A única lógica possível é atender à ganância dos banqueiros. Selic a 13,75% estrangula o setor produtivo e os consumidores
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu na reunião desta quarta-feira (1) manter a taxa de juros da economia (Selic) no atual patamar de 13,75% ao ano. A decisão do colegiado, que atende apenas aos interesses do setor financeiro – que arrecadam bilhões todos os meses do ano via juros da dívida pública – é uma afronta aos setores produtivos do país e aos consumidores brasileiros, que clamam por juros mais baixos para a retomada dos investimentos e do consumo das famílias.
A nota do Copom diz que “em relação à atividade econômica brasileira, o conjunto dos indicadores mais recentes segue corroborando o cenário de desaceleração esperado pelo Copom”, e diz que vai continuar com o arrocho monetário em sua “estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período mais prolongado”, mantendo o Brasil campeão mundial de juros reais (descontada a inflação).
JURO EXTRAORDINARIAMENTE ELEVADO
“Se você olhar a previsão de inflação para esse ano está abaixo de 5,5%, com uma Selic de 13,75%, você tem aí uma taxa de juros real de mais de 7%. Isso é um juro extraordinariamente elevado, ainda mais considerando que os choques de oferta que levaram a inflação a subir no primeiro semestre de 2022 não vão se repetir”, afirmou o economista José Luis Oreiro, professor da UnB, em entrevista ao HP.
Para Oreiro, o BC deveria ter iniciado uma redução já nas taxas de juros nesta reunião, “até porque existem sinais inquietantes de fragilidade financeira no setor privado”.
Durante os últimos dias do mês que antecedeu a reunião do Banco Central, foram inúmeras as manifestações defendendo a redução das taxas de juros.
Para a indústria brasileira, que tem amargado nos últimos anos perdas atrás de perdas, os juros altos estão entre os grandes problemas do setor. No início desta semana (30), o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes da Silva, fez críticas aos juros na reunião da diretoria da entidade, com a presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Para Josué Gomes, a taxa de juros da economia chegou “a níveis absurdos com os quais é impossível fazer com que o Brasil cresça”. “Sem crescimento econômico nós não resolveremos os problemas sociais e, portanto, é preciso que nós todos estejamos de mãos dadas para promover o crescimento econômico, que só virá se a indústria de transformação crescer a taxas aceleradas”, declarou.
Ao divulgar dados sobre o desempenho de Micro e pequenas empresas industriais, o gerente de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Fábio Guerra, também citou os juros altos como um entrave para o setor. A entidade aponta que o acesso ao crédito é fundamental para o desempenho das pequenas e médias empresas, seja para reestruturação ou para a expansão dos negócios. “O cenário do mercado de crédito é desafiador, por conta, principalmente, do elevado nível da taxa de juros”, disse Guerra.
Os empresários do comércio varejista e serviços também não suportam mais juros tão altos, que além de encarecer o crédito está elevando o nível de endividamento e da inadimplência das famílias, o que, consequentemente, derruba o consumo de bens e serviços no país.
O presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), José Roberto Tadros, ao divulgar que o Índice de Confiança do Empresário do Comércio atingiu no mês de janeiro o seu menor nível desde abril do ano passado, declarou que “o comércio de bens e serviços sente o desaquecimento das vendas provocado pela combinação da inflação persistente com os juros elevados”, afirmou.
Dados da CNC sobre endividamento e inadimplência apontam que 77,9% das famílias brasileiras terminaram ano passado endividadas. Em termos absolutos, a cada 100 famílias, 78 se endividaram, recorde da série histórica da pesquisa, iniciada em 2010.
“A proporção de famílias com dívidas atrasadas também foi a maior em 12 anos, com juros altos e piora no nível de endividamento”, destacou a CNC na nota. O cartão de crédito, cujo juros ultrapassaram 400% ao ano, ocupa a primeira colocação entre as modalidades de dívidas.
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem criticado os juros altos, que são mantidos pelo Banco Central (BC), que, por lei aprovada pelo Congresso Nacional em 2021, apoiada por Bolsonaroe e seu governo, tem autonomia para conduzir a política monetária do país.
Segundo o Lula, no Brasil “se brigou muito para ter um BC independente, que ia melhorar”. “O quê?”, questionou o presidente. “É uma bobagem um BC independente com a inflação e os juros do jeito que estão”, disse.
Ontem (31), o vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, disse que “nós precisamos verificar por que o Brasil tem juros tão altos”.
Em um breve discurso na cerimônia de posse da diretoria da Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), Geraldo Alckmin afirmou que o governo vai trabalhar para reduzir o custo do crédito no Brasil.
“O custo de capital é um dos principais itens. Nós precisamos verificar por que o Brasil tem juros tão altos. Por quê? O que justificaria? É imposto? Cunha fiscal? Vamos tirar para reduzir o custo de capital. É falta de concorrência? Os Estados Unidos têm dois mil bancos. É insegurança econômica? Questão fiscal? É insegurança política? É difícil reaver o crédito? Spread alto? O bom pagador paga pelo mal pagador?”, questionou Alckmin sobre os juros reais mais altos do mundo.