A condenação, na terça-feira, do banco norte-americano BNY Mellon por fraude no fundo de pensões dos funcionários dos Correios, o Postalis, foi uma demonstração de como eram tratados os assuntos financeiros – sobretudo os fundos dos funcionários das estatais e a Petrobrás – nos governos do PT e seu parceiro, o PMDB.
É absolutamente impossível que o Mellon tenha cometido os crimes apontados, sem a participação de Marcelo Sereno, secretário nacional de comunicação do PT e chefe de gabinete de José Dirceu, Vaccari Neto, tesoureiro nacional do PT, e da quadrilha de Cabral (v. a denúncia da Operação Rizoma).
Em suma, o PT e a quadrilha Cabral acumpliciaram-se com um banco americano para roubar o fundo de pensão dos trabalhadores dos Correios.
A punição é administrativa e relativamente branda: o então presidente do Mellon no Brasil, José Carlos Lopes Xavier de Oliveira, conhecido como Zeca Oliveira, foi proibido “por 3 anos de exercer cargos de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição [de ações ou títulos] ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na CVM”.
O BNY Mellon recebeu multa no valor de R$ 7.200.000,00, o que é muito pouco para o que aconteceu.
Mesmo assim, não é todo dia que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) condena um banco americano, aprovando o voto do relator, onde é dito: “As infrações são especialmente graves. (…) agiram contra os interesses do Postalis, atingindo, portanto, milhares de participantes dos planos administrados por aquela fundação. Ao agirem de maneira desleal, atentaram, a um só tempo, contra a higidez do mercado de valores mobiliários e a integridade do sistema previdenciário” (cf. voto do diretor-relator Pablo Renteria).
Além disso, também não é todo dia que a CVM envia um caso, que julgou administrativamente, para a Procuradoria da República, para que sejam tomadas as providências no âmbito criminal.
GESTÃO
Resumindo o caso:
Em 2012, um fundo financeiro de nome “Pacific”, que tinha como “gestora” uma empresa do banco Mellon, a “BNY Administração de Ativos”, adquiriu debêntures (títulos de dívida que podem ser convertidos em ações) de uma empresa denominada “RO Participações S.A.”.
O fundo “Pacific” era um “fundo exclusivo” – pertencia, em 100%, a outro fundo, o “São Bento”.
O fundo “São Bento”, por sua vez, também era um “fundo exclusivo” – pertencia, igualmente em 100%, ao Postalis, dos funcionários dos Correios.
Para que a diretoria do Postalis – um epígono do consórcio governista PT/PMDB – precisava contratar um banco norte-americano para gerir um fundo?
Provavelmente, para roubar com mais eficiência e sem fazer muito (aliás, nenhum) esforço. Como dizia a presidenta da época, é preciso aprender “gestão” com os estrangeiros. Sobretudo, a gestão do roubo.
Porém, prossigamos:
Quanto à “RO Participações S.A.”, que emitiu as debêntures compradas pelo “Pacific”/Postalis, era uma das 38 empresas-fantasmas de Arthur Machado, que assaltava, com o PT e o PMDB, os fundos de pensão das estatais (v. Operação Rizoma prende elo entre a quadrilha do PT e a de Cabral).
O Postalis – através do fundo “Pacific” – gastou R$ 72 milhões na compra das debêntures da “RO Participações S.A.”, no dia 28 de novembro de 2012.
Notemos duas coisas:
1) Esses R$ 72 milhões eram 60% do patrimônio líquido do fundo “Pacific”.
2) O capital social da “RO Participações S.A.” era de R$ 800,00 (oitocentos reais).
Não é um engano, leitor: a empresa que, em 2012, vendeu as debêntures, por R$ 72 milhões, para o “Pacific”/Postalis, tinha um capital social pouco maior que o salário mínimo da época.
Mas, continuemos:
Com os R$ 72 milhões fornecidos pelo “Pacific”/Postalis, a “RO Participações S.A.” adquiriu uma empresa de consultoria, a Risk Office, que era a cliente única da própria “RO Participações S.A.”.
Quanto à Risk Office, seus principais clientes eram fundos de pensão das estatais – como o Postalis.
Vinte dias após adquirir a Risk Office, a “RO Participações S.A.” – ou seja, Arthur Machado – vendeu-a para outra empresa de consultoria, a Aditus.
DONO
Voltemos ao negócio das debêntures:
Dos R$ 72 milhões despendidos pelo “Pacific”/Postalis, foram gastos R$ 13.181.741 (treze milhões, 181 mil e 741 reais) com “pagamento de consultorias e outros custos de emissão” das debêntures, o que era 18% do total da operação. Somente as empresas de consultoria levaram R$ 11.536.000 (onze milhões e 536 mil reais).
Segundo a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o custo de emissão habitual no mercado, na mesma época, variava “entre 0,14% e 8,52%, já considerada a remuneração variável (comissão de sucesso)”.
Portanto, o gasto com o custo de emissão dessas debêntures foi mais que o dobro da maior taxa entre as outras debêntures, emitidas na mesma época – ou 129 vezes a menor taxa.
Porém, observa o relatório da CVM, o escândalo é ainda maior, pois todas as debêntures foram adquiridas por um único comprador, o “Pacific”/Postalis (e, aliás, acrescentamos nós, elas somente foram emitidas para serem compradas pelo “Pacific”).
Logo, se o comprador era único, para que tanto dinheiro gasto com “consultorias e outros custos de emissão”?
A resposta é simples: o próprio Arthur Machado, dono da “RO Participações S.A.”, era também dono de duas das empresas de consultoria contratadas para a emissão das debêntures, pagas com dinheiro do Postalis.
Machado, constatou a CVM, era dono da “Credpag Consultoria”, contratada por R$ 2.500.000 (dois milhões e 500 mil reais), e da “Laber”, contratada por R$ 2.636.000 (dois milhões e 636 mil reais).
Tudo pago com dinheiro do fundo de pensão dos funcionários dos Correios.
PAPÉIS
Vejamos, agora, o que eram essas debêntures:
I) Uma debênture é, como dissemos, um título de dívida, um “papagaio”, uma nota promissória – com a diferença, em relação às promissórias comuns, que pode, em caso de inadimplência, ser convertida em ações, pois sua garantia é o patrimônio da empresa. Por isso, elas são avalizadas pelos controladores da empresa.
II) O prazo médio de vencimento de uma debênture, informa a CVM, é 6,3 anos.
III) No entanto, as debêntures da “RO Participações S.A.” tinham prazo de 15 anos.
IV) Essas debêntures da “RO Participações S.A.” foram emitidas sem garantias. Nas palavras do relatório da CVM: “a escritura de emissão das debêntures não indica garantias concedidas pelos controladores. Este fato foi corroborado pela ‘RO Participações S.A.’, que informou que as debêntures não contemplavam aval dos seus sócios controladores”.
V) Apesar disso, as debêntures foram classificadas como “A-” (“operações que apresentam ativos com boas garantias primárias, secundárias e terciárias. Risco de inadimplência baixo”).
Essa classificação era necessária para que a diretoria do Postalis pudesse adquirir os papéis, sem que houvesse, já em 2012, um escândalo.
Como, então, Arthur Machado conseguiu que papéis sem garantia fossem classificados, por um departamento da própria CVM, como “A-”?
Segundo a CVM, Arthur Machado & trupe falsificaram a documentação, quando registraram as debêntures. O espantoso é que a CVM não tenha conferido essa documentação.
VI) O rendimento dessas debêntures (isto é, os juros auferidos pelo Postalis, depois de comprá-las) era inferior à média do mercado, sobretudo depois que os papéis foram desclassificados, de “A-” para “BB”, porque tornou-se claro que a “RO Participações S.A.” não tinha como pagar nem ao menos os juros acertados (na linguagem da CVM: “o fluxo de caixa da Risk Office era insuficiente para gerar dividendos que pudessem fluir para a ROPart e permitir o cumprimento das obrigações assumidas”).
CAPACIDADE
Agora, vejamos um aspecto didático sobre os bandidos do “mercado de capitais” – esse, que o PT vivia bajulando, sobretudo a partir de 2011, como a salvação do financiamento empresarial.
Havia um parecer, de um departamento do próprio BNY Mellon, desaconselhando o Postalis a adquirir as debêntures da “RO Participações S.A.”.
Esse parecer dizia o seguinte:
“Entendemos que a taxa de emissão do título analisado não encontra-se nos patamares de risco encontrados no mercado para o prazo em questão. A empresa Risk Office (Investimento da RO Participações) por se tratar de uma empresa de serviços e portanto sem ativos reais que garantam a operação possui risco relativamente maior que as emissões utilizadas como referência e descritas acima. Observamos que nessa análise desconsideramos a parcela referente a participação de até 10% nos lucros da Risk Office dado que não nos foi apresentado uma previsão de fluxo de caixa que fundamente uma estimativa deste prêmio” (grifos nossos).
Porém, dentro do próprio Mellon, sob os auspícios de José Carlos Lopes Xavier de Oliveira, esse parecer foi reescrito para o seguinte:
“Entendemos que a taxa de emissão do título analisado encontra-se nos patamares de risco encontrados no mercado para o prazo em questão. A empresa Risk Office (investimento da RO Participações) por se tratar de uma empresa de serviços possui risco relativamente maior que as emissões utilizadas como referência. No entanto, considerando as taxas de mercado analisadas (e spread de risco acima da NTNB) e o upside proporcionado pela participação de até 10% nos lucros da Empresa, concluímos que a emissão em questão está compatível com o risco da operação” (grifos nossos).
Como se pode ver, os monopólios financeiros têm uma insuperável competência técnica…
PRESIDENTE
Em julho de 2014, ainda no governo Dilma, a diretoria do Postalis resgatou as debêntures da “RO Participações S.A.”, que estavam no fundo “Pacific”, e incorporou-as à sua própria carteira.
O total dessa operação foi de R$ R$ 69.803.296,02 (sessenta e nove milhões, 803 mil, 296 reais e 2 centavos).
O motivo dessa incorporação é que o Postalis queria “investir” em uma empresa de nome “XNice Participações S.A.”, comprando suas debêntures.
A ideia (?) era gastar R$ 169.545.247,00 (cento e sessenta e nove milhões, 545 mil e 247 reais) com debêntures da “XNice”.
O nome do presidente da “XNice Participações S.A.” era Arthur Mário Pinheiro Machado – o mesmo Arthur Machado que era o dono da “RO Participações S.A.”.
Ao todo, a diretoria do Postalis colocou R$ 570 milhões – dinheiro dos funcionários dos Correios – nas “empresas” de Machado.
GAMA FILHO
Resta dizer que um dos fundos de Arthur Machado, o FIP ETB (Eletronic Trading Brazil), “recebeu R$ 223,4 milhões dos administradores da carteira própria do Postalis a partir de 2010, mas não gerou nenhum retorno financeiro apesar do montante investido” (cf. Denúncia cit., p. 30).
Ou, senão, outro roubo para locupletar Arthur Machado e seu sócio Milton Lyra, operador de Cabral, Renan Calheiros e Eduardo Cunha que atende pela alcunha de “Miltinho”:
“Em 2010, o grupo Galileo Educacional foi criado para tentar salvar a universidade Gama Filho da bancarrota. O Galileo emitiu R$ 100 milhões em debêntures, títulos em que a empresa paga juros no futuro a quem a financia. A garantia eram as mensalidades do curso de medicina, o mais respeitado. O Postalis investiu R$ 75 milhões no Galileo. Dois anos depois, Miltinho tornou-se diretor do Galileo. No ano passado, o Ministério da Educação descredenciou a Gama Filho, e milhares de estudantes ficaram sem aulas, sem diploma e, claro, não pagaram mensalidades. O grupo Galileo está quebrado, com uma dívida de cerca de R$ 900 milhões” (cf. Denúncia cit., pp. 31-32).
Outra “empresa” de Machado, “a Alubam Participações S.A, teve o Postalis como o único comprador das debêntures lançadas no valor R$ 62 milhões”.
PROPINA
Os fatos aqui relatados aconteceram durante o governo da mulher honesta.
Mas o que o PT ganhou com isso?
Por exemplo, disse um operador de Machado no Postalis, de nome Henrique Barbosa:
“… em meados de 2014, (…) foi à residência de Alessandro Laber [sócio de Machado], localizada em um condomínio na Barra da Tijuca, na rua da praia, em seu próprio veículo Honda Civic, Placa KUZ 3822, cor preta, em duas ocasiões, nas quais recebeu duas malas de dinheiro;
“… Adeílson [Telles, do PT, chefe de gabinete do presidente do fundo de pensão da Petrobrás, Wagner Pinheiro] disse que a quantia era para ser entregue à Marta, então secretária de João Vaccari Neto;
“… cerca de 2 semanas depois, entregou os valores à Marta, em dois dias diferentes;
“… Marta era secretária pessoal de João Vaccari Neto, morena e baixinha;
“… depois da realização dos pagamentos, avisou Adeílson” (cf. Denúncia cit., p. 94).
As propinas para o PT e PMDB foram confirmadas pelas mensagens apreendidas em celulares e computadores – e pelas gravações telefônicas, realizadas com autorização judicial.
Arthur Machado, Marcelo Sereno, e mais alguns membros dessa quadrilha, foram presos por ordem do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, no dia 9 de abril de 2018.
Mas foram soltos por Gilmar Mendes.
C.L.
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E aí até hoje pagamos o roubo, tiramos o LEITE de nossos filhos prá pagar durante 20 anos o roubo, sem sequer podermos sair, senão perdemos tudo que investimos até hoje.
Estou muito decepcionado, agora para encarar tudo isso, só uma revolução comunista daquelas muito braba!!! Paredão nos corruptos e todos os seus beneficiários…
“Como, então, Arthur Machado conseguiu que papéis sem garantia fossem classificados, por um departamento da própria CVM, como “A-”? Segundo a CVM, Arthur Machado & trupe falsificaram a documentação, quando registraram as debêntures. O espantoso é que a CVM não tenha conferido essa documentação.” Nessa parte o artigo vacila, provavelmente porque o autor não entendeu direito, por não ser familiarizado com matérias de mercado. Não existe departamento da CVM que dê rating, isso quem faz são as agências classificadoras de risco. No caso, a LF Rating.
Leitor, você acha mesmo que é preciso ser “familiarizado” (Deus nos livre!) com o “mercado” para saber tal coisa? Acha mesmo que, depois de todas as fraudes das agências de risco (ou de rating), expostas desde 2008, nós ignoramos isso? O que estranhamos é que um departamento da CVM aceite um relatório de rating sem conferir se suas bases são minimamente verdadeiras. Só isso. Aliás, a Superintendência de Relações com Investidores Institucionais (SIN) da própria CVM também estranhou. Por isso é que foi aberta a investigação.