Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) mostra que a imprensa – inclusive, nós – foi injusta com Fabrício Queiroz, o amigo de Bolsonaro, e motorista de seu filho, Flávio, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
Queiroz não movimentou, em sua conta, apenas R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017.
Na verdade, Queiroz movimentou R$ 7 milhões.
Nos dois anos anteriores a janeiro de 2016, Queiroz movimentou R$ 5,8 milhões.
O que significa uma média de R$ 2 milhões e 300 mil por ano, entre 2014 e 2017, sem renda ou patrimônio que expliquem o fenômeno.
A informação foi divulgada no domingo pelo jornal “O Globo”.
No dia anterior, fora divulgada uma transferência, pelo próprio Flávio Bolsonaro, de R$ 1.016.839 (um milhão, 16 mil e 839 reais) para pagamento de um título da Caixa Econômica, sem que se saiba quem foi o beneficiado.
Um dia antes, foram 48 depósitos suspeitos (aliás, se o leitor nos permite o superlativo, suspeitíssimos) na conta do mesmo Flávio Bolsonaro, que foram achados pelo Coaf (v. Quem fazia os depósitos na conta de Flávio Bolsonaro?).
Na sexta-feira, quando Flávio Bolsonaro deu uma entrevista-relâmpago na TV Record, para explicar porque entrara com um pedido no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir as investigações, seus protestos sobre uma suposta quebra do sigilo bancário sugeriram (aliás, provocaram) uma questão: o que ele está querendo esconder?
O que está por baixo do seu sigilo bancário?
Por que esse sigilo é tão importante para ele?
Pois, a questão não é se o Ministério Público, ao pedir relatórios ao Coaf, desrespeitou o seu sigilo bancário – o que, aliás, segundo decisões do STF e do STJ, não ocorreu.
A questão é por que ele faz tanta questão de manter em sigilo as suas operações bancárias.
O que há nelas que mereça ser escondido?
A tal ponto que, para fazer o pedido ao STF e paralisar as investigações, ele pretextou um suposto “foro privilegiado” – o mesmo que seu pai e ele haviam repudiado antes da eleição.
Na Record, disse Flávio Bolsonaro:
“Eu sou contra (o foro privilegiado), mas não é uma escolha minha. O foro é uma prerrogativa de função. Querendo ou não querendo, eu preciso entrar com o remédio legal no órgão competente.”
Ao contrário: é uma escolha sua recorrer – ou não – a um argumento sem a mínima vergonha para impedir investigações de delitos.
Também é uma escolha sua manter ou não o seu sigilo bancário – há uma longa lista de homens públicos, no Brasil, que, em vista de investigações, abriram mão do sigilo bancário, sem que a Justiça o tivesse feito.
Há, também, os que prometeram liberar o extrato de suas contas bancárias ao público, e, depois, ao invés disso, se agarraram ao sigilo bancário como a uma boia durante o naufrágio do Titanic – o exemplo mais recente foi Michel Temer.
Muitos eleitores de Bolsonaro manifestaram-se entre decepcionados e indignados com o que agora surge à tona – ver, por exemplo, as manifestações no perfil de Flávio Bolsonaro no Instagram.
A rigor, somente Mourão, que aderiu ao estilo esportivo Dilma Rousseff – como presidente interino, enquanto Bolsonaro vai a Davos, sua principal atividade parece ser a de andar de bicicleta – fez uma defesa de Flávio Bolsonaro: “eu acho que está havendo algum sensacionalismo e direcionamento nesse troço. Por causa do sobrenome. Não pela imprensa, que revela o que chega às mãos dela. O Ministério Público tem de ter mais foco nessa investigação“.
Como se o sobrenome do investigado fosse indiferente, em uma investigação onde há um deputado estadual e senador que somente foi eleito por causa do sobrenome…
Mas nem isso é importante, nesse caso.
Houve 10 deputados estaduais presos, 75 funcionários da Alerj investigados e 22 Procedimentos de Investigação Criminal (PIC) abertos pelo Ministério Público.
Mourão, portanto, não está protestando contra “direcionamento” algum. A rigor, está propondo que haja um privilégio para quem carregar o sobrenome Bolsonaro.
Flávio Bolsonaro, portanto, é diferente.
Assim como sua conta bancária deve ser diferente.
C.L.
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