Pesquisa com proxalutamida para tratamento de covid-19 foi suspensa pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) que solicitou a investigação das condições em que 200 pessoas morreram em Manaus, durante a pior fase da pandemia
A revista científica Frontiers in Medicine publicou uma retratação que desautorizou a publicação de pesquisa com proxalutamida para tratamento de covid-19 que matou mais de 200 pessoas no Amazonas e foi suspensa pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), órgão vinculado ao Ministério da Saúde.
“Logo após a publicação, nosso escritório recebeu cartas de reclamação questionando a integridade do artigo, após o que uma manifestação de preocupação foi publicada e uma investigação completa foi conduzida, de acordo com nossas políticas e diretrizes do COPE”, inicia a revista na retratação.
“A investigação constatou que as alegações feitas nas conclusões não foram adequadamente apoiadas pela metodologia do estudo. Em particular, conforme confirmado por um especialista externo, o processo de alocação para tratamento e controle não foi suficientemente aleatório”, considerou a Frontiers in Medicine que informou: “esta retratação foi aprovada pelos editores-chefes da Frontiers in Medicine e pelo editor-chefe executivo da Frontiers. Os autores (da pesquisa) discordam dessa retratação”.
INVESTIGAÇÃO
O tratamento com proxalutamida faz parte de um procedimentos de pesquisa realizado no Amazonas que foi questionado pela Comissão Nacional de Ética do Conselho Nacional de Saúde (Conep), após indícios de irregularidades. A Conep enviou um pedido à Procuradoria Geral da República (PGR), para que investigue as condições em que a pesquisa com proxalutamida foi aplicada. De acordo com o documento, pelo menos 200 mortes foram reportadas durante o estudo.
A pesquisa foi suspensa pela Conep no final de maio de 2021, porém mesmo depois da suspensão os pesquisadores enviaram à comissão um pedido para registrar outros centros de pesquisa, desta vez em Santa Catarina. Além do estudo irregular no Amazonas, o mesmo grupo realizou um ensaio clandestino com o remédio em um hospital militar de Porto Alegre, conforme consta em nota pública do CNS.
A Conep entrou com um pedido para que a Procuradoria Geral da República (PGR) investigue as circunstâncias da pesquisa. De acordo com o texto apresentado no pedido, a investigação foi solicitada porque durante o estudo houve um alto índice de eventos adversos graves, inclusive, com registros de mortes.
31% DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA MORRERAM
A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa constatou que o tratamento de covid-19 com a droga proxalutamida resultou em 31% mortes dos pacientes que participaram do estudo no Amazonas. Teriam sido 200 num universo de 645 pacientes incluídos no estudo. Foram mortes por falência renal ou hepática (fígado).
A denúncia sobre a morte de 200 voluntários de pesquisa clínica com a proxalutamida feita no Amazonas foi considerada por pesquisadores da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) como uma “violação aos direitos humanos” e um dos “mais graves e sérios episódios de infração ética” da história da América Latina.
A Conep elencou também o que considera irregularidades no uso da proxalutamida no Amazonas:
• A pesquisa não apresentou os termos de consentimento dos pacientes para o uso do medicamento.
• Não houve treinamento da equipe em boas práticas clínicas.
• Não houve descrição detalhada do ciclo de uso do medicamento experimental.
• Os documentos do comitê de monitoramento de dados são inconsistentes.
• Os testes aconteceram ao mesmo tempo em que um processo na Conep analisava sua nulidade.
A Conep diz que o responsável pela pesquisa não informou quantas mortes foram no grupo placebo e quantas dentre os que receberam o medicamento verdadeiro. Por falta de explicações, a Conep pediu e conseguiu que o Ministério Público Federal (MPF) investigue o que considera “maquiagem” dos resultados da pesquisa.
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