Em documento dirigido na quarta-feira (19/12) ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, afirmou que Lula “confunde ‘direito à ampla defesa’ com ‘direito à defesa ilimitada’, exercida independentemente de sua utilidade prática para o processo, em razão do mero ‘querer’”.
“Enquanto o primeiro direito”, diz a procuradora, “é, de fato, albergado pela ordem jurídica pátria, o segundo, não apenas não se encontra nela previsto, como é por ela rechaçado”.
O parecer foi elaborado pela Procuradoria Geral da República devido a mais um recurso da defesa de Lula, dessa vez contra a rejeição de outro recurso, pelo ministro Felix Fischer, do STJ.
Fischer recusara um recurso para anular a condenação de Lula no caso da propina do triplex de Guarujá.
Nesse caso, o recurso de Lula ao STJ era manifestamente incabível – como observou o ministro Felix Fischer, a defesa de Lula queria que o STJ reexaminasse as provas do processo da propina do triplex.
Porém, isso é exatamente o que um “recurso especial” (um recurso ao STJ) não pode fazer. A segunda instância (nesse caso, o TRF-4) é a última a examinar as provas, isto é, o mérito do caso – e Lula, nessa instância, foi condenado a 12 anos e um mês de cadeia.
O STJ apenas examina se, do ponto de vista das leis ordinárias (ou seja, fora a Constituição), os procedimentos dos julgamentos foram adequados, se respeitaram as normas estabelecidas para os processos.
Por essa razão, o ministro Felix Fischer recusou o recurso de Lula.
A defesa, então, entrou com um habeas corpus contra a decisão do ministro.
O abuso desse instrumento – que destina-se a proteger o cidadão de alguma restrição ilegal ao direito de ir e vir – é uma constante no caso de Lula. Usa-se habeas corpus quase que para qualquer coisa, ocupando indevidamente o tempo da Justiça, como em um moto contínuo judicial.
As alegações são sempre as mesmas. Por isso, a procuradora reafirma, em seu documento ao STJ:
“É preciso destacar que a execução provisória da pena privativa de liberdade não caracteriza excesso do Estado. A prisão do réu condenado pelo tribunal observa o duplo grau de jurisdição, ainda que pendentes de julgamento recursos para o STJ e STF. Esta não é uma medida desproporcional e excessiva, hipótese em que ela poderia ser considerada inconstitucional por ofensa à proporcionalidade em vertente negativa, da qual resultam deveres de abstenção.”
Lula quer, outra vez, o direito de não cumprir a pena à qual foi condenado, até que todos os recursos para o STJ e o STF sejam julgados.
O que significa – como significou, nos sete anos em que esse entendimento vigorou no STF – que basta ter dinheiro, ou usar o dinheiro que se roubou, para não ir para a cadeia (v. Presidente do STF derruba liminar que soltava Lula; para um resumo do conjunto dessas questões jurídicas, v. Por que a prisão após a segunda condenação é legal, justa e necessária).
Sobre a cerebrina alegação de que o triplex de Guarujá não é de Lula porque não está em seu nome, observou a procuradora geral:
“… o fato de o mencionado imóvel ter sido destinado indevidamente a Lula, apesar de não ter passado formalmente à sua posse ou propriedade, já é suficiente a configurar o ‘recebimento de vantagem indevida’, nos termos do art. 317 do Código Penal. Note-se, aliás, que se está diante de situação em que a posse ou propriedade do mencionado imóvel foi dissimulada, o que levou à condenação do paciente também pelo crime de lavagem de ativos.”
Por fim, contestando os ataques à decisão do ministro Felix Fischer, afirmou Raquel Dodge:
“Ao contrário do quanto defendido na presente impetração, agiu com o devido acerto o Ministro Relator, negando seguimento a recurso manifestamente improcedente ou contrário à súmula ou à jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou dessa Colenda Corte Superior.
C.L.