Roubos e furtos de celulares crescem 7% no centro de SP, após suposta dispersão da Cracolândia

Foto: Reprodução

Quatro meses após a dispersão dos usuários de drogas que ocupavam a rua dos Protestantes, ponto histórico da cracolândia na região da Santa Ifigênia, roubos e furtos de celulares mantiveram tendência de alta nos distritos policiais do centro de São Paulo. Entre maio e setembro deste ano, os 3º DP (Campos Elíseos) e 77º DP (Santa Cecília) registraram 3.468 ocorrências desse tipo, um aumento de 7% em relação ao mesmo período de 2024, quando foram contabilizados 3.255 casos.

Os números nos dois distritos superam a alta média registrada na capital, que ficou em 3% – passando de 67.136 para 68.989 ocorrências, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP).

A dispersão do fluxo de usuários na rua dos Protestantes ocorreu na segunda quinzena de maio, após meses de ocupação. A ação fez parte de uma estratégia do governo do estado, que ampliou a rede de atendimento a dependentes químicos para toda a região central. O processo de redução da aglomeração havia começado em março, após um incêndio em um cortiço na rua dos Gusmões, local apontado como ponto de distribuição de drogas.

Apesar da dispersão, os furtos – especialmente de celulares – seguiram em alta. Somente no 3º DP, as ocorrências de furto aumentaram 15% em maio, mês da desmobilização. No conjunto dos dois distritos, os roubos caíram 22% (de 1.672 para 1.304 casos) entre maio e setembro, na comparação com 2024, mas os furtos subiram 2%.

O governo estadual e a prefeitura divulgaram quedas em indicadores gerais de criminalidade no centro após a dispersão, sem detalhar os números específicos de celulares. Em novembro, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirmou que a cracolândia “não existe mais”, ainda reconhecendo a permanência do consumo de drogas nas ruas.

Para Guaracy Mingardi, analista criminal e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a manutenção dos crimes contra celulares se deve à atuação de criminosos especializados, sem ligação direta com a cena aberta de drogas. “Eles moram em pensões do centro e têm acesso ao ecossistema da receptação”, explicou.

Já o tenente-coronel Rodrigo Garcia Villardi, coordenador geral do Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) da SSP, atribui parte do aumento à maior circulação de pessoas na região após a dispersão. “Metade dos furtos no centro ocorre em locais fechados, como estações de metrô, ônibus e comércios. Com mais movimento, é natural haver variação”, afirmou. Villardi também citou a atuação da “gangue da bicicleta”, responsável por cerca de um terço dos casos na área.

A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) não comentou os dados recentes, mas destacou que, entre 2022 e 2025 (considerando maio a setembro), houve redução de até 42% nas ocorrências de roubos e furtos na região. A administração municipal atribuiu os resultados ao trabalho integrado com o estado, incluindo ações de saúde, assistência social e reforço na segurança.

Enquanto isso, a SSP mantém monitoramento específico nos distritos do centro, estabelecido em 2023 em parceria com a prefeitura, para coordenar operações conjuntas.

PULVERIZAÇÃO DA CRACOLÂNDIA

A declaração do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) sobre o fim da Cracolândia, proferida em novembro, é contestada pela realidade observada nas ruas de São Paulo. Embora o fluxo histórico na região da Luz tenha se dissipado, a capital paulista assistiu a uma pulverização do uso de crack para dezenas de bairros, com ao menos dois grandes fluxos ainda ativos nas imediações do centro e a formação de novas concentrações em regiões centrais e nobres.

A dispersão da rua dos Protestantes, em maio, não eliminou a presença de usuários e traficantes, mas os redistribuiu pelo território urbano. A Secretaria de Segurança Pública mapeou a existência de pelo menos 72 pontos de uso de crack a céu aberto, espalhados por 47 bairros da capital. Entre os locais que passaram a conviver com novas aglomerações estão:

Região Central e Expandida:

Praça Marechal Deodoro / Santa Cecília: Área próxima ao Elevado Presidente João Goulart (Minhocão), tornou-se uma das principais concentrações.

Bela Vista: Novo fluxo consolidado no bairro.

Avenida Paulista: Moradores relatam ponto na Praça Marechal Cordeiro de Farias.

Avenida Pacaembu e Favela do Moinho: Ocupação após as ações no centro.

Jaraguá (Av. Amador Aguiar): Barracos montados na calçada.

Liberdade, Mooca e Vila Leopoldina: Também identificaram pontos de uso.

Outras Regiões:

Zona Norte: Tremembé.

Zona Leste: Belém e Piqueri.

Zona Sul: Chácara Santo Antônio.

Região Metropolitana: Diadema.

O fenômeno descrido como uma “Cracolândia pulverizada” mostra que a política de dispersão do fluxo principal não resolveu a questão de fundo, deslocando-a para outras comunidades. Usuários continuam circulando da periferia aos bairros mais valorizados, e traficantes operam livremente em locais como debaixo do Elevado Presidente João Goulart.

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