
Centenas de juízes do trabalho, presentes no 19º Congresso Nacional da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), em Belo Horizonte, aprovaram uma série de decisões no que se refere à aplicação da reforma trabalhista (Lei n. 13.467/2017), combatendo normas consideradas inconstitucionais e que atentam aos direitos dos trabalhadores.
Diante das indefinições e falta de regulamentação da nova lei, os juízes definiram diretrizes, reafirmando que as interpretações jurídicas deverão seguir a Constituição, uma vez que, segundo a entidade, a nova lei desrespeita diversos pontos da Carta Magna, e que não deverão ser aplicados.
Entre as definições está a de que a reforma trabalhista não será aplicada para processos ajuizados antes da sua entrada em vigência, em 11 de novembro de 2017. Conforme o argumento apresentado pelos juízes, “a Lei n. 13.467/2017 alterou significativamente o Direito Material do Trabalho, incorrendo em diversas inconstitucionalidades”. De acordo com a Associação, com o advento da Medida Provisória n. 808/2017, estabeleceu-se que “[o] disposto na Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, se aplica, na integralidade, aos contratos de trabalho vigentes” (art. 2º). “A aplicação da regra era, igualmente, de duvidosa constitucionalidade, notadamente à vista da garantia constitucional do direito adquirido”.
“Ora, se o art. 2º da MP 808 dispunha sobre a aplicação imediata das normas da Lei n. 13.467/2017 aos contratos individuais de trabalho em vigor no dia 11/11/2017, parece certo que, ‘a contrario sensu’, a perda de eficácia do art. 2o, com a caducidade da MP [A MP perdeu a validade no dia 23 de abril], importa em reconhecer a prevalência do “status quo ante”, que só pode ser a aplicação das normas da Reforma Trabalhista apenas aos contratos individuais de trabalho celebrados a partir de 11/11/2017”, conclui a entidade.
‘Trabalho intermitente não pode ser admitido por violar lei do mínimo’
Outro ponto aprovado pelos juízes foi o de que “não se pode admitir a validade de contrato de trabalho que não atenda ao sustento mínimo do trabalhador, violando a sua dignidade, a Constituição e a Convenção 95 da OIT sobre a proteção ao salário”.
De acordo com o documento aprovado, o trabalho intermitente “viola o art. 4º, “b” da Convenção 95 da OIT sobre a proteção do salário (justo e razoável), a contratação por trabalho intermitente, quando não respeitado o salário mínimo vigente ou o piso salarial profissional ou previsto em norma coletiva da categoria, com o pagamento das férias, 13º salário e FGTS de forma proporcional. A estipulação de remuneração por hora, com violação ao salário mínimo e ao piso profissional ou salarial da categoria deve ser considerada nula, para que seja observado salário mínimo, justo e razoável, como prevê a Constituição (artigo 7º, IV, V e VII) e a Convenção 95 da Organização Internacional do Trabalho, já que a valorização do trabalho humano requer assegurar a todos a existência digna (art. 170 da Constituição) e o trabalho não é mercadoria, mas fonte de dignidade, devendo o salário assegurar condições de existência convenientes”, afirma a Anamatra.
A Associação de Juízes também se posicionou sobre a nova regra da lei que obriga, em processo judicial, a parte vencida em demanda trabalhista a pagar os advogados da parte vencedora, os chamados honorários sucumbenciais.
Os magistrados decidiram, por exemplo, que o regime de sucumbência em honorários advocatícios não pode ser aplicado aos processos ajuizados anteriormente à vigência da Lei; que não está de acordo com a Constituição Federal exigir do reclamante, beneficiário da justiça gratuita, o pagamento de custas para ajuizamento de nova ação em caso de arquivamento da anterior; que o autor de ação, que esteja desempregado, tem direito à justiça gratuita, não importando o valor de seu último salário; que é inconstitucional que o crédito trabalhista [valor que alguém tem a receber na Justiça após ganhar o processo] seja utilizado para pagamento dos honorários dos advogados da reclamada; entre outros pontos.
Os juízes também apontaram que é inconstitucional “qualquer norma que blinde o conteúdo dos acordos e convenções coletivas de trabalho da apreciação da Justiça do Trabalho”, e autoritária e antirrepublicana qualquer tentativa, seja midiática, política ou administrativa, que confira ao juiz do trabalho o dever de interpretar o texto da reforma trabalhista de maneira literal.
Outro ponto debatido pelos juízes foi o fim da obrigatoriedade do imposto sindical. Nessa questão, a entidade também denuncia inconstitucionalidade, uma vez que trata-se de caráter tributário. “Só seria constitucional se tivesse acontecido a partir de uma Lei complementar, e não Lei ordinária, como aconteceu”, afirma.
O Congresso é o maior espaço deliberativo da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), que reúne 90% dos juizes trabalhistas do Brasil. O tema foi “Horizontes para Magistratura: Justiça, Trabalho e Previdência”, e a partir dele foram construídas quatro comissões temáticas, que discutiram mais especificamente o papel que os magistrados devem cumprir no próximo período.
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