Após dias em silêncio, o governador Wilson Witzel (PSC) disse “desconfiar” que a crise no fornecimento de água na região metropolitana do Rio de Janeiro acontece por uma “sabotagem”. Desde o início do ano, moradores de diversas regiões relataram a existência de mau cheiro e cor na água que sai nas torneiras fluminenses.
Por toda a região metropolitana, pessoas relataram irritações e enjôos após o consumo da água, que vem da Estação de Tratamento do Rio Guandu, e é captada a poucos metros de distância de zonas de despejo de esgotos, residenciais e industriais, que são jogados no Rio sem qualquer tipo de tratamento.
“Eu desconfio que houve uma sabotagem, exatamente para manchar a gestão eficiente que está sendo feita na Cedae preparando ela para o leilão”, disse o governador na segunda-feira (20).
Sem apresentar indícios ou provas ele continuou: “Eu acredito que o que está sendo apurado é uma sabotagem por conta do leilão. Há muitos interesses envolvidos”.
Witzel se refere ao leilão de privatização da estatal que seu governo quer executar.
A privatização da Cedae chegou a ser encaminhada em 2017 pelo governo de Luiz Fernando Pezão para a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). A estatal seria a principal garantia do empréstimo de R$ 2,9 bilhões contraído pelo governo estadual do Rio de Janeiro junto ao banco francês BNP Paribas. Em 2018, a Alerj rejeitou a proposta de Pezão e barrou a entrega da Cedae. (v. Alerj impede privatização da Cedae)
Witzel agora apresenta a privatização do saneamento como grande solução para a crise.
DESMONTE
O governador não se referiu, no entanto, ao desmonte realizado por sua equipe na Cedae e nem à entrega da gestão da empresa ao seu padrinho político, o presidente do Partido Social Cristão (PSC), pastor Everaldo.
Sob a tutela do pastor, foi nomeado para a presidência da empresa Hélio Cabral, ex-executivo da mineradora Samarco, que foi acusado pelo Ministério Público Federal, como um dos responsáveis pela tragédia de Mariana, onde 19 pessoas foram mortas após desabamento da barragem de rejeitos da mineradora em Minas Gerais.
O crime da Samarco, uma associação entre a Vale e a BHP Billiton, causou a maior tragédia ambiental do país, destruindo o Rio Doce de Mariana até a sua foz, no Espírito Santo.
Pastor Everaldo e Hélio Cabral foram os responsáveis pelas demissões de 54 engenheiros e técnicos. Entre os desligados, estão 39 engenheiros que faziam o controle de qualidade da água distribuída pela companhia.
Segundo o governo Witzel, eles foram demitidos porque recebiam salários altos demais.
Isso sim é sabotar uma estatal.
OMISSÃO, NEGLIGÊNCIA E LENIÊNCIA
Para o ecologista Sérgio Ricardo de Lima, coordenador do Instituto Baía Viva, houve “omissão, negligência e leniência diante da crise sanitária que vem afetando a qualidade da água”. Segundo o ambientalista, o movimento contesta as informações divulgadas pela Cedae de que a causa dos problemas identificados na água esteja relacionada à geosmina, substância orgânica produzida e liberada por algas.
Segundo o Instituto Baía Viva, o agravamento da crise enfrentada é um dos reflexos da perda de R$ 11 bilhões das políticas de saneamento e gestão dos recursos hídricos no Estado do Rio de Janeiro, nos últimos 15 anos.
Nesse contexto, são mencionadas perdas como as do Fundo Estadual de Conservação Ambiental (Fecam), estimadas em R$ 10,8 bilhões, além do arresto determinado pela Justiça de um montante de R$ 200 milhões do Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FUNDRHI), em 2016, medida que gerou uma Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Estadual com apoio dos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs) e de movimentos sociais.
PASTA DE FEZES
Somente os municípios de Nova Iguaçu e Queimados despejam diariamente 56 milhões de litros de matéria orgânica em três afluentes do Rio Guandu: os rios Poços, Ipiranga e Queimados. É como se 22 piscinas olímpicas cheias de sujeira fossem colocadas ali todos os dias.
Segundo a engenheira ambiental Daiana Gineleti, um plano elaborado pelo Comitê do Guandu estima que é necessário um investimento de R$ 1,4 bilhão só para o saneamento da região.
Docentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) afirmaram que há riscos à saúde da população no produto fornecido pela empresa.
“Há uma evidente degradação ambiental dos mananciais que são utilizados para o abastecimento público da região metropolitana do Rio”, afirmou a universidade através de nota divulgada pela universidade. “Essa degradação compromete a qualidade da água, dificulta seu tratamento e pode colocar em risco a população”, completa o comunicado.
O biólogo Mario Moscatelli explicou, em entrevista ao programa ‘Fantástico’, que “décadas de descaso geraram essa situação, onde além de tratar água, a Cedae está tratando esgoto. A estação do Rio Guandu não foi feita para essa finalidade. O que hoje a estação faz é praticamente uma alquimia para transformar pasta de fezes em água potável. Até quando ela terá esta capacidade, eu não sei”.
Mais uma notícia midiática ao qual em momento nenhum reforça os pontos positivos do governo, apenas faz duras críticas á gestão de uma empresa que, mediante conselheiros administrativos, escolhe sua direção sendo essa a responsável pelos problemas da água no RJ.
Só por curiosidade, que pontos positivos você quer que nós destaquemos no governo Witzel? O assassinato de crianças em bairros populares? E não é verdade que ele não tem responsabilidade quanto aos problemas da água. Se nem por esta – algo tão básico para a vida – ele é responsável, para que ser governador?