Partidos de oposição ao governo federal vão dar entrada em representações contra o presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF) e na Procuradoria-Geral da República (PGR) por obstrução de justiça. Para os líderes da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB), e no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede), o presidente “confessou ter se apropriado de provas” ao dizer que pegou as gravações na portaria do condomínio Vivenda da Barra antes que os áudios fossem adulterados.
Na manhã deste sábado, Bolsonaro afirmou, em Brasília, numa concessionária, que pegou os áudios das ligações realizadas entre a portaria e as casas do condomínio Vivendas da Barra antes que, segundo ele, as gravações fossem adulteradas. O presidente não especificou a data em que retirou os arquivos.
“Não cabe ao presidente da República determinar a apreensão de provas. Esperamos que se determine o quanto antes a devolução do material apreendido pelo presidente da República e que o mesmo responda perante a Justiça pelo ilícito que confessou ter praticado”, afirmaram os parlamentares em nota.
Em entrevista a jornalistas Bolsonaro não especificou a data em que retirou os arquivos da portaria. “Agora, eu estava em Brasília, está comprovado. Várias passagens minhas
pelo painel eletrônico da Câmara, com registro de presença, na quarta-feira geralmente parlamentar está aqui. Eu estava aqui, não estava lá, e outra, nós pegamos antes que fosse
adulterado, pegamos lá toda a memória da secretária eletrônica, que é guardada há mais de anos, a voz não é minha. Não é o seu Jair”, disse.
“Agora, que eu desconfio, que o porteiro leu sem assinar ou induziram ele a assinar aquilo. Induziram entre aspas, né? Induziram a assinar aquilo”, declarou a jornalistas durante visita a uma concessionária na capital federal, onde comprou uma motocicleta.
Segundo o porteiro ouvido nas investigações do caso Marielle e Anderson, um dos suspeitos do crime, Élcio Queiroz, foi autorizado a entrar no Condomínio Varandas da Barra por um morador da casa 58 (de Bolsonaro) que se identificou como “seu Jair”, horas antes do duplo homicídio. Mas ele se dirigiu para a residência de seu comparsa e vizinho de Bolsonaro, Ronnie Lessa. Bolsonaro era deputado em março de 2018 e estava em Brasília naquele dia e horário.
As promotoras do Ministério Público do Rio de Janeiro, responsáveis pelo caso Marielle, afirmaram, em entrevista coletiva na quinta-feira (31), que o porteiro não disse a verdade. A afirmação foi feita baseada exclusivamente em perícia realizada do áudio da casa de Ronnie Lessa. Especialistas afirmam que a perícia deveria ser feita no computador onde ficam registradas todas as chamadas da portaria. Foi exatamente este material que Jair Bolsonaro disse que retirou da portaria, segundo ele, para não haver adulteração.
O presidente da Associação dos Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos Camargo, criticou a pressa com que foi divulgado o resultado da perícia nas gravações da portaria do condomínio onde Bolsonaro mora no Rio.
“Aparentemente, do que se extraiu da imprensa, foi uma análise muito superficial, não contemplou todos os vestígios disponíveis e foi feito de uma forma muito célere. Talvez fosse necessário um aprofundamento maior, colher outros tipos de vestígios, sejam eles vestígios físicos, que estavam na guarita, como o computador, circuito interno de TV, uma cadeia de custódia para que se tenha uma conclusão aprofundada dos fatos”, disse Camargo.
“Um exame desses é bem mais prolongando, bem mais longo. Fazer um parecer, uma análise técnica superficial, preliminar, é possível fazer. Mas para um laudo pericial, com a profundidade científica que se exige para o processo penal, é um tempo rápido para se ter uma conclusão como essa”, afirmou.