
O Programa San Tiago Dantas de Pós-Graduação em Relações Internacionais, realizado numa parceria com as instituições públicas Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) pode ter a parceria com a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) encerrada por ser crítico ao massacre promovido por Israel contra palestinos na Faixa de Gaza.
O convênio, que já dura 23 anos e é renovado periodicamente, venceu em agosto de 2024. Até o momento, a Fundasp não assinou sua renovação, mas, mesmo sem a assinatura da PUC-SP, a pós-graduação continuará sendo oferecida pelas universidades públicas.
O imbróglio começou quando alunos pró-Israel denunciaram os professores Reginaldo Nasser, coordenador do programa, e Bruno Huberman ao comitê de ética de por supostamente terem feitos falas antissemitas.
Em novembro de 2024, os professores Reginaldo Nasser e Bruno Huberman foram convocados a depor perante o Setor de Ética e Integridade da Fundação São Paulo a respeito de acusação de antissemitismo evidenciado pelas falas dos docentes. Na ocasião, a Fundação São Paulo divulgou nota esclarecendo que o seu Setor de Integridade não encontrou motivos para medidas disciplinares para estudantes e professores que se manifestaram sobre o conflito no Oriente Médio.
“Após criteriosa coleta e análise de depoimentos, documentos, vídeos e outros materiais, o Setor de Integridade concluiu que “não foram identificadas situações no âmbito institucional que justificassem a aplicação de medidas disciplinares a docentes ou discentes. Os docentes envolvidos, em suas oitivas, defenderam o direito de autodeterminação dos povos e o respeito aos direitos humanos de todos aqueles que vivem entre o Rio Jordão e o Mar Mediterrâneo, seja na forma de um, dois, ou mais Estados”.
A Fundação decidiu instituir um Protocolo Antidiscriminatório, cujo texto pode ser encontrado na página da Fundasp, que será anexado ao seu Código de Ética. “Causou estranheza entre a comunidade, a adoção da definição de antissemitismo baseada no texto da Aliança Internacional para Memória do Holocausto (IHRA, na sigla em inglês) em que estabelece como antissemistimo não os ataques ao povo judeu, condenando “toda manifestação retórica e física orientada contra indivíduos judeus e não judeus e/ou contra seus bens, contra as instituições comunitárias e instalações religiosas judaicas”, mas tenta emplacar a definição sionista de que também se configura como antissemitismo “as manifestações contra o Estado de Israel, enquanto coletividade judaica”.
Surge assim o subterfúgio para criminalizar e punir aqueles que se contraponham ao genocídio palestino provocado por Israel de Benjamin Netanyahu.
Indignados, professores fizeram um abaixo-assinado em que questionara a definição de antissemitismo da Fundasp: “é antissemitismo responsabilizar um indivíduo judeu, independente da sua ideologia, pelos crimes cometidos por Israel. Contudo, o protocolo da Fundasp é aberto a interpretações que podem resultar em punições contra docentes, funcionários e estudantes que apresentem uma postura crítica a Israel […] exigimos que seja aberto um processo amplo e democrático, que inclua toda a comunidade puquiana nas instâncias internas já existentes, dos Centros Acadêmicos ao Conselho Universitário, para o debate e redação de um novo termo.”
Ainda em novembro, o professor Reginaldo Nasser, que passou a ser alvo de ataques xenófobos na universidade por sua ascendência árabe, conseguiu uma reunião com o padre José Rodolpho Perazzolo, diretor-executivo da Fundação São Paulo (Fundasp) que chegou a dizer que o curso estava em “extrema-unção”.
“Eu pensei que extrema-unção gera morte, mas entendi que não era só morte porque ele disse que tinha uma chance de sobrevivência, que era para procurar a nova reitoria, que estava entrando, explicar academicamente e ver o que ia fazer. Não teve resposta nenhuma. Até hoje não teve resposta”, relata Reginaldo Nasser ao ICL Notícias.
A argumentação da Fundação São Paulo (Fundasp) apresentada a Nasser é de que o programa, que possui nota 5 (máximo) na Capes, tinha um alto custo e dava prejuízo. Mas, ao contrário do que afirma tal “justificativa”, a PUC registrou um superávit de R$ 33 milhões, apenas em 2024, valor 5,7% maior que o do ano anterior, de acordo com os dados divulgados pela própria Fundasp ao Conselho Universitário.
Nasser segue dando aulas e orientações aos alunos da pós-graduação. Recentemente, porém, ele foi informado pelo RH da Pontifícia que o contrato estava sendo reduzido porque essas atividades “não estavam autorizadas”.
“O argumento é ridículo. Tem a seguinte pergunta: durante 23 anos manteve e por que exatamente agora, no primeiro semestre de 2025, é que vem a argumentação de que dá prejuízo, no momento em que a PUC está tendo superávit? Não bate muito bem… É difícil acreditar em outro argumento que não seja a questão política”, argumenta o professor.
Recentemente, o banheiro da PUC-SP foi pichado com dizeres preconceituosos direcionados ao povo palestino. A universidade não tomou medidas adequadas, apenas mandou pintar as paredes sem qualquer investigação. O professor Reginaldo Nasser também denunciou o ataque em suas redes sociais. Os estudantes realizaram uma assembleia e enviaram uma nota ao Padre Rodolfo, onde cobram um posicionamento claro, medidas cabíveis e um encontro entre a Fundasp e reitoria com as pessoas que sofrem com o racismo, para que possam buscar soluções eficazes.
RODRIGO LUCAS