“Os governadores, prefeitos de grandes capitais e de pequenas cidades ficaram totalmente desamparados do apoio do governo federal. É uma realidade inequívoca que está documentada em várias cartas que nós encaminhamos ao presidente [da República]”, disse Witzel
O ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, declarou, nesta quarta-feira (16), em depoimento à CPI da Covid-19, no Senado, que as verbas federais destinadas a custear ações de enfrentamento à pandemia “vieram em cima do laço” — isto é, quase no limite do que seria um prazo aceitável. No caso, para o Estado do Rio de Janeiro.
Witzel relatou que, em face do atraso para injeção de recursos do Ministério da Saúde, o Executivo estadual chegou a cogitar a possibilidade de sugerir cortes nos salários do funcionalismo público.
“Demorou o auxílio emergencial, demorou os recursos que foram encaminhados para completar o orçamento dos Estados. Nós tínhamos até imaginado a possibilidade de redução do salário de servidores para poder fazer frente ao controle da pandemia”, disse à CPI.
“Os recursos vieram, em cima do laço, e conseguimos dar continuidade, mas até lá tivemos dificuldade”, emendou o ex-governador.
Em valores absolutos, o Rio de Janeiro recebeu R$ 7,8 bilhões e foi o quarto Estado mais beneficiado. O primeiro foi São Paulo (R$ 20 bilhões), depois Rio Grande do Sul (R$ 8,4 bilhões) e, seguida, Minas Gerais (R$ 7,9 bilhões).
HABEAS CORPUS
O ex-governador fluminense comparece, nesta quarta-feira, à comissão na condição de testemunha convocada. Ele optou por não fazer uso do direito ao habeas corpus deferido na terça-feira (15) pelo ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal).
A decisão da Corte autorizava o depoente a se ausentar, sob argumento de que ele teria o direito de “não produzir provas contra si mesmo”, pois já é investigado pelo MPF-RJ (Ministério Público Federal do Rio).
RECURSOS INSUFICIENTES
Witzel também declarou que o dinheiro repassado a Estados e municípios não foi suficiente. Afirmou ainda ter manifestado incômodo com a demora para aprovação do auxílio emergencial (socorro financeiro criado durante a pandemia para suprir queda abrupta de renda).
“Você pede para que fiquem em casa porque é necessário e a população não tem uma resposta do auxílio na mesma agilidade que as medidas de combate a pandemia eram acionadas. Evidentemente você tem dificuldade de conduzir a pandemia”, pontificou à CPI.
GOVERNADORES FICARAM “DESAMPARADOS”
Witzel relatou que, de acordo com entendimento dele, prefeitos e governadores ficaram “desamparados” e sem canal de diálogo com a União durante a pandemia do coronavírus.
O depoente, cujo mandato foi cassado devido às denúncias de corrupção na área da saúde, criticou o presidente Jair Bolsonaro, a quem ele se opõe no cenário político.
Na versão do depoente, o chefe do Executivo federal “politizou” a pandemia e criou “narrativas” de enfrentamento aos governos locais por divergências em relação a temas como o isolamento social, por exemplo.
“Os governadores, prefeitos de grandes capitais e de pequenas cidades ficaram totalmente desamparados do apoio do governo federal. É uma realidade inequívoca que está documentada em várias cartas que nós encaminhamos ao presidente [da República]”, disse Witzel.
“Fizemos várias reuniões suplicando ao presidente da República que nos atendesse, que pudéssemos conversar para encontrar soluções em conjunto, soluções que outros países encontraram.”
Segundo Witzel, nas poucas reuniões que teriam ocorrido com Bolsonaro, houve percepção coletiva de que a chefia do governo federal se empenhava em politizar o assunto e transformar governadores em rivais. “[O governador de São Paulo João] Doria foi frontalmente atacado de forma descortês”.
AÇÃO CONJUNTA NÃO ACATADA
Witzel disse ainda ter feito pedidos de ação conjunta entre o Executivo federal e os governos estaduais, o que, segundo ele, não foi acatado. O depoente também defendeu a ação de governadores.
“Desde o início do controle da pandemia, buscamos tomar as medidas de acordo com as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde)”.
O ex-governador usou o espaço de fala na abertura da audiência da CPI da Covid para se defender das acusações pelas quais teve o mandato cassado. Na versão dele, o impeachment foi resultante de uma suposta tentativa de perseguição política relacionada às investigações do caso Marielle.
“Tudo isso começou porque eu mandei investigar sem parcialidade o caso Marielle. Quando foram presos os dois executores da Marielle, o meu calvário e a perseguição contra mim (foram) inexoráveis”, assinalou.
M. V.