estruturadas’ só para dinheiro ilícito
Os protestos lulistas de que nada houve em Belo Monte – e sua defesa apaixonada da honestidade do professor Delfim Netto (nem a velha Arena, na ditadura, se atreveu a tanto) – levaram duas pedras tumulares em cima.
A primeira é a confirmação de que a parte da Odebrecht na propina de Delfim foi passada pelo “setor de operações estruturadas”, isto é, pelo departamento de propina da Odebrecht. Como disse o próprio Marcelo Odebrecht, sobre outro caso, “se fosse uma consultoria técnica, uma consultoria legítima, ela não seria paga via equipe de operações estruturadas” (v. o depoimento de Odebrecht no processo de Aldemir Bendine: Executivo favorito do PT leva a mesma pena de Al Capone).
O departamento de propinas da Odebrecht existia para passar propinas – e não para pagar algum trabalho honrado ou “normal”.
A segunda foi a divulgação do depoimento de José Carlos Bumlai, amigo mais do que chegado a Lula, sobre seu encontro com Delfim Netto, no Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo.
Mas, antes, vamos resumir o caso.
O CASO
Nas contas das empresas LS (de Luís Appolonio, sobrinho e operador de Delfim) e Aspen (do próprio Delfim Netto), a PF localizou a passagem das propinas da Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Correa, OAS e J. Malucelli. Quanto às outras empresas do “consórcio construtor” de Belo Monte (Queiroz Galvão, Contern, Galvão Engenharia e Serveng Civilsan), a PF “identificou que, ao tempo do acerto de propina em comento, Luiz Appolonio Neto manteve comunicações” com todas elas.
O que se pode afirmar com segurança é que o círculo de Dilma – Erenice Guerra e Valter Cardeal – agiram para fraudar a licitação da Usina de Belo Monte, assim como o de Lula: Bumlai, Palocci e Vaccari.
A formação do “segundo consórcio” – que, com o uso de informações privilegiadas, acabou por ganhar a licitação, derrotando o consórcio que reunia Andrade Gutierrez, Vale, Votorantim, Furnas, Eletrosul e Neoenergia – foi feita por Delfim Netto e por José Carlos Bumlai.
Qual o objetivo desse “segundo consórcio” (formado pela Gaia Energia, J Malucelli, Queiroz Galvão, Cetenco, Galvão Engenharia, Mendes Junior Trading, Serveng Civilsan, Contern e CHESF)?
Não era construir a hidrelétrica, como, aliás, não construiu, apesar de vencer a licitação.
O objetivo era angariar propinas. Com a desistência da Odebrecht, o consórcio da Andrade Gutierrez ficou só. Não havia mais disputa. Para conseguir propinas era preciso inventar outro consórcio.
Mas isso era uma coisa que Erenice Guerra ou Dilma não tinham capacidade para fazer. Daí, recorreram a Delfim, naquela época conselheiro de Lula e Dilma.
Daí, também, o aparecimento do notório Palocinho, irmão de Antonio Palocci, acompanhado de Valter Cardeal, que se intitulava “o homem da Dilma para o setor elétrico”, na reunião do consórcio da Andrade Gutierrez.
Foi com as informações que obtiveram nessa reunião, que o “outro consórcio” – aquele formado por Delfim e Bumlai – ganhou a licitação e a Andrade Gutierrez saiu derrotada.
O problema é que, depois de ganha a licitação, o consórcio de Dilma e Erenice não tinha condições de construir a hidrelétrica.
Foi, então, inventada uma curiosa engenharia de corrupção, em que o consórcio “investidor” (o que vencera a licitação) contratou um consórcio “construtor” – formado, principalmente, pelas empresas que haviam sido derrotadas (Andrade Gutierrez, Odebrecht e Camargo Correa, com 50%), agregando, também, a Queiroz Galvão, OAS, Galvão Engenharia, Contern, Serveng Civilsan, Cetenco e J. Malucelli.
Para consertar uma fraude, perpetrou-se outra fraude.
A atividade de Palocci, então, foi a de estabelecer a propina para que as empresas entrassem no “consórcio construtor”: 0,5% para o PT e 0,5% para o PMDB – e passou a operacionalização para Vaccari, pelo PT, e para Edson Lobão, pelo PMDB.
Foi Palocci, também, quem cobrou a propina de R$ 15 milhões (0,1% do orçamento estimado então para Belo Monte) para Delfim.
O ENCONTRO
Vejamos o que disse Bumlai:
“… em meados de 2010, em São Paulo, recebeu um telefonema de Antônio Delfim Netto ou de Delcídio do Amaral solicitando que comparecesse a uma reunião em um quarto no hotel Maksoud Plaza;
“… no hotel, estavam presentes Delcídio do Amaral, Antônio Delfim Netto e Luiz Appolonio Neto [sobrinho e operador de Delfim];
“… Delfim Netto esclareceu a questão da formação de consórcios envolvendo a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte; disse que o governo tinha interesse em montar um segundo consórcio; disse que teria ele sido procurado para montar o segundo consórcio;
“… diante deste panorama Delfim pediu que [Bumlai] ajudasse; recorda que Delfim Netto mencionou que o governo já havia manifestado interesse na formação de um novo consórcio; Delfim Netto procurou-o justamente para o préstimo de auxílio na formação deste consórcio;
(…)
“… passado algum tempo, Nelson Santos, sócio da ARS Engenharia, amigo [de Bumlai], disse que Delfim Netto teria recebido um percentual de comissão pela formação do consórcio;
“… solicitou a designação de reunião com Flavio David Barra [presidente da Andrade Gutierrez Energia]; a reunião tinha por objetivo perguntar ao presidente da Andrade Gutierrez Energia se tinha sido pago comissão a Antônio Delfim Netto; desejava cobrar o pagamento de comissão para ele, uma vez que também teve participação na formação do consórcio;
“… Flavio David Barra disse que já tinha cumprido todos os compromissos referentes à construção da Usina de Belo Monte, inclusive os de cunho político”.
A Polícia Federal constatou 346 ligações telefônicas entre o sobrinho de Delfim, Luiz Appolonio, e os irmãos Bumlai (José Carlos e Maurício).
O SETOR
Já publicamos o depoimento de Otávio Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez (AG), e de Flávio Barra (presidente da Andrade Gutierrez Energia) sobre o pedido de Palocci para a propina de Delfim – e o pagamento da parte da AG (v. Por que o PT pediu propina para Delfim em Belo Monte?).
Porém, vejamos o que disse Antonio Daiha Blando, representante da Odebrecht no Conselho do Consórcio Construtor de Belo Monte:
“Os pagamentos [a Delfim] foram realizados pela equipe de Hilberto Silva [chefe do ‘setor de operações estruturadas’, o departamento de propina, da Odebrecht], feitos em espécie, com utilização de Caixa 2, por doleiros, com entrega em endereços na cidade de São Paulo.”
CARLOS LOPES