A destruição do Museu Nacional pelo incêndio ocorrido no último domingo (02), causou indignação em milhares de pessoas por todo o país. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, protestos foram convocados em repúdio à destruição da instituição pelas chamas.
Na noite de segunda-feira (3), a Avenida Paulista foi palco de uma manifestação em memória do Museu Nacional e contra o sucateamento da educação e ciência brasileira. O ato foi convocado na noite anterior pela internet, utilizando diversas páginas no Facebook, interditou as faixas da avenida.
O grupo Cientistas Engajados, que reúne professores e pesquisadores de diversas áreas e tem se destacado na luta por mais verba para as Universidades públicas e Institutos de Pesquisa, esteve na linha de frente do ato. O candidato à Presidência da República pelo PPL, João Goulart Filho, também esteve na manifestação.
A candidata à deputada estadual lançada pelos Cientistas Engajados, Mariana Moura, iniciou as falas relatando a dimensão das perdas causadas pela falta de verbas na área científica. Para ela, “é uma perda que não como recuperar. Isto é um crime contra o patrimônio histórico e imaterial do nosso país e da Humanidade. Estamos aqui para fazer um protesto contra o descaso do Governo Federal em relação à ciência e educação”. “O Brasil não pode se dar ao luxo de não investir em ciência e tecnologia”, completou.
O grupo também lançou a candidatura de Walter Neves à Câmara Federal. Walter foi o pesquisador do fóssil humano mais antigo da América do Sul, a Luzia, que foi consumida pelas chamas no último domingo [ver matéria ao lado].
Enquanto andavam em direção ao gabinete de Michel Temer, também na Paulista, os manifestantes puxavam palavras de ordem como: “Se você acha que ciência é gasto, ciência não é gasto não. Ciência é investimento para o progresso da Nação”, “Temer safado, Temer ladrão, o Museu Nacional é patrimônio do povão” e “Cadê o dinheiro? O Temer tá dando pra banqueiro e empreiteiro”.
Também marcaram presença no protesto, o grupo Pesquisadorxs em Luta, a União Municipal de Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES), a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), a União Nacional dos Estudantes (UNE), a Associação Nacional de Pós Graduandos (ANPG) e a Associação de Pós-Graduandos (APG) da USP.
RIO DE JANEIRO
Na capital fluminense, milhares de pessoas participaram do ato: “Luto pelo Museu Nacional” e contra a falta de investimentos em conservação do patrimônio histórico. Na parte da manhã, funcionários do Museu, professores membros da comunidade acadêmica e dos movimentos sociais realizaram um “abraço” nos destroços do prédio da Quinta da Boa Vista.
À tarde, na Cinelândia estudantes, professores e pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro convocaram o protesto, que, segundo o Diretório Central dos Estudantes (DCE Mário Prata), contou com a participação de 25 mil pessoas.
ARROCHO
O Museu Nacional foi vítima da política criminosa de sucateamento dos instrumentos públicos realizada pelos últimos governos. Desde 2013, a verba para a manutenção do Palácio vem sendo reduzida ano a ano.
De acordo com a Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, a verba para o Funcionamento destinado pelo governo federal ao Museu, passou de R$ 545,362 mil em 2013; para R$ 676.606 mil em 2014; R$ 270,349 mil, em 2015; R$ 447,417 mil, em 2016 e R$ 165,393 mil, no ano de 2017.
No ano vigente, o ano de 2018, a verba destinada para o funcionamento do Museu Nacional foi R$ 28.397 mil até o mês de agosto. Pouco mais de R$ 3,5 mil ao mês para o funcionamento do mais importante centro científico do país.
Museólogos condenam destruição
A destruição do Museu Nacional foi condenada por especialistas da área. Kátia Bogéa, presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) classificou o incêndio como uma tragédia e denunciou a falta de recursos.
“É uma tragédia nacional e mundial. Todo mundo está vendo que é uma perda não só para o povo brasileiro, mas para toda a humanidade. O Iphan desde sempre vem acompanhando e ajudando no que pode, tinha um projeto pronto de mais de R$ 20 milhões com recursos do BNDES, mas infelizmente antes de conseguir começar os trabalhos de restauração aconteceu essa tragédia. É uma tragédia anunciada que há muito tempo a gente sabe que o patrimônio cultural brasileiro não tem recurso”.
Dirigentes de outros museus lamentaram o incêndio. Paulo Knauss de Mendonça, diretor do Museu Histórico Nacional resgatou a importância do patrimônio. “O Museu Nacional certamente é um dos símbolos da nossa cultura, não só porque é o mais antigo do nosso país, mas porque tinha coleções extraordinárias. A gente tem falado dos 200 anos do museu, mas as coleções têm muito mais de 200 anos (…) e são jóias da cultura mundial e estamos perdendo devido à incapacidade de dar a atenção devida ao patrimônio histórico no nosso país (…). Esperamos que, após esse acidente trágico, a gente consiga apoio para que a sociedade política e civil consiga se mobilizar para defender o patrimônio histórico que está sendo perdido no país (…) Imagine se esse acidente acontecesse com o público dentro”.
Para o diretor do Museu Imperial, o historiador Mauricio Vicente Ferreira Junior, “é imprescindível que os projetos elaborados pelas equipes técnicas saiam do papel. Que sejam executados na urgência da defesa dos interesses da sociedade postos à nossa responsabilidade. Ou continuaremos chorando a perda do nosso patrimônio, da nossa História, da nossa memória”.
Com o passar do tempo, o Museu Nacional não se modernizou, manteve-se sob vários aspectos como um museu do século XIX. Salas foram fechando por falta de verbas. Havia fios expostos. A catástrofe era mais do que anunciada.