“Antes de tudo, temos que defenestrar Bolsonaro”, disse o economista Nilson Araújo em debate na Federação Interestadual dos Metalúrgicos
Para o economista Nilson Araújo de Souza, da Fundação Maurício Grabois, de 1930 a 1980 o Brasil construiu uma das indústrias mais modernas do mundo. “O principal de nossas exportações chegou a ser da indústria de transformação”, lembrou. Em 1980, ela era quase 30% do PIB. Se incluirmos a Construção Civil e a extrativa, chegaremos a 44%. Hoje, a primeira está em 11% e a segunda não atinge 20%”.
Para o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, ex-diretor técnico do DIEESE e assessor do Fórum das centrais sindicais, “a indústria brasileira tinha o vigor que a China tem hoje”. Afirmou que “vivemos uma regressão industrial severa”. Segundo Clemente, “a recuperação não será simples”. Considera que temos uma oportunidade agora: “o processo eleitoral abre uma brecha para colocarmos o papel do Estado na condução de uma estratégia de desenvolvimento”.
O debate aconteceu de forma virtual no dia 18 de janeiro, promovido pela FITMETAL, Federação Interestadual dos Metalúrgicos. No dia seguinte, 19 de janeiro, as centrais convocaram a CONCLAT, Conferência Nacional das Classes Trabalhadoras, para discutir uma proposta de programa nacional de desenvolvimento. Aurino Pedreira, vice-presidente da Federação, disse que o objetivo é formular propostas para reerguer a indústria nacional.
Segundo Clemente, o Brasil não tem um projeto nacional de desenvolvimento porque. “Com ausência de um projeto”, o que o neoliberalismo pretende é empurrar o país para trás, de volta para uma economia agrário-exportadora. Ao contrário, a industrialização do país exige um plano para o desenvolvimento, um Estado atuante e forte
Conforme avaliou Nilson, “Getúlio Vargas no primeiro e segundo governo (de 1930 a 1945 e depois de 1950, até seu martírio, em 1954) consolidou a indústria de bens de consumo popular, estabeleceu as bases da indústria pesada — com a Petrobrás. Siderúrgica de Volta Redonda, mineradora Vale do Rio Doce, projeto da Eletrobras. Fábrica Nacional de Motores — e fortaleceu o mercado de consumo, com uma legislação trabalhista das mais avançadas do mundo, a CLT, a instituição de um salário mínimo capaz de garantir o sustento de uma família de quatro pessoas e uma forte organização sindical”.
“No governo de JK, foi a vez da indústria de bens duráveis. Mas ele cometeu um erro: poderia ter continuado a implantação da indústria de duráveis sob controle nacional, cujas bases haviam sido assentes por Getúlio com a Fábrica Nacional de Motores, mas optou por montá-la sob controle estrangeiro, o que continuou com a ditadura de 1964. Nilson afirmou que no 2º PND, do governo Geisel, durante o período de ditadura militar, o estabelecimento de uma indústria moderna praticamente se completou, com a substituição de importações no setor de máquinas, equipamentos e insumos intermediários, sob controle nacional”, considerou.
“Isso ocorreu porque Getúlio inaugurou um período em que se somou a ação do Estado nacional (protegendo, financiando, realizar compras governamentais da indústria) com o fortalecimento do mercado interno mediante ao aumento do poder de compra do trabalhador com a legislação trabalhista”, continuou.
Mas, para o economista, “de 1980 para cá houve uma devastação da indústria brasileira”[…] “A prioridade do Estado nacional deixou de estar voltado para a produção, para se concentrar no pagamento de juros, primeiro da dívida externa, depois dos empréstimos do FMI, nos governos Figueiredo e Sarney, com o intervalo do Plano Cruzado. Todo esforço: saldo comercial, corte nos salários, no investimento, privatizações. Espremendo a tudo e a todos. Tudo isso, para pagar juros. Assim foi a chamada década perdida”.
E pontuou: “FHC diminuiu as tarifas de importação e valorizou o real, 1 dólar, 1 real. Tornou mais caro o produto nacional e mais barato o importado. Foi o estado subsidiando a indústria estrangeira. Protecionismo às avessas, o assassinato da indústria nacional”.
“O famigerado tripé macroeconômico atravessou todos os governos desde a falência do Plano Real em 1999, mas a âncora cambial do Real já cumpria esse mesmo papel. De FHC a Bolsonaro. O objetivo foi o mesmo, valorizar a moeda com metas de inflação superestimada e juros altos para atrair o capital especulativo estrangeiro. São 720 bilhões de dólares estrangeiros especulando no país, mas que o dobro das nossas reservas de 362 bilhões de dólares”, argumentou.
De acordo com Nilson “antes de tudo, temos que defenestrar Bolsonaro”.
“Precisamos de um programa que tire o país da crise, de reindustrialização do Brasil”, declarou. “Temos 30 milhões de desempregados e subempregados. O Estado deve fortalecer o mercado de consumo nacional”. Nilson propõe dobrar o salário mínimo e restabelecer os direitos previstos na CLT”.
“O Estado deve voltar a alavancar o investimento, proteger nossas empresas contra a invasão estrangeira, garantir o financiamento e as compras governamentais às empresas nacionais”. Nilson sustentou ser necessário voltar a distinguir na Constituição a empresa nacional da empresa estrangeira que se instala no país. “FHC borrou essa diferença”. O economista propõe remontar o aparato das estatais, da Petrobras, da Eletrobras e da Vale do Rio Doce. Investir em ciência e tecnologia, universidades. Criar centros de pesquisa e produção, como a Embrapa”.
“O Estado deve voltar a alavancar o investimento, proteger nossas empresas contra a invasão estrangeira, garantir o financiamento e as compras governamentais às empresas nacionais”
“Devemos criar complexos industriais da saúde, da defesa da tecnologia da informação, da energia, gás e petróleo, do agroindustrial, fornecimento de insumos e equipamentos, navios, aeronáutica”, disse Nilson.
Em sua avaliação, dinheiro tem! Argumentou que o Brasil envia 900 bilhões de dólares de juros, lucros e dividendos. “Aumentar os juros de 2% para 9,25%, como fez agora Bolsonaro, significou para o Tesouro Nacional um gasto adicional de 360 bilhões de reais. A isenção fiscal sem critérios significa que o Tesouro deixa de arrecadar, segundo a Anafisco, 457 bilhões por ano”.
Segundo Clemente, “a industrialização tem por objetivo o emprego de qualidade e o incremento do salário. O salário e a renda crescendo sustentarão a demanda. Os sindicatos devem ter uma ação propositiva numa estratégia de desenvolvimento. Têm a tarefa de colocar o debate público num espaço tripartite, discutir a inovação tecnológica e a médio prazo, a redução da jornada de trabalho”.
Clemente considera que com Estado forte haverá investimento privado, mercado de consumo robusto e uma economia que apresenta consumo do governo e inserção internacional.
O assessor do Fórum das centrais pensa que “tendo investimento as micro, pequenas e médias empresas vão crescer. São na maioria empresas nacionais, orientadas pelos vetores de desenvolvimento”.
Assista à entrevista completa em: https://www.facebook.com/watch/live/?ref=watch_permalink&v=3013758555582720
CARLOS PEREIRA