Discurso de Putin proclama término do “mundo unipolar” sob os EUA. Novos mísseis – que ninguém ainda tem – rompem tentativa de cerco. “Ninguém queria nos ouvir. Ouçam-nos agora”
Continua repercutindo o anúncio, na semana passada, pelo presidente russo Vladimir Putin, de que a Rússia testou e está colocando em operação novos sistemas de mísseis hipersônicos ultramanobráveis, que tornam peça de museu a defesa antimíssil dos EUA, e que iniciou o desenvolvimento de toda uma nova classe de armas estratégicas letais, movidas a motor nuclear. Assim, está pronta a resposta da Rússia à retirada unilateral dos EUA em 2002 – no governo de W. Bush – do Tratado Antimíssil de 1972, pedra angular do equilíbrio nuclear estratégico, e posterior implantação, pelo governo Obama, de um cerco antimíssil, medidas destinadas a tornar possível um “primeiro ataque nuclear” à Rússia, sem possibilidade de resposta.
Como destacou o líder russo, os novos sistemas – como o Vanguarda, que plana “como um meteoro” a 20 vezes a velocidade do som desde o espaço, ou o Punhal, disparado de aviões com alcance de 2.000 km e 10 vezes a velocidade do som, e o substituto do ICBM pesado soviético (Voevod), o Sarmat RS-28 – basicamente ignoram as capacidades antibalísticas norte-americanas. Putin acrescentou que tais sistemas, além de altamente eficazes, têm custo “muito modesto”.
Dirigindo-se àqueles que “tentaram conter o desenvolvimento do nosso país, inclusive na esfera militar”, impondo “restrições e sanções ilegais do ponto de vista jurídico internacional”, Putin assinalou: “tudo o que vocês estavam tentando evitar, já aconteceu. Não conseguiram conter a Rússia”.
Praticamente, Putin declarou o fim do “mundo unipolar” sob controle de Washington. Sobre o significado da nova situação, Putin destacou que “não ameaçamos ninguém, não vamos atacar ninguém, não pretendemos tirar nada de ninguém, ameaçando com uma arma: temos tudo de que precisamos”.
“Pelo contrário, considero necessário enfatizar: o poder militar crescente da Rússia é uma garantia confiável de paz no nosso planeta, uma vez que este poder preserva e manterá o equilíbrio estratégico e o equilíbrio de forças no mundo”, salientou Putin, acrescentado que isso foi e continua sendo um dos os fatores indispensáveis da segurança internacional após a II Guerra Mundial
Putin relembrou o quanto a Rússia tentou chamar à razão Washington, inutilmente. Ao só permitir um único local de antimíssil para cada uma das partes – Moscou na Rússia, e um complexo de ICBMs nos EUA, o Tratado Antimíssil assegurava a capacidade de resposta em caso de ataque e, portando, o equilíbrio estratégico.
“Tentamos persuadir os americanos a não destruírem o Tratado ABM, a não violarem o equilíbrio estratégico. Tudo em vão”, ressaltou o líder russo. “Todas as nossas propostas foram rechaçadas. Quando dissemos a eles que seríamos obrigados a melhorar nossos sistemas de ataque para garantir nossa própria segurança, em resposta os EUA disseram, façam o que vocês quiserem”.
Como registrou Putin, os “nossos parceiros”, isto é, a plutocracia ianque, o Pentágono e a CIA, acreditavam piamente que “na perspectiva histórica previsível” (pós-desmonte da URSS), o renascimento da Rússia era “impossível”. Assim, não havia porque levar em conta os interesses da Rússia e os EUA podiam impunemente impor uma vantagem militar unilateral final e então ditar seus termos em todas as outras áreas.
Putin resumiu a devastação sofrida pela Rússia: “perdemos 23,8% do território, 48,5% da população, 41% do produto social bruto, 39,4% do potencial industrial, 44,6% do potencial militar em conexão com a divisão das Forças Armadas da URSS entre as ex-repúblicas. A tecnologia militar ficou obsoleta e as próprias Forças Armadas ficaram em estado deplorável. Houve uma guerra civil no Cáucaso, e os inspetores americanos se sentaram em nossas principais plantas de enriquecimento de urânio”.
É compreensível que os imperialistas não entendessem o quanto o socialismo na Rússia tinha deixado raízes em termos de desenvolvimento científico, patriotismo e soberania, e os tristes dias do bebum Yelstin tiveram fim. Agora a Rússia tem forças estratégicas de mísseis, capazes de atingir alvos em profundidade intercontinental com velocidade hipersônica e alta precisão, e possibilidade de manobras profundas tanto em altura quanto em curso.
“Devo dizer com todas as letras”, salientou Putin, “atualmente, não existem tais sistemas de armas em nenhum país do mundo”. Ele apontou ainda que todos esses esforços para fortalecer a capacidade de defesa da Rússia foram realizados sem violar os acordos de controle de armas existentes.
Diante das novas ameaças da recente revisão de estratégia nuclear dos EUA, que reduz perigosamente o limiar para uso das armas nucleares, Putin destacou que a Rússia só prevê seu uso em resposta ao uso de arma nuclear contra ela e seus aliados, ou em agressão com armas convencionais que ameace a própria existência do país. “Está tudo muito claro, muito concreto”.
“Considero meu dever declarar o seguinte: qualquer uso de armas nucleares contra a Rússia ou seus aliados, seja de pequena, média e qualquer potência, será considerado como um ataque nuclear a nosso país. A resposta será imediata e com todas as consequências subsequentes”, advertiu Putin.
TRATADO START III
O líder russo também observou como o tratado de limitação de armas nucleares de 2010, o START III, foi visto pelos EUA como uma forma de anulação do potencial nuclear russo, pois em paralelo à redução de veículos lançadores e de ogivas prevista no acordo, eram instalados incontrolavelmente por Washington nas imediações da Rússia sistemas antimísseis, inclusive em 35 destroiers e 5 cruzadores ianques, além da Polônia e Romênia, além dos dois antimísseis no Alasca e na Califórnia, e os em implantação no Pacífico.
Após destacar que os anúncios das novas armas não era um blefe, Putin chamou os líderes do Ocidente a “enviarem aqueles que vivem no passado, e não conseguem olhar para o futuro, a um merecido descanso”. “Parem de balançar o barco em que todos nós estamos e que é chamado de Planeta Terra”.
Como Putin apontou, “mesmo surpreendente e apesar de todos os problemas que enfrentamos na economia, nas finanças, na indústria de defesa, no exército, a Rússia permaneceu e continua sendo a maior potência nuclear”. “Não, ninguém realmente queria falar conosco, ninguém nos ouviu. Ouçam agora”.
ANTONIO PIMENTA