Os reitores da Universidade do Estado do Rio (Uerj), da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) e da Fundação Centro Universitário Estadual da Zona Oeste (Uezo) denunciam o governo do Estado do Rio de Janeiro por não repassar verbas do orçamento que definidas por lei deveriam ser destinadas às instituições públicas de ensino.
Os administradores são diretamente atingidos pelo descumprimento de uma lei estadual, aprovada há dois anos. “Nós temos R$ 54 milhões em dívidas com prestadores de serviços. Temos dívidas que não estão sendo pagas. Certamente que se esse dinheiro já fosse administrado pela universidade, essas dívidas já estariam pagas”, afirmou o reitor da Uerj, Ruy Garcia Marques.
A Uenf acumula dívidas de R$ 5 milhões. O reitor da instituição, Luis Passoni afirmou que falta de dinheiro principalmente para recompor salários. “Nós estamos há mais de quatro anos sem nenhuma reposição em termos inflacionários, então o salário do pessoal está bastante defasado”, exemplificou Passoni.
Já Maria Cristina de Assis, reitora da Uezo, cobrou maior autonomia financeira para quitar dívidas com fornecedores.”Hoje temos autonomia para a realização das contratações, no entanto não podemos autorizar diretamente os pagamentos aos fornecedores, visto que é a [Secretaria de] Fazenda que libera o pagamento”, explicou a reitora.
Os reitores afirmam que sem autonomia ficam impossibilitados de negociar preços, investir e fazer planejamentos a longo prazo para as universidades.
O governo sob comando de Wilson Witzel (PSC) afirmou em nota, que o texto da lei reivindicada pelos reitores menciona “dotação orçamentária” e que “cumpre-se integralmente os termos da Emenda Constitucional” 71.
A Emenda Constitucional citada pelo governo Witzel foi aprovada em 2017 pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e garante autonomia financeira e repasse do orçamento às universidades em 12 parcelas mensais, que são chamados duodécimos.
O texto aprovado prevê a implementação do repasse direto às instituições de ensino seria escalonada. Em 2018, o governo deveria repassar, via duodécimos, no mínimo 25% do orçamento das universidades. Em 2019, 50% e, a partir de 2020, 100%.
Na época em que a lei foi aprovada, os gestores de universidades reclamavam da falta de insumos básicos. Além disso, bolsas e salários estavam atrasados, fornecedores não recebiam e progressões e promoções estavam paralisadas. Hoje, apesar de os salários estarem sendo pagos pelo caixa único do estado, a autonomia financeira garantida por lei não é aplicada.
“É importante que a gente consiga implementar a emenda constitucional, a universidade passe a receber os duodécimos e tenha uma maior autonomia de gestão financeira e orçamentária”, explicou Passoni, da Uenf.
O deputado Luiz Paulo (PSDB), um dos autores da lei, afirma que a prática do governo não obedece ao principal objetivo da proposta que é dar autonomia financeira às universidades.
“O reitor tem que ser autônomo para acertar e para errar na sua administração. E aí sim, merecer a devida fiscalização. Então, o governo está dando uma ótica que não nos convence”, disse o tucano.
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ) instaurou um Inquérito Civil Público para cobrar de Witzel uma resposta sobre a situação dos repasses de duodécimos.
De acordo com o MP, depois que se manifestarem o poder público e as universidades, será analisado a forma de garantir “o respeito às normas legais”.
GESTÃO
A gestão financeira das universidades funciona da seguinte forma: o estado, junto à Alerj, aprova um orçamento e define quanto cada universidade recebe. Os salários – maior percentual dos gastos das instituições de ensino – são pagos diretamente pelo governo.
Qualquer outro serviço ou investimento a universidade precisa informar ao prestador daquele serviço que ela possui esse valor no orçamento, e que ele poderá entregar o serviço contratado para, posteriormente, cobrar a dívida do governo.
A Secretaria de Fazenda que decide quando vai realizar de fato aquele pagamento. Esse processo não permite que a universidade planeje seus gastos. Impede também, argumentam os gestores, que a instituição negocie melhores valores, já que o prestador do serviço não sabe ao certo quando irá receber.
Essa estrutura deixa as universidades dependentes da vontade do secretário de Fazenda que pode priorizar outros pagamentos e deixar para depois as universidades.
LOA
A Lei Orçamentária Anual (LOA) 2019 do Rio determina o tamanho do orçamento das três universidades estaduais.
Este ano o valor ficou aproximadamente, R$ 8 bilhões com educação. Desse total, a Uerj teria direito a R$ 1,270 bilhão; a Uenf teria R$ 300 milhões; e a Uezo R$ 38 milhões.
Esses valores são para o pagamento de salários e para o custeio, que são as despesas com bolsas, manutenção, serviços diversos (segurança, limpeza, restaurantes) e investimentos.
DÍVIDAS ACUMULADAS
O governo não planejou o pagamento das dívidas acumuladas. Só a Uerj deve R$ 54 milhões.
Segundo explicou o reitor da instituição, Ruy Marques, a situação seria diferente se o dinheiro fosse administrado pela própria instituição, como determina a lei. “É muito importante que a universidade administre os seus recursos. Do jeito que é feito hoje, nós perdemos em economicidade e eficiência”, explicou Marques.
Criada em 2005, a Uezo, a menor das três universidades, já registra um passivo de R$437 mil, o que equivale a cerca de 12% do total de seu orçamento para 2019.
Sobre as dívidas, o governo Witzel diz que “o estado detém R$ 15 bilhões em restos a pagar e orçamento deficitário de R$ 8 bilhões”. Segundo a Fazenda, o Poder Executivo estuda uma forma para quitar os passivos do RJ.
“Se você pega as universidades nos Estados Unidos, na Europa, no Japão e na Coreia, todas elas têm um alto grau de autonomia de gestão financeira”, afirmou o reitor da Uenf.
Nas universidades de São Paulo, como a USP, Unicamp e UNESP a autonomia é maior. “Elas recebem uma porcentagem da arrecadação, depositada em conta própria na forma de duodécimos, e a partir daí tem total autonomia para fazer a gestão dos recursos”, explicou.