Médicos e enfermeiras de Curitiba tiveram que amarrar pacientes nas macas, neste fim de semana, para impedir que eles se movimentassem após o estoque de neurobloqueadores utilizados no processo de intubação chegarem ao fim em algumas UPAs da capital paranaense. A situação da pandemia se agrava em todo o estado, com registros de falta de cilindros de oxigênio e lotação máxima em diversos hospitais.
O Paraná possui atualmente a maior taxa de transmissão de coronavírus do país.
A falta de medicamentos foi denunciada pelo “Jornal Plural” do Paraná, que conversou com profissionais das unidades do Campo Comprido e Boa Vista na capital paranaense, além de ter tido acesso a fotos e vídeos da situação.
Os medicamentos são usados para evitar movimentos involuntários do paciente intubado. Os neurobloqueadores relaxam a musculatura e a caixa torácica reduzindo os riscos de danos aos pacientes durante o procedimento e garantindo a eficácia e adaptação à ventilação mecânica.
Segundo as informações, todos os pacientes que precisaram ser amarrados eram casos graves de Covid-19 com ventilação mecânica invasiva e foram intubados na UPA.
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba (SMS), “desde de 2020 há uma escassez no mercado dos medicamentos neurobloqueadores, como o fármaco de uso hospitalar Rocurônio. Portanto, há necessidade de uso racional por todos os serviços de saúde, inclusive Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) hospitalares”.
A secretaria afirma que “não há falta de sedativos usados nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Curitiba para procedimento de intubação”. Dessa mesma forma, os profissionais ouvidos afirmaram terem usado sedativos nos pacientes atendidos, uma vez que a intubação exige que o paciente esteja desacordado, porém os neurobloqueadores, que são outra classe de medicamentos, servem a outro propósito: o de impedir movimentos involuntários.
A SMS também afirmou que a contenção mecânica de pacientes “conduta clínica usada em hospitais para evitar a extubação pelo próprio paciente quando está em processo de recuperação da consciência” e que “não há inconsistência clínica na técnica usada”.
Informados sobre a resposta, os profissionais reafirmaram que os pacientes atendidos sem neurobloqueadores não estavam em processo de recuperação de consciência e sim haviam sido intubados durante o domingo e deveriam permanecer em coma induzido.
ESPERA DE LEITOS
A fila de pessoas à espera de um leito hospitalar para tratamento de Covid-19 voltou a ficar acima de 1.000 pacientes no Paraná. Segundo a Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), 523 pessoas aguardam vaga por um leito de UTI e 575 esperam uma vaga de leito clínico nesta segunda.
De acordo com os dados divulgados no domingo (23), com os detalhes regionais, a região de Curitiba é a que concentra o maior número de pessoas com Covid-19 ou suspeita da doença na fila por uma vaga em hospital, com 402 pacientes.
Nos outros municípios da região leste do estado, que abrange Guarapuava, Ponta Grossa e o litoral do estado, a fila é de 215 pessoas.
De acordo com o levantamento, 20 de março foi a última vez que a fila de pacientes registrou mais de 1 mil pessoas.
Março foi o mês mais letal da pandemia no estado desde que os primeiros casos foram registrados no Paraná, com mais de 6 mil mortes registradas. No dia 16 de março, a fila registrou o maior número, com 1.357 pacientes à espera por um leito hospitalar no estado.
MAIOR TRANSMISSÃO DO PAÍS
O Paraná tem nesta terça a maior taxa de transmissão da Covid-19 do Brasil. Segundo dados da ferramenta independente loft.science, o índice chamado Rt do estado está em 1,14, com possibilidade de chegar a 1,19 se considerada a margem de erro do levantamento. Na prática, um grupo de 100 paranaenses tem potencial para transmitir a doença para outras 119 pessoas, o que é um forte indicativo de que a pandemia está em aceleração.
Outras ferramentas, como o Farol Covid, também mostram o Paraná em situação grave em relação à disseminação do novo coronavírus. O índice Rt calculado para o estado é de 1,10 – seria o equivalente a afirmar que 100 pessoas poderiam contaminar outras 110 –, mas segundo o Farol Covid a situação pode ser ainda mais grave. Pelos cálculos, o estado pode estar passando por uma taxa de subnotificação de 78%, o que significa que de cada 10 pessoas infectadas 8 não estão sendo diagnosticadas.
Ainda de acordo com a Sesa, a taxa atual de ocupação de leitos de UTI no Paraná está em 96%, com 1.845 leitos ocupados em 1.916 disponíveis. Desde fevereiro o estado vem habilitando novas acomodações nas unidades de terapia intensiva, mas o ritmo das internações seguiu crescendo na mesma proporção desde então.
Os números foram classificados pelo diretor de Gestão em Saúde da Sesa, Vinícius Filipak, como “assustadores”. Rafael Deucher, presidente da Sociedade de Terapia Intensiva do Paraná (Sotipa), lamentou a realidade pela qual está passando a saúde do Paraná.
“Novamente nós temos pacientes intubados fora das Unidades de Terapia Intensiva, em pronto-socorro ou em uma UPA aguardando transferência. Isso já virou realidade novamente”, disse.