O Secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, condenou na terça-feira (10) as ações do governo do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, de ataques contra a oposição face às eleições marcadas para 7 de novembro, nas quais pretende se reeleger pela 4 vez.
Guterres se coloca “muito preocupado com as recentes detenções, bem como com a invalidação das candidaturas de líderes da oposição na Nicarágua”, disse seu porta-voz, Stéphane Dujarric, em entrevista coletiva.
“Esses acontecimentos podem minar seriamente a confiança do público no processo democrático antes das eleições gerais de novembro”, acrescentou.
A Polícia da Nicarágua já prendeu 32 opositores de Ortega, entre estes políticos, jornalistas e ativistas, bem como as autoridades eleitorais expulsaram do processo eleitoral as agremiações opositoras Aliança Cidadãos pela Liberdade (CxL), o Partido da Restauração Democrática e o Partido Conservador. Entre os líderes políticos, deteve sete pré-candidatos oposicionistas desde que a data das eleições foi colocada.
Dujarric assinalou que o Secretário-geral exorta as autoridades “a respeitar plenamente as obrigações internacionais de direitos humanos da Nicarágua, a libertar imediatamente os líderes políticos e a restaurar seus direitos políticos”.
Na Nicarágua, “é necessário um amplo consenso (…) sobre medidas para termos eleições críveis, participativas e inclusivas em novembro”, acrescentou o porta-voz.
A guarda de Ortega adotou também medida repressiva contra o comentarista político Jaime Arellano, igualmente crítico do governo, intimado a depor perante o Ministério Público e permanecendo em sua casa “sob custódia policial”.
Ortega criou uma situação extremamente tensa na véspera eleitoral porque na Nicarágua as candidaturas para a presidência devem ser registradas no prazo estabelecido, de 28 de julho a 2 de agosto, e caso uma pessoa se encontre sob investigação de crimes ou em prisão, não poderá se candidatar. Ou seja, as candidaturas oposicionistas foram forçadas para fora da disputa.
O informe policial anunciou terem sido feitas investigações contra Arellano por realizar atos que “atentam contra a independência e incitam à ingerência estrangeira nos assuntos internos”, entre outros delitos.
As acusações são as mesmas apresentadas contra outros 26 adversários presos desde 27 de maio passado, entre eles os candidatos à presidência Cristiana Chamorro (também sob prisão domiciliar), Arturo Cruz, Juan Sebastián Chamorro, Félix Maradiaga, Miguel Mora e Medardo Mairena.
Também foram detidos os ex-vice-chanceleres Víctor Hugo Tinoco e José Pallais, e os ex-guerrilheiros sandinistas dissidentes Dora María Téllez e Hugo Torres, assim como mais quatro dirigentes opositores, dois dirigentes universitários, um jornalista e dois empresários, entre outros.
O escritor Sergio Ramírez, vencedor do Prêmio Cervantes 2017, denunciou que “a mão desajeitada da injustiça ditatorial na Nicarágua está perseguindo e fazendo reféns mulheres e homens dignos de todas as condições sociais, aterrorizando suas casas”. Ex-vice-presidente durante o primeiro governo de Ortega (1985-1990) e na oposição à Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) no poder, que considera usurpada pela família presidencial, Ramírez reiterou que se sentia “totalmente identificado” com pessoas dignas que estão sofrendo por divergir.
A Nicarágua está mergulhada numa crise agravada com os protestos sociais de 2018, quando a violenta ação de policiais e paramilitares deixou 328 mortos, mais de mil feridos, mil e 600 detidos e fez com que mais de 100 mil pessoas migrassem ou se exilassem, conforme a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). A Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, instou a Nicarágua a uma “mudança urgente” de atitude no processo eleitoral e pediu a libertação de críticos detidos arbitrariamente.