DENOY DE OLIVEIRA
No Brasil a única indústria que tem que ser tão porreta quanto a importada é o Cinema. Os dois produtos estão colocados em paralelo e para imediata comparação. Até quando no programa do filme estrangeiro, passa um trailler nacional.
Veja, você roda alguns quilômetros com um carro “made in Brasil”, de repente uma batida de portas, cai a maçaneta, ou emperra o vidro. Mas você não sabe como seria com o seu similar estrangeiro.
Mas não podemos pensar em similar, para o caso do Cinema, por sua implicação na liberdade de informação, formação. O filme multinacional continuará entrando de graça, trazendo nos rastros das obras necessárias e fundamentais para o espírito humano uma tonelada de filmes medíocres, e pra “fazer a cabeça”.
Vem desde a colonização. Primeiro se domina a alma. Depois o corpo. Vamos parar de ingenuidade. Isso não é paranóia. É “business!”. Grande parte da mídia e dos editoriais, contam em prosa e verso a “sabedoria do mercado” e que a “livre escolha” é o melhor remédio e que “vença o melhor”.
Mas nós sabemos que o processo não é democrático. É tal como no filme “O Cangaceiro”, do Lima Barreto: “Olha cabra! Tá vendo aquela árvore? Tu vai correndo até ela. Nós vai atirar. Se tu chegar vivo até lá, tu tá solto”.
Quer dizer, só vendo John Wayne nos bons tempos.
No tiroteio do mercado, com nosso filme custando no barato US$ 800 mil, pra se pagar só no Brasil, onde o multinacional chega pago, custo zero de produção e com 10 milhões de dólares enrolados na capa do Batman, por exemplo, falar de “ideologia de mercado” é sacanagem! Desinformação não é. Que as multis sabem e gozam desse disparate. E aí vão dizer: modernizem-se! Mas as notícias correm mundo…
Já sabíamos que na França, Inglaterra, Itália, Alemanha, etc., etc., todas as cinematográficas estão acopladas à TV e subsídios. Mesmo nos EUA, uma certa produção vive no vermelho. Dennis Hopper, diretor/ator/roteirista de “Sem Destino” (69), quando esteve no Brasil, me falou que este filme só “teve destino”, porque um dos coprodutores era filho de um graudão da Columbia. Ou teria o “sem destino” de produções assemelhadas, que vivem arrancando grana das fundações e dando trambiques.
E, voltando às notícias, agora estamos sabendo que mesmo no Japão, industrializado, modernizado, sólida cultura, seu cinema enfrenta problemas de rejeição nacional e os atores terão que falar inglês para filmar. Isso no país do yen. Aqui, nós vamos carregar bandeja.
Sylvio Back na telinha
A CIC VÍDEO teve um lance original: lançou uma coletânea com filmes de Sylvio Back, um dos mais pessoais realizadores brasileiros; com posições claras sobre o relacionamento filme/vídeo – já que “cinema” são os dois.
Ouçamos Silvio Back: “O cinema é a poesia audiovisual do século XX. A televisão – é por extensão o seu braço doméstico, o vídeo seus tentáculos planetários (Tvs a cabo, digital e laser) – é a premonição do terceiro Milênio… Quantos e quantos filmes fenecem na omissão de TV/Vídeo… E quantos crescem, reganham em poder estético e anedótico, quando revistos no nosso televisor?”
A relação Filme/Vídeo merece outros considerandos. Falemos do filme de Sylvio.
1º – “Aleluia Gretchen” (76). A família Kranz chega no Paraná no fervor da 2ª Guerra. Frau Lotte, que é nazista, lamenta ter abandonado a Alemanha. Em 1955 refugiados nazistas se instalam no hotel. Atritos com polícia e vizinhos não impedem a integração da família. Atores excelentes: Mirian Pires, Carlos Vereza, Kate Hansen, Elizabeth Destefânia, Lilian Lemmertz. O filme brasileiro mais premiado nos anos 70.
2º – “Lance Maior” (68) – Primeiro filme de Silvio. Temática urbana. Mário, universitário e bancário ambiciona uma vida melhor. Procura usar a namorada Cristina, garota rica e alienada, com fantasias de emancipação sexual. Mas o triângulo é formado com Neuza, comerciária rompendo os diques da família. Com Reginaldo Faria, Irene Stefânia e a estréia de Regina Duarte no cinema.
3º – “República Guarani” (82) – “Meu filme põe em suspeita todo e qualquer tipo de evangelização ou ocupação ideológica do indígena no passado e no presente”. “República…” resgata a “República comunista-cristã dos Guaranis “, que durou de 1610 a 1767 com 150 mil índios e 50 cidades organizadas pela igreja.
4º – “A Guerra dos Pelados” (70) – A Tragédia do Contestado (1912-1916), movimento histórico pouco conhecido, ocorrido no meio oeste de Santa Catarina. Com Átila Iório, Jofre Soares, Stênio Garcia, Dorothée-Marie Bouvier, Emmanuel Cavalcanti, Otávio Augusto, Zózimo Bulbul.
5º – “Revolução de 30” – Reconstituição da passagem das tropas de Getúlio Vargas por Curitiba. Documentos inéditos e surpreendentes que levam a estupefação, gargalhadas e reflexão. É a revisão de um Brasil ignorado nos dias de hoje.
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