Putin confirma que está adiada a reunião com Trump em Budapeste

Putin e Trump no encontro em Anchorage, Alasca (AP)

O presidente russo Vladimir Putin disse que a reunião em Budapeste com seu homólogo norte-americano Donald Trump – aliás, proposta por este em conversa telefônica na semana passada – foi adiada.

“O presidente dos EUA decidiu adiar ou mesmo cancelar esta reunião. Mais provavelmente, ele está falando em adiá-la”, disse Putin a repórteres nesta quinta-feira (23) em Moscou.

Ele enfatizou que a Rússia sempre apoiou o diálogo contínuo e que o diálogo é sempre melhor do que continuar a guerra. Ele observou também que não seria possível realizar a reunião bilateral sem a devida e cuidadosa preparação.

O presidente russo comentou ainda que se Tomahawks fossem parar nas mãos do regime de Kiev, a resposta seria “avassaladora”. Ele denunciou como uma “tentativa de escalada” a frenética busca do chefe do regime neonazista, Volodymyr Zelensky, pelos mísseis norte-americanos de longo alcance.

Putin sublinhou que “nenhum país que se preze” faz algo sob pressão, acrescentando que a Rússia está pronta para cooperar com os Estados Unidos. O que depende não apenas da Rússia, mas também dos Estados Unidos.

“Se, no final, nos afastarmos da pressão e, em vez disso, avançarmos para uma discussão séria sobre o futuro a longo prazo, inclusive na esfera econômica, então teremos muitas áreas para trabalho conjunto”, disse ele.

Na quarta-feira, durante uma coletiva na Casa Branca ao lado do secretário-geral da Otan, Mark Rutte, Trump havia anunciado o cancelamento da reunião com Putin. “Cancelei minha reunião com Putin. Não me parecia certo encontrá-lo. Não achei que chegaríamos onde precisávamos, então cancelei”.

Sem mencionar data ou local, Trump asseverou que “uma reunião com Putin acontecerá no futuro”.

Rutte foi a Washington para negociar mais entregas de armas a Kiev e para levar para Trump o “plano de paz” da União Europeia que, como na frase famosa de Garrincha, “só falta combinar com os russos” – que estão vencendo no campo de batalha.

Na sexta-feira passada, após uma reunião com Zelensky descrita pela mídia dos EUA como muito “áspera”, na volta a Mar-a-Lago Trump passara a dizer a jornalistas que queria “um cessar-fogo ao longo da atual linha de combate”.

Uma inversão do que parecia ser o consenso entre ele em Putin na cúpula no Alaska, de que era necessário resolver as “razões de fundo” para chegar a uma paz duradoura. Ou seja, nada de Otan, a neutralidade da Ucrânia, o direito à língua e à religião para os russos étnicos na Ucrânia e o reconhecimento da reunificação das regiões históricas à Rússia.

Sobre o fornecimento dos Tomahawks a Kiev, Trump dissera que “O problema é que leva pelo menos seis meses, e geralmente um ano, para aprender a usá-los, porque eles são muito complexos… Portanto, a única maneira de lançar os Tomahawks é se nós mesmos os lançarmos (em território russo. – Ed.), mas não faremos isso”.

Ao mesmo tempo em que dialogava com Putin, Trump também vinha pressionando a China e a Índia, os dois principais compradores do petróleo e gás russos, para suspenderem as importações, alegando que isso “financiava a guerra” de Moscou na Ucrânia.

Em paralelo ao adiamento da cúpula de Budapeste, o Departamento do Tesouro dos EUA anunciou novas sanções contra duas grandes companhias russas do setor energético — a Lukoil e a Rosneft, decretadas abertamente como uma forma de imprensar a Rússia. Sanções que Trump classificou como “tremendas”, embora dizendo esperar que “não durem muito”.

Na véspera, o ministro das Relações Exteriores russo, Sergey Lavrov, havia sido claro sobre a oposição da Rússia à inversão das prioridades na Ucrânia, no momento em que algumas cidades que ainda são reduto dos neonazistas num canto do Donbass estão cercadas e prestes a serem libertadas.  

Os pedidos de cessar-fogo na Ucrânia neste momento contradizem os acordos alcançados por Putin e Trump na cúpula do Alasca, ele apontou.

“Um cessar-fogo agora significaria apenas uma coisa – que uma grande parte da Ucrânia permanece sob o controle de um regime nazista”, disse ele. “Seria o único lugar na Terra onde uma língua inteira é legalmente proibida, sem mencionar que é uma língua oficial da ONU e falada pela maioria da população”.

Ao tempo que os vassalos europeus da Otan abertamente anunciam sua intenção de formar uma “coalizão dos dispostos” e entrar com tropas nas áreas sob controle de Kiev.

Lavrov acusou o que chamou de “patronos e mestres europeus” da Ucrânia de influenciar Washington a abandonar qualquer busca por um acordo de paz abrangente, como acordado no Alaska. “Essa reunião”, disse Lavrov, “foi para abordar as causas profundas do conflito, não congelá-lo onde estão”.

Os comentários de Lavrov seguiram uma declaração conjunta emitida por líderes europeus em 21 de outubro sugerindo que “a atual linha de contato deve ser o ponto de partida das negociações”, pegando carona no “parem onde estão” de Trump.

O que se viesse a ocorrer essencialmente repetiria os precedentes que levaram ao colapso dos Protocolos de Minsk, usados segundo os chefes de Estado garantidores, França e Alemanha, para “ganhar tempo e rearmar Kiev”.

No início desta semana, a CNN havia informado que uma reunião planejada entre o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, e Lavrov, destinada a conversas preparatórias para a cúpula de Budapeste, fora adiada por razões não reveladas. As negociações Rubio-Lavrov estavam inicialmente previstas para ocorrer esta quinta-feira.

O INSANO 19º PACOTE DE SANÇÕES EUROPEU

A União Europeia (UE) adotou nesta quinta-feira um novo pacote de sanções contra a Rússia, anunciou Kaja Kallas, alta representante do bloco para Assuntos Exteriores e Política de Segurança e notória russófoba proveniente dos pequenos Estados bálticos, em sua conta no X, acrescentando que ela “mira bancos russos, serviços de câmbio de criptomoedas e empresas na Índia e na China, entre outros”.

“Os últimos três anos demonstraram isso claramente com os 18 pacotes [de sanções] anteriores. Bem, não cabe a nós, mas a outros, julgar o quão eficazes eles foram”, destacou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.

“Agora, em relação às novas sanções, em primeiro lugar, não há nada de novo aqui. Sim, elas terão certas consequências, mas não terão um impacto significativo em nosso bem-estar econômico”, observou Putin. Além disso, o presidente russo sugeriu que se considere quem está levando o atual governo americano a tomar tais decisões.

A abrangência do pacote inclui até mesmo a proibição de exportação de vasos sanitários para a Rússia, líquens e azaléias, gerando chacota em Moscou. A porta-voz da diplomacia russa, Maria Zakharova, ironizou que a União Europeia em breve irá proibir as aves migratórias de voarem para a Rússia…

Menos diplomático, o ex-presidente russo e atual vice do Conselho Nacional de Segurança, Dmitry Medvedev, advertiu que o próprio presidente norte-americano, que se refere ao conflito de a “guerra de Biden”, está prestes a torna-lo a “guerra de Trump”. Ele chamou a Rússia a se concentrar em atingir seus objetivos. Trump vive dizendo que essa não é a guerra dele e que “nem teria começado” se ele fosse o presidente.

É O PETRÓLEO, ESTÚPIDO

Putin se deteve sobre o significado político das sanções dos EUA às duas petroleiras russas – “um ato hostil” e que “prejudica as relações russo-americanas, que estavam apenas começando a se recuperar.”

“Quanto ao aspecto econômico, se olharmos objetiva e profissionalmente para o lado econômico dessas sanções, o que vemos?, questionou Putin.

“Atualmente, os EUA, creio eu, produzem cerca de 13,5 milhões de barris por dia, ocupando o primeiro lugar. A Arábia Saudita vem em segundo, com cerca de 10 milhões, e a Federação Russa em terceiro, com cerca de 9,5 milhões de barris por dia. Mas os EUA consomem 20 milhões. Eles vendem parte e compram ainda mais, principalmente do Canadá. Portanto, 13,5 [milhões] são produzidos e 20 [milhões] são consumidos.”

Quanto à Rússia e à Arábia Saudita, vendem respectivamente 7,5 e 9 milhões de toneladas de petróleo e derivados.  “Em outras palavras, nossa contribuição para o balanço energético global é muito significativa. Romper esse balanço é uma tarefa muito ingrata, inclusive para aqueles que tentam fazê-lo. Por quê?”

“Em primeiro lugar, é preciso dizer que a produção geral está atualmente estagnada. É claro que é possível substituir parte — certamente não a totalidade — do petróleo e derivados russos no mercado global. Mas, em primeiro lugar, isso leva tempo e, em segundo lugar, exige investimentos significativos.”

Os hidrocarbonetos são indispensáveis, pelo menos nos próximos anos e décadas, apontou Putin. “Isso fica evidente no consumo crescente. A economia global está crescendo e o consumo de energia está aumentando.”

“Portanto, um aumento acentuado não parece viável neste momento. E se a oferta do nosso petróleo e derivados no mercado global diminuir drasticamente, os preços subirão, como meu colega americano e eu discutimos.”

“A que isso levará? Levará a um aumento acentuado no custo do petróleo e dos derivados, inclusive nos postos de gasolina — e os Estados Unidos não são exceção. E, dado o calendário político interno nos Estados Unidos [as eleições do próximo ano], fica claro o quão sensíveis alguns processos serão nesse sentido.”

“E aqueles que estão pressionando o atual governo [dos EUA] por tais decisões — precisamos entender para quem eles estão trabalhando”, observou Putin.

“Mas isso não importa. O importante para nós é que nos sintamos confiantes, estáveis e, apesar de certas perdas — elas certamente existirão, devido a muitas circunstâncias —, nosso sistema energético é, ainda assim, bastante estável.”

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