Quatro procuradores renunciam após ingerência da Casa Branca no Judiciário

Stone, amigo e confidente de Trump ao deixar audiência na Corte Federal em Washington - Doug Mills - NYT

Poucas horas depois de um tuíte de Trump, o Departamento de Justiça dos EUA mudou parecer reduzindo a recomendação de prisão para Roger Stone, amigo do chefe da Casa Branca, de 87 a 108 meses, para 15 a 21. Isso quando o caso já estava nas mãos dos procuradores federais, levando-os a pedirem a renúncia coletiva do caso

Os quatro procuradores que atuavam no caso Roger Stone se demitiram em repúdio à interferência de Trump no Judiciário norte-americano para aliviar a pena de seu amigo e confidente.

No dia 11, o Departamento de Justiça, (que nos EUA acumula a função de Procuradoria Geral), chefiado por William Barr, mudou o parecer que já havia expedido quando transferiu a investigação de Stone ao procurador especial que estava encarregado do caso, Robert Mueller.

O que revoltou os procuradores nomeados por Mueller para o processo foram dois fatores em conjunto: o primeiro pelo fato da mudança ter ocorrido em meio a suas diligências e o segundo é que a mudança ocorreu logo depois de uma mensagem tuitada por Trump, ao final do dia 10, considerando o parecer anterior do Departamento de Justiça (DoJ) “como muito horrível e injusto”.   

Neste parecer inicial, o DoJ recomendava uma pena de 87 a 108 meses, incluindo, na recomendação da pena, a acusação de “intimidação de uma testemunha durante meses”. Depois do tuíte de Trump a recomendação foi reduzida a uma pena de reclusão por de 15 a 21 meses. Algo próximo de um décimo da proposta anterior.

Stone foi acusado de mentir ao Congresso norte-americano, intimidação de testemunha e obstrução de investigação da Câmara dos Deputados, durante o rumoroso processo apelidado de Russiagate, movido pelos democratas sobre o suposto envolvimento da Rússia para determinar os rumos das eleições presidenciais que levaram Trump à Casa Branca.  

O episódio dos pocuradores é mais um desgaste de Trump, pois se supõe que o Departamento de Justiça deve agir de forma independente. O que não quer dizer que sempre foi assim, mas não se tinha chegado a tal nível de ingerência escancarada e interessada.

Com o recuo do Departamento de Justiça, Trump resolveu tripudiar sobre os procuradores responsáveis pelo caso com mais um tuíte, desta vez congratulando-se com o procurador-geral “por assumir um caso que estava totalmente fora de controle e que, talvez, nem devesse ocorrer”. Trump também disse que tinha “o absoluto direito” de fazer o que fez.

Entre as acusações contra o truculento amigo de Trump, Roger Stone, se inclui a de haver postado uma foto da juíza distrital que vai julgar o seu caso, Amy Berman Jackson, sob a mira de uma arma. O julgamento está marcado para o dia 20. Não se sabe se com o afastamento dos procuradores a audiência ocorrerá na data já determinada. 

Depois da chegada do novo parecer do Departamento de Justiça, começaram as demissões.  Aaron Zelinsky, um dos membros da equipe montada por Mueller, deixou o caso e o seu trabalho em Washington afirmando que retornaria a seu posto original em Baltimore.

A seguir, foi a vez de Adam Jed informar de sua renúncia ao caso. Logo depois, os dois outros procuradores, Michael Marando e Jonathan Kravis, renunciaram, sendo que o último informou haver se afastado de sua posição como procurador assistente do governo federal em Washington. Marando, ao se afastar do caso, deu uma curta declaração: “A verdade importa”.

O movimento coletivo enfatizou o crescente desgaste entre os procuradores federais de carreira e a Casa Branca, assim como com os indicados por Trump para o Departamento de Justiça, principalmente por não ter sido o único caso de intervenção do Executivo no Judiciário desde que Trump chegou à Casa Branca.

Líderes do Partido Democrata condenaram tanto a postura de Trump, como a submissão do chefe do Departamento de Justiça. O líder dos democratas no Senado, Chuck Schumer, declarou que os fatos demandam uma investigação sobre a participação do procurador-geral e de Trump na mudança do parecer.

O presidente do Comitê de Inteligência da Câmara, Adam Schiff, considerou um flagrante abuso de poder se ficasse comprovada a intervenção do chefe do DoJ em favor de Trump e seu amigo.

“Fazer isso seria uma mensagem sem subterfúgios de que o presidente Trump vai proteger aqueles que mentem ao Congresso para encobrir sua própria má conduta e de que o procurador-geral estaria junto com ele neste esforço”, disse Schiff, deputado pela Califórnia.

A presidente da Câmara, deputada democrata Nancy Pellosy chamou o comportamento do DoJ de “ultrajante” e que “danificou profundamente o primado do Direito”.

Já Trump manteve sua posição e aprofundou o choque com os procuradores em mais uma tuitada declarando que os responsáveis pelo caso Stone “fugiram”.

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