(HP 25/11/2016)
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, alertou para o perigo de que os parlamentares, ao insistirem na discussão sobre anistia ao crime de caixa 2, estariam, na verdade, tentando obter anistia para outros crimes cometidos por eles como lavagem de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato e evasão de divisas. Segundo ele, não há necessidade de se falar sobre o perdão à prática de caixa 2 e o pano de fundo para esse debate é uma tentativa de anistiar outros crimes ligados ao ato, como a lavagem de dinheiro.
Ele explicou que se há tipificação do crime de caixa 2 – uso de dinheiro não contabilizado perante à Justiça Eleitoral – a partir de agora, a discussão sobre anistia para caixa 2 não tem efeito. Isso porque a lei penal não pode retroagir neste caso. As práticas de caixa 2 anteriores à lei, portanto, só seriam punidas de acordo com a legislação eleitoral, como são atualmente. Para o procurador, os deputados estão tentando introduzir uma emenda que os protegeria dos crimes praticados até agora e que estão sendo revelados pela operação Lava Jato. “Há limites éticos para as alterações legislativas”, alertou o procurador.
“Na verdade, o discurso de anistia se refere aos outros crimes que estariam por trás do caixa 2: lavagem de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de dividas. E essa discussão viria nesse sentido. Porque se você cria um crime hoje de caixa 2 esse crime não pode retroagir, é só daqui para frente”, destacou Janot, nesta quarta-feira (23). “A discussão está desfocada”, disse Janot, sugerindo em tom crítico que há uma tentativa de parlamentares de, com a anistia, conseguirem perdão aos outros crimes mais graves relacionados à prática.
A comissão especial aprovou o texto base do relator, deputado Onix Lorenzoni (DEM-RS), na noite de quarta-feira (23). Mas na calada da madrugada foi acertado um golpe, um acordo clandestino, envolvendo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para ser apresentado uma emenda derrubando quase todo o parecer de Lorenzoni ao projeto das dez medidas contra a corrupção (pacote anticorrupção), proposta dos procuradores, que recebeu 2 milhões de assinaturas em todo o país.
Além de ser introduzida a anistia ao caixa 2, punições para juízes e procuradores, por exemplo, também seria incluída.
“Terá um [relatório] substitutivo, que muda bastante do conteúdo dele [texto aprovado na comissão]. [Muda] Quase tudo. Algumas coisas conseguiram salvar lá. 70% [muda]”, relatou o deputado Vicente Cândido (PT-SP), vice-líder do partido, que participou da reunião do acordão com Maia. “[Sobre caixa dois] criminaliza a partir de agora e isenta quem cometeu aquele tipo penal. Se não entrar no texto, entra como emenda. Um texto de lei tem que ser sempre muito claro o conteúdo”, completou Cândido. Os partidos Psol e Rede foram contra o acordo, assim também como mais da metade da bancada do PT na Câmara. Liderando a ala que quer anistiar os corruptos está o líder do PT na Casa, Afonso Florence (PT-BA).
A previsão era de votar em plenário ainda na quinta-feira (24) e apresentar a emenda. Alguns parlamentares se revoltaram com o acordo espúrio e denunciaram que sequer sabiam da reunião. “O Parlamento brasileiro não pode se sujeitar a ficar de quatro nem de cócoras para um acordão dessa natureza. Isso é inadmissível!”, reagiu o deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP). “Qual é a moral para representar esse povo, se na calada da noite pessoas se reúnem para tramar um golpe contra a democracia, destruindo a própria capacidade do Parlamento de representar o anseio e a soberania popular?”, questionou o deputado Edmilson Rodrigues (Psol-PA).
A pressões foram tantas que os anistiadores da corrupção tiveram que recuar e adiar a votação do projeto.