“Ucrânia estimula hostilidade contra correspondentes”, registra matéria do portal UOL, assinada por André Liohn, desde Kiev, que confirma postagem de porta-voz orientando a atacar “pessoas com colete de PRESS”
O regime de Kiev vem açulando seus milicianos contra os jornalistas estrangeiros, segundo matéria do portal de notícias UOL, assinada desde Kiev pelo jornalista André Liohn.
A denúncia é fundamentada por uma postagem de um porta-voz das forças armadas ucranianas chamando a atacar “qualquer pessoa que estivesse em área controlada pelo Exército russo, mesmo que estivesse usando uma identificação de jornalista”.
“Caros defensores do nosso povo! Dirijo-me a você com um grande pedido. Se você vir uma pessoa vestindo um colete com a escrita PRESS, não são jornalistas reais porque não são credenciados em nosso Exército. Estes são apenas propagandistas perigosos. O título de jornalistas não se aplica a eles. Eles devem ser atacados”, orienta o assessor de imprensa das Forças Armadas Ucranianas em Kiev, Vladmir Fito, em suas mídias sociais.
Assim, em meio às notícias sobre jornalistas mortos ao fazerem a cobertura da operação militar russa em curso na Ucrânia – o que a mídia ocidental costumeiramente atribui “aos russos”-, a matéria apresenta outro enfoque de onde vem partindo o perigo para os correspondentes de guerra.
Explicitamente. “’Devem ser atacados’: Ucrânia estimula hostilidade contra correspondentes” é o título da matéria.
COLETES ‘PRESS’ VIRAM CHAMARIZ
Em uma semana, já são cinco os jornalistas mortos. Liohn observa, ainda, que os milicianos ucranianos que controlam inúmeras acessos à capital “carregam consigo uma desconfiança intrínseca contra nós, jornalistas”.
A manifestação do assessor de imprensa das forças armadas ucranianas – assinala a matéria – “vem exatamente depois da morte de três jornalistas estrangeiros em apenas uma semana em Kiev. No domingo (13), o fotógrafo e documentarista Brent Renaud foi morto em Irpin quando cruzou um check point com um motorista ucraniano tentando documentar a fuga de civis da cidade de Bucha. O fotógrafo colombiano-americano, Juan Arredondo, que também estava no carro, sobreviveu”.
E acrescenta: “Apenas dois dias depois, dois jornalistas que trabalhavam para a Fox News, o cinegrafista Pierre Zakrzewski [foto principal desta matéria] e a produtora Oleksandra Kuvshinova, foram mortos a poucos quilômetros de distância de onde Brent e Juan foram atacados”.
Em suma, “coletes com a escrita PRESS” viraram chamariz para ataques.
Como observa Liohn, “militares do Exército e policiais ucranianos, até agora, têm sido os mais previsíveis e seguros. Eles são profissionais, seguem ordens claras e especificas de seus comandantes e por isso, não perdem nem tempo nem energia com jornalistas que estão ali apenas para fazer o trabalho de produzir reportagens a respeito do que está acontecendo na Ucrânia”.
Um raciocínio muito ponderado e claro, que igualmente deveria ser aplicado aos militares russos, igualmente profissionais e com ordens claras de seus comandantes.
DESCONFIANÇA INTRÍNSECA
Portanto, e também é essa a percepção manifestada pelo autor, é dos milicianos, mais despreparados e sem um comando claro, e que estão em inúmeros acessos à capital ucraniana, que parte o perigo maior para os jornalistas estrangeiros. Milicianos que “carregam consigo uma desconfiança intrínseca contra nós, jornalistas” e que “são os que mais oferecem risco para aqueles que precisam passar pelo território que controlam”.
Como retrata o autor, as milícias são “menos organizadas, sem comando claro, são motivadas muitas vezes pelo desejo de vingança contra a violência cometida pela força agressora russa. Homens, jovens e adultos, tirados de suas casas e trabalhos, separados contra vontade de suas famílias e pessoas amadas, de suas rotinas, forçados a deixarem de lado seus objetivos, a pegarem armas que muitas vezes não sabem ou gostariam de usar,”.
Segundo o autor, essa percepção hostil de parte desses milicianos resultaria de que, para eles, “nossas reportagens, nossas fotos e nossos vídeos representam um risco em potencial contra suas vidas”. Eles temem que “involuntária ou deliberadamente estejamos compartilhando informações estratégicas que poderão ser usadas pelo Exército russo durante um ataque”.
Preocupação que Liohn considera “até certa medida” como “legítima”, mas adverte que o que deveria ser um cuidado está “se transformando numa paranoia que ameaça a segurança de jornalistas trabalhando na Ucrânia”.
Para ele, outro fator em jogo é a expectativa – de parte dos milicianos – de que os jornalistas estrangeiros “devem se ‘sensibilizar’” e tomar partido dentro do conflito.
VOLKSTURMM PÓS-MODERNA
Nem todos compartilham essa mesma avaliação sobre essas milícias ucranianas recém formadas, que muitos consideram uma versão pós-moderna das “volksturmm” [milícia popular] dos últimos dias do hitlerismo.
Notícias de Kiev dão conta de que o regime distribuiu 30.000 armas aos “mais dispostos” – o que em geral significa os de maior vínculo com ultranacionalistas ou neonazista de carteirinha -, o que se traduziu em confrontos nas ruas de Kiev entre bandos rivais e até execuções de gente que estava no local errado, na hora errada e foi considerado um “amigo dos russos”.